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Esposas de soldados representam ameaça para o Kremlin?

Cresce na Rússia o movimento dos familiares que exigem a volta dos homens mobilizados para a invasão da Ucrânia. Moscou trata o assunto de forma vaga. E nem todas as ativistas são necessariamente contra a guerra.

(DW) Diante das muralhas do Kremlin, em Moscou, são constantes os atos de protesto em que mulheres depositam flores no Túmulo do Soldado Desconhecido, exigindo o retorno de seus maridos do front. Também em outras regiões da Rússia realizam-se manifestos semelhantes.

Desse modo, o movimento dos familiares dos cidadãos enviados para a guerra contra a Ucrânia chama cada vez mais a atenção pública. Ativistas de oposição já se declararam dispostos a apoiá-lo, convencidos de que a mobilização de soldados é o calcanhar de Aquiles do Kremlin.

No entanto as opiniões sobre a guerra de agressão que já vai para dois anos diferem, tanto entre os políticos quanto entre as famílias dos soldados mobilizados. Alguns a condenam, exigindo a retirada das tropas da Ucrânia, enquanto outros apenas reivindicam uma rotatividade do contingente, sendo a favor que a campanha militar continue.

Nem todas são contra a guerra

“Vamos apagar todas as mensagens convocando a manifestações!”, lia-se em 2023, no grupo das esposas dos soldados russos mobilizados da plataforma Telegram. A intenção é coibir a organização de protestos. Em seu canal Vernyom Rebyat (Tragam os rapazes para casa), a conhecida ativista Olga Katz, cujo irmão foi morto no front ucraniano, justifica a medida, considerando manifestações um tema complexo.

“Claro que o mais fácil é mostrar seu descontentamento indo até a Praça Vermelha e batendo o pé, revoltada”, admite. No entanto, tais ações poderiam atrair agentes provocadores, o que significaria o fim do “diálogo com as autoridades”. Ela própria vê a atual guerra como uma confrontação com o Ocidente, o qual tentaria desmembrar a Rússia – coisa que cabe impedir.

Não obstante, em 7 de novembro, cinco mulheres do movimento Put’ Domoy (Caminho de casa) convocaram a uma primeira vigília no centro de Moscou. Elas exigiam o retorno de seus familiares, sobretudo porque não há prazos máximos previstos para uma mobilização no front.

Polícia prende manifestantes

Fotos dessa manifestação se propagaram depressa pelas redes sociais. A polícia não ousou fazer prisões, porém, mais tarde, algumas das participantes receberam visita das autoridades, sendo instadas a suspenderem o protesto público. No entanto, o efeito foi contrário: as vigílias se transferiram para as muralhas do Kremlin, onde as esposas agora depositam flores no Túmulo do Soldado Desconhecido.

Os primeiros protestos eram, antes, debates entre apoiadores e adversários da invasão da Ucrânia pela Rússia, de início contando apenas oito participantes, mas que após dois meses já eram 50. Iniciativas semelhantes transcorrem também em outras regiões do país.

Numa delas, em Ecaterimburgo, em 10 de janeiro, cinco manifestantes foram detidos no memorial às vítimas das guerras no Afeganistão e na Tchetchênia, por suposta infração dos regulamentos de eventos públicos. Um homem foi condenado a oito dias de prisão por “organização de um comício contra a operação militar especial” – como o governo de Vladimir Putin denomina sua invasão do país vizinho.

As mulheres que escreveram a diversas autoridades russas, exigindo a devolução de seus maridos, receberam a resposta de que deviam esperar um decreto do presidente para o fim da mobilização. Nesse ínterim, o Estado-maior da Federação Russa declarou que uma delimitação não é possível, pois exigiria “uma alteração fundamental do sistema de treinamento militar”. Tal justificativa fez que muitas decidissem de vez partir para as ruas.

Putin: “Todos nós vamos deixar este mundo um dia”

Atualmente, as esposas dos soldados tentam obter o respaldo dos políticos nacionais. Com a campanha presidencial em curso, inicialmente receberam apoio dos oposicionistas Ekaterina Dontsova e Boris Nadezhdin.

Porém, quando o governo barrou a candidatura de ambos, Maria Andreyeva, uma das líderes do movimento Put’ Domoy, e outras mulheres dirigiram-se em busca de ajuda, tanto à equipe do candidato a presidente Vladislav Davankov, do partido liberal Novo Povo, quanto à de Putin, que concorre pela quinta vez à chefia de Estado. Não houve resposta de nenhum dos dois.

Nos dois anos que já dura a invasão da Ucrânia, o presidente praticamente nunca se referiu aos soldados nas frentes de combate. Num raro encontro com parentes dos caídos em combate, em novembro de 2022, ele apenas comentou, cinicamente: “Todos nós vamos deixar este mundo, um dia.”

Enquanto a mídia nacional tenta convencer a população de que tudo corre normalmente com a mobilização, políticos oposicionistas denunciam os problemas. Entre eles estão o liberal Maxim Katz, há dois anos listado como “agente estrangeiro” e vivendo em Tel Aviv; a equipe do ativista Alexei Navalny, morto na prisão em 15 de fevereiro; e o oligarca Mikhail Khodorkovsky, que mora em Londres.

Maxim Katz não crê que as autoridades farão concessões às esposas ativistas, pois aí outros familiares exigiriam também a volta dos seus. Contudo, em sua opinião, a cada dia o povo russo compreende mais que se trata de uma questão “de vida ou morte”: “As autoridades não veem nenhuma solução fácil para si, por isso reagem de forma vaga ao protesto.”

Ele aconselha as esposas dos soldados a assinarem o canal do Put’ Domoy no Telegram, que conta mais de 70 mil seguidores. Isso, apesar de algumas integrantes do movimento serem declaradamente a favor da “operação militar especial” de Putin na Ucrânia: elas só querem mesmo que a mobilização seja por tempo limitado.

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