WASHINGTON, EUA- Nestor Forster, embaixador do Brasil em Washington, fez um questionamento formal à carta enviada pelo deputado democrata Hank Johnson ao presidente Joe Biden, na semana passada. No texto, Johnson e colegas de partido pediam ao governo americano um recuo nas relações com o Brasil até que "um novo líder, mais alinhado a valores democráticos e direitos humanos, seja eleito".
Forster afirmou, em mensagem enviada nesta quarta (20) a Johnson, que a missiva dos parlamentares "contém informações equivocadas, distorções e falsidades sobre o Brasil que exigem retificação". Ao longo de quatro páginas, ele busca desconstruir as queixas feitas pelo democrata.
O texto do dia 14, assinado por 64 congressistas, cita "violações a direitos humanos, ataques à democracia e ao meio ambiente que estão acontecendo no Brasil" e faz um pedido para que Biden anule a designação de aliado preferencial extra-Otan, concedida ao Brasil durante o governo Trump; retire a oferta de apoio para o país se tornar um sócio global da Otan (aliança militar ocidental); e reveja outros programas de cooperação entre as duas nações.
O embaixador diz que a carta dos democratas "não menciona um único exemplo das supostas 'ameaças' porque estas simplesmente não existem". Segundo ele, a democracia brasileira tem um debate político vibrante.
Forster ainda afirma que o envio da mensagem a Biden "em nada contribui para a amizade e a cooperação entre o Brasil e os EUA, especialmente na área da Defesa –cujas raízes remontam à luta comum de nossas tropas para derrotar o nazismo e o fascismo na Segunda Guerra Mundial".
Segundo o embaixador, os parlamentares propõem no texto "uma visão de mundo que tem dificuldade em lidar com diferenças políticas e com os fatos".
A carta dos deputados americanos também citou o apoio de Bolsonaro à contestação da vitória de Biden no pleito americano de 2020, com apoio a declarações falsas de Donald Trump sobre fraude, afirmando que isso seria um indício a pôr em dúvida a disposição dele de aceitar os resultados da eleição brasileira em 2022.
"O filho de Bolsonaro […] esteve presencialmente em atividades ligadas ao 'Stop the Steal' em 6 de janeiro, em Washington", dizem os legisladores, em referência ao fato de o deputado federal Eduardo Bolsonaro (PSL-SP) ter participado de um encontro, no dia 5 de janeiro, com o empresário Mike Lindell, patrocinador da campanha de contestação do resultado eleitoral que culminaria na invasão do Capitólio.
Como mostrou reportagem do jornal Folha de S.Paulo, o texto dos deputados americanos se insere em um contexto de pressão feita por ativistas e grupos progressistas do Partido Democrata.
Por fim, o embaixador brasileiro argumenta que a menção a insultos feitos por Bolsonaro contra negros, indígenas e a população LGBTQIA+ se referem a "declarações fora de contexto" dadas quando o presidente ainda era deputado federal. Segundo Forster, o governo atual tem tomado medidas a favor desses grupos.
O embaixador diz também que o Brasil segue comprometido a melhorar seus indicadores ambientais e destaca os índices de vacinação da população contra a Covid-19.
A íntegra da carta do embaixador Nestor Forster:
"Washington, 20 de outubro de 2021
Prezado deputado Johnson, Causou-me surpresa sua carta de 14 de outubro endereçada ao presidente Joe Biden, também assinada por outros membros do Congresso, que infelizmente contém informações equivocadas, distorções e falsidades sobre o Brasil que exigem retificação. A carta não reflete a duradoura amizade, fundada no respeito mútuo, que caracteriza as relações entre o Brasil e os Estados Unidos, nem estimula diálogo construtivo, que a embaixada tem buscado empreender com representantes dos dois partidos políticos no Congresso. Permita-me destacar os problemas mais salientes somente nos dois primeiros parágrafos da carta, e oferecer correções baseadas em fatos. 'Escrevemos para expressar nossa profunda preocupação com políticas que o presidente Jair Bolsonaro vem perseguindo no Brasil e que ameaçam o Estado de Direito, os direitos humanos, a saúde pública e o meio ambiente'. A carta não menciona um único exemplo das supostas 'ameaças' porque estas simplesmente não existem. Por 28 anos, o presidente Jair Bolsonaro foi sucessivamente reeleito como membro do Congresso Nacional. Sua eleição em outubro de 2018, com 57,7 milhões de votos (55% dos votos válidos), foi sinal claro de repúdio à corrupção e às políticas estatizantes que a tornaram possível. O povo brasileiro e nossas instituições expressaram inequivocamente seu apoio à governança democrática e transparente. O Brasil segue vivendo em uma ordem constitucional alicerçada no Estado de Direito, na separação de poderes e no devido processo legal. 'Exortamos Vossa Excelência a enviar à administração Bolsonaro mensagem clara de que, se persistirem os ataques do presidente Bolsonaro ao processo eleitoral, as relações EUA-Brasil ficarão severamente comprometidas'. O debate político no Brasil, como em qualquer grande democracia, ocorre dentro de um quadro institucional robusto, sob a égide de uma sociedade civil dinâmica, que usufrui de amplas salvaguardas constitucionais. 'O mandato de Bolsonaro tem sido marcado por políticas antidemocráticas desde o início. Ele está entre os principais exemplos da tendência global rumo a uma política autoritária e iliberal'. Isso não é verdade. O presidente Bolsonaro jamais implementou quaisquer 'políticas antidemocráticas'. Na verdade, o Brasil, com 33 partidos políticos, uma imprensa livre e um debate político vibrante, é e continuará a ser um dos países mais livres do mundo. Longe de praticar uma 'política iliberal', o presidente Bolsonaro fortaleceu a Operação Acolhida, que é internacionalmente reconhecida e já assistiu meio milhão de venezuelanos. O Brasil também tem acolhido cidadãos haitianos, afegãos e sírios, segundo critérios humanitários. Infelizmente, outros países do Hemisfério –inclusive uma das ditaduras militares mais antigas do mundo– constituem exemplos de fato de governo autoritário. A única base para tais alegações, mencionadas em uma nota de rodapé, é um controverso 'site' de opinião que cita declarações fora de contexto, algumas de quase 30 anos atrás, atribuídas ao então deputado federal Bolsonaro. Não é de surpreender que essas falsas alegações estejam em contradição com os fatos. A administração do presidente Bolsonaro tem apoiado e protegido grupos minoritários e os mais vulneráveis no Brasil, lutado para elevar os índices de emprego, tomado medidas sem precedentes para proteger o meio ambiente e conduzido uma exitosa campanha de vacinação. Em fevereiro, o presidente Jair Bolsonaro visitou o estado do Maranhão, onde distribuiu títulos de propriedade a famílias quilombolas que há décadas os reivindicavam. Durante a pandemia da Covid-19, prioridade foi conferida a povos indígenas aldeados: 88% da população-alvo já recebeu uma dose da vacina, e 81% está totalmente imunizada. Quanto à população LGBT, o governo preparou um guia para ajudá-la a proteger-se do vírus e disponibilizou uma linha direta disponível 24 horas por dia para denúncias de abusos de direitos humanos. O presidente Bolsonaro também nomeou uma pessoa transexual como diretora de promoção dos direitos LGBT, posição de relevo no Ministério da Mulher, da Família e dos Direitos Humanos. Meio ambiente: em cumprimento ao compromisso que assumiu o presidente Bolsonaro na Cúpula de Líderes sobre o Clima, os fundos para o combate aos crimes ambientais mais do que duplicaram, passando de US$ 43 milhões para US$ 95 milhões. De acordo com dados preliminares divulgados pelo Ministério do Meio Ambiente, o desmatamento na Amazônia diminuiu 32% em agosto passado, em comparação com o mesmo período em 2020. Em discurso recente na Assembleia Geral das Nações Unidas, o presidente Bolsonaro reiterou que o Brasil alcançará a neutralidade de carbono até 2050 (o prazo anterior era 2060). A matriz energética do Brasil é a mais limpa do G20 e estamos plenamente comprometidos com o Acordo de Paris e demais acordos ambientais internacionais. Covid-19: sob a liderança do presidente Bolsonaro, o Brasil já vacinou 94% de sua população adulta, e 68% está totalmente imunizada. Com 262 milhões de doses aplicadas, o Brasil está em 4º lugar no mundo em total de doses da vacina. Como demonstram os exemplos acima, a carta em questão não tem amparo nos fatos e em nada contribui para a amizade e a cooperação entre o Brasil e os EUA, especialmente na área da Defesa, cujas raízes remontam à luta comum de nossas tropas para derrotar o nazismo e o fascismo na Segunda Guerra Mundial. É lamentável que, sob pretexto de promoção da democracia e dos direitos humanos, um objetivo plenamente compartilhado pelo governo brasileiro, a carta proponha uma visão de mundo que tem dificuldade em lidar com diferenças políticas e com os fatos. Nas palavras de um grande estadista brasileiro, o Barão do Rio Branco, mais de um século atrás, os Estados Unidos podem considerar o Brasil 'seu mais antigo e certamente um de seus mais constantes e leais amigos neste continente'. Estou certo de que essa visão de longo prazo de amizade e cooperação que tem guiado as relações entre o Brasil, os Estados Unidos e nossos dois povos seguirá prevalecendo nos próximos anos. Permaneço à sua disposição para discutir essas e outras questões ou preocupações relacionadas às relações entre o Brasil e os EUA. Atenciosamente, Nestor Forster Jr." |
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