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Voltando a falar de operações de paz: o Exercício VIKING 2022

Cel Rodrigo de Carvalho Bernardo

Os últimos acontecimentos no Leste Europeu e o recente conflito bélico desencadeado evidenciam a necessidade, para qualquer Estado, de manter suas Forças Armadas em permanente condição de emprego, com capacidades compatíveis para cumprirem suas missões precípuas de defender o território, o povo e a nação.

Distantes do teatro de operações europeu, brasileiros observam e analisam o conflito, colhendo ensinamentos táticos, logísticos, tecnológicos, entre outros, ao mesmo tempo em que aguardam a urgente solução da contenda, seja por meio da diplomacia ou, ainda, pela ação de organismos internacionais, como a Organização das Nações Unidas (ONU).

A habilidade e a capacidade da ONU para encontrar soluções para distintos conflitos são indiscutíveis. Por meio de seus órgãos constituintes, como o Conselho de Segurança e o Secretariado, o organismo internacional, ao longo dos anos, logrou “preservar as gerações vindouras do flagelo da guerra, que, por duas vezes, no espaço da nossa vida, trouxe sofrimentos indizíveis à humanidade” (trecho do preâmbulo da Carta das Nações Unidas).

As operações de missões de paz constituem-se em uma das mais efetivas ferramentas disponíveis para assistir países e nações hostis a percorrer o difícil caminho até o estabelecimento da paz. O Brasil, como membro fundador da ONU, já participou de mais de 50 operações de paz (OPaz) e missões similares, tendo contribuído com mais de 55 mil militares, policiais e civis ao longo dos anos. Nesse sentido, atento à necessidade de se manter preparado e atualizado com o cenário internacional, o Brasil iniciará grande atividade voltada à temática OPaz: o Exercício VIKING 2022.

O VIKING 2022 é um exercício de simulação construtiva assistido por computadores, baseado em um contexto de OPaz e organizado a cada quatro anos. A atividade é uma iniciativa do Reino da Suécia e dos Estados Unidos da América, e, desde 1999, foram realizadas oito edições. A última ocorreu em 2018, ano em que o Brasil participou pela primeira vez e, por consequência, primeira ocasião em que um país não europeu sediou parte do evento.

O Exercício objetiva promover a cooperação e a interoperabilidade entre as Forças Armadas, as organizações e as instituições nacionais e internacionais participantes e, ainda, contribuir para o desenvolvimento do trabalho de Estado-Maior nos processos decisórios das ações relacionadas à missão de paz. Em linhas gerais, a simulação é realizada pela organização de um posto de comando de Quartel-General de uma missão típica da ONU, com seus respectivos comandos subordinados e escritórios regionais.

A atividade possui características ímpares, entre as quais se destacam o multifuncionalismo, com expressivo número de cargos ocupados, o ambiente multinacional e o aspecto multidimensional intrínseco às OPaz sob a égide da ONU. As especificidades elencadas sinalizam a grandiosidade do exercício. Reforçam a assertiva os números alcançados na edição de 2018, que reuniu cerca de 2500 participantes oriundos de 50 países, entre civis, militares e policiais, distribuídos na Suécia e em outros quatro países, dentre os quais o Brasil.

No Brasil, a gestão administrativa do exercício é de responsabilidade do Ministério da Defesa, o qual incumbiu ao Exército Brasileiro a responsabilidade de planejar, executar e conduzir a simulação, que ocorrerá entre os dias 28 de março e 7 de abril do corrente ano, nas instalações do Comando Militar do Planalto, na cidade de Brasília (DF).

Desde a concepção, considerou-se para o exercício a necessidade de uma abordagem multidimensional para a solução dos problemas simulados. Dessa forma, acredita-se que ocorrerá a interação e o aumento do conhecimento mútuo entre os partícipes de uma OPaz, bem como a necessária troca de informações entre os envolvidos, tudo visando assegurar uma resposta coerente e uníssona para situações comumente encontradas e vivenciadas no terreno.

O exercício contará com os três principais componentes de uma OPaz: o militar, o civil e o policial. O primeiro reunirá integrantes das três Forças Singulares brasileiras, além de estar constituído por cerca de 20 representantes de nove países latino-americanos: Argentina, Bolívia, Chile, Colômbia, Equador, Guatemala, México, Peru e Uruguai.

O segundo estará representado por expressiva participação de acadêmicos vinculados à Rede Brasileira de Pesquisa sobre Operações de Paz (REBRAPAZ) e por integrantes do Sistema ONU Brasil. O terceiro contará com a participação de policiais militares de distintos estados, como Distrito Federal, Espírito Santo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Norte, São Paulo e Santa Catarina. Todos os componentes irão operar de acordo com seus mandatos institucionais e com os princípios humanitários vigentes.

O cenário a ser utilizado no exercício descreve uma situação histórica, política, socioeconômica, militar e humanitária fictícia em um estado falido, propiciando desafios comumente observados nas operações multidimensionais da ONU.

Assim sendo, viabilizará a aplicação de conceitos operacionais atualizados, permitindo que as distintas organizações envolvidas treinem suas especialidades e especificidades. Neste escopo, assuntos como gênero, direitos humanos, proteção de civis, deslocados, refugiados, assistência humanitária e prevenção de violência sexual, dentre outros, estarão presentes e serão considerados nesta edição.

O desenvolvimento do exercício incluiu a participação de inúmeros países europeus e estabeleceu, inicialmente, que sete países constituiriam os sítios remotos: Bósnia-Herzegovina, Brasil, Bulgária, Catar, Finlândia, Suécia e Ucrânia. Os últimos acontecimentos, por óbvio, exigiram a saída de alguns integrantes, por estarem direta ou indiretamente envolvidos no recente conflito deflagrado.

Não obstante, é factível afirmar que o tamanho; a multinacionalidade; a multidimensionalidade; a participação de alto nível; o número e a diversidade de organizações representadas; e a integração entre os três componentes tornam o Exercício VIKING único em sua modalidade.

A participação do Brasil em OPaz é condicionada à observância dos princípios que regem tais missões: consentimento das partes em conflito, imparcialidade e não uso da força (exceto em autodefesa ou defesa do mandato).

Que o treinamento a ser realizado de maneira simulada nos próximos dias possa contribuir para a continuidade da preparação dos quadros nacionais para o emprego sob a égide da ONU. Que o Brasil, suas Forças Armadas, suas instituições e seu Povo possam se manter preparados e prontos para levar a paz desta imensa Nação para o mundo, seja onde e quando forem demandados!

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Sobre Autor:

RODRIGO DE CARVALHO BERNARDO. Coronel da Arma de Cavalaria, oriundo da Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN). Desempenhou as funções de Observador Militar na Missão das Nações Unidas na Etiópia e Eritreia e instrutor no Centro Conjunto para Operações de Paz do Chile (CECOPAC). Foi instrutor da AMAN, coordenador na Subchefia de Operações de Paz do Ministério da Defesa e Comandou o 4º Regimento de Cavalaria Blindado (São Luiz Gonzaga/RS). Atualmente, é o Chefe da Divisão de Missão de Paz do COTER.

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