Adestrar militares para atuar no mais alto nível da Estratégia Militar – o Nível Operacional – que envolve o planejamento de deslocamento de forças navais, aéreas e terrestres, é uma tarefa árdua e custosa.
Se esta tarefa, por si só, já é complexa, imagine realizá-la num ambiente multinacional, envolvendo 17 países distintos. Este é o contexto da Operação PANAMAX 2014, exercício militar conjunto liderado pelo Comando Sul dos Estados Unidos da América. No corrente ano, o Comando Militar do Sul participará na operação na liderança do Componente Terrestre das Forças.
Marcelo Carvalho Ribeiro – Coronel do Exército
Comando da 3ª Divisão de Exército
Contribuir para a Segurança do Canal do Panamá e fomentar a cooperação militar entre os países participantes. Este é o objetivo principal da Operação PANAMAX que, este ano, entrará na sua 12ª edição.
O Brasil, tendo à frente o General de Brigada Carlos Jorge Jorge da Costa, atual Comandante da 2ª Brigada de Cavalaria Mecanizada, com sede em Uruguaiana-RS, comandará a Força Terrestre Componente. Sua tarefa: liderar, num exercício simulado, o comando de uma força que atuará sob a égide da ONU para restabelecer a segurança no entorno do canal do Panamá.
Contará, para isso, com um estado-maior com 90 integrantes de várias nacionalidades, dos quais 13 são brasileiros, em sua maioria integrantes do Comando Militar do Sul, mais especificamente da 3ª Divisão de Exército, a Divisão Encouraçada, com sede em Santa Maria-RS.
A Operação PANAMAX partiu de uma iniciativa de três países, no ano de 2003: Chile, Estados Unidos da América e Panamá, e tinha como foco, na ocasião, adestrar os componentes navais dos países. A iniciativa foi crescendo pela adesão de outros países contribuintes, até que no ano de 2007 foi introduzido o componente terrestre. No ano seguinte, a operação passou a ser certificada por meio do Comando Sul dos Estados Unidos da América, que agregou os demais componentes.
Atualmente, participam da operação 17 países: Belize, Brasil, Chile, Colômbia, Costa Rica, República Dominicana, El Salvador, Estados Unidos da América, França, Guatemala, Honduras, Jamaica, México, Nicarágua, Panamá, Paraguai e Peru.
A OPERAÇÃO
A Operação PANAMAX é um exercício voltado para adestrar Comandantes e militares de estado-maior nos níveis estratégico e operacional, quer dizer, em um nível decisório elevado, em que as tarefas são direcionadas para os mais elevados escalões envolvidos em campanha (comandos de força terrestre, naval, aérea e de operações especiais).
O quadro Nr 1 reflete as relações de comando que serão estabelecidas na Operação, sendo a Força Multinacional Sul (MNFS), cujo comandante será o Comandante do Exército Sul dos EUA, o maior escalão a ser adestrado. A MNFS enquadrará três forças: a Força Naval Componente (CFMCC), liderada pela Colômbia, o Comando de Operações Especiais (CFSOCC), liderado pelo Chile, e a Força Terrestre Componente (CFLCC), liderado pelo Brasil.
Estas forças contarão com apoio aéreo, proporcionado por um Componente Aéreo atuando em apoio direto, e uma Unidade Marítima expedicionária (MEU), esta em controle operacional. Em todos os estados-maiores haverá a presença de oficiais das 17 nações participantes, o que garante uma troca de experiências em todos os níveis.
A Operação PANAMAX 2014 será realizada em três fases distintas:
– 1ª Fase– Treinamentos, nos âmbitos dos estados-maiores e dos comandantes de força. Esta fase ocorrerá de maio até as vésperas do Exercício, nos EUA e nas nações que lideram as forças componentes. No Brasil, este treinamento será realizado de 02 a 11 de julho em Santa Maria-RS. Estarão presentes cerca de 50 militares, entre brasileiros e de nações amigas.
– 2ª fase– Exercício bilateral, entre Panamá e EUA, para adestramento de comandantes e estados-maiores, realizado de 14 de julho a 2 de agosto, no Panamá e EUA e
– 3ª fase– Exercício de Postos de Comando, realizado de 01 a 14 de agosto, em bases militares, sedes dos comandos componentes do Comando Sul, nos EUA (ver quadro Nr 2).
No Exercício, é criado um país fictício denominado “Nova Centrália”, que se localiza entre a Costa Rica e o Panamá. O país segue desestabilizado por forças irregulares, a denominada “ Brigada de los Martires de La Liberación”, que lança suas forças para tentar interferir no fluxo do canal do Panamá. Para pôr fim à ameaça, o Conselho de Segurança da ONU autoriza o uso de uma força para imposição da paz em Nova Centrália, a “Multinational Force South”(MNFS).
A MNFS, um comando conjunto, atuará de modo simulado, em três áreas: uma área marítima no Oceano Atlântico, outra no Pacífico e uma área de Operações em Nova Centrália, conforme o Quadro Nr 2.
A Força Terrestre Componente (CFLCC) será integrada por duas brigadas, uma brasileira e uma chilena, e mais uma força-tarefa de aviação do exército (helicópteros) (ver Quadro nº 3).
Estas forças serão simuladas na plataforma CENTRIX, que é a plataforma de comando e controle utilizada pelas forças armadas dos EUA. Por meio de um corpo de militares distinto dos que executam a operação, as ações destas forças serão efetivadas, e as respostas serão transmitidas ao estado-maior , para que preparem as respostas adequadas, como num verdadeiro jogo de guerra.
Os oficiais brasileiros que atuarão neste corpo, denominado “White Cell”, são militares da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME), que , anualmente, realizam um exercício conjunto, já tradicional entre as três escolas de altos estudos militares das nossas forças armadas (ECEME,ECEMAR e EGN), denominado AZUVER.
A Operação PANAMAX 2014, desde o início de seu planejamento, levou em consideração os objetivos de adestramento eleitos por cada um dos países participantes. Em outras palavras: no caso de nosso Exército, o Comando de Operações Terrestre (COTER), responsável pelo adestramento, elencou objetivos específicos, que foram acordados em reuniões com os demais países participantes.
Dentre eles estão, além do adestramento dos comandantes e estados-maiores no nível operacional, o treinamento de atuação integrada com agentes governamentais e não governamentais, o treinamento de ações humanitárias, o planejamento de atuação em ambiente cibernético (defesa cibernética) e , o mais importante: a atuação em um ambiente multi-étnico e multi-cultural, com uma única finalidade: cumprir uma missão determinada, superando as barreiras de idioma, organizacionais, doutrinárias, enfim, tentando pôr as diferenças de lado para produzir algo em comum.
Esta preciosa experiência, certamente, muito proporcionará quando atuarmos em missões sob a égide da ONU em outros países, e as lições aprendidas serão recolhidas e encaminhadas ao Centro de Doutrina do Exército (C Dot Ex).
Ademais, as experiências colhidas pela equipe da direção do exercício (“White Cell”) proporcionará valiosas lições aprendidas, que serão replicadas nos exercícios AZUVER, anualmente realizados em nossas escolas de estudos estratégicos, proporcionando a evolução de tecnologias e métodos de trabalho em exercícios de simulação virtual.
Recentemente, a portaria nº 339 do Comandante do Exército, de 16 de abril de 2014, criou o Centro de Adestramento e Avaliação – Sul (CAA-Sul). Este Centro vai funcionar na cidade de Santa Maria-RS, com as três vertentes de simulação: a viva, a virtual e a construtiva, que é a modalidade de simulação empregada para treinamento de estados-maiores de grandes escalões. Caso se deseje, em uma próxima versão da operação PANAMAX, o Brasil poderia oferecer-se para sediar uma das forças componentes, utilizando-se da estrutura do CAA-Sul, quando este estiver em funcionamento.
Uma vez que a experiência esteja consolidada, poder-se-á realizar, no CAA-Sul, exercícios de simulação virtual neste mesmo nível, envolvendo as forças armadas de nações amigas, à semelhança da Operação PANAMAX.
Neste sentido, as experiências colhidas na organização desta operação poderiam ser replicadas e empregadas para adestrar as forças armadas sul americanas, proporcionando a criação de um ambiente multinacional que poderia impactar positivamente na criação de uma estrutura de defesa comum.
Ademais, ressalte-se que o conhecimento mútuo entre militares de distintas forças armadas, por se criar um ambiente amistoso de cooperação, é peça fundamental para a consolidação da estabilidade regional.
CONCLUSÃO
O ambiente internacional, cada vez mais, vai requerer militares capazes de atuar em campanha interagindo num ambiente cooperativo com outras nações. Neste sentido, a simulação virtual pode ser uma poderosa aliada.
No âmbito da defesa, um componente importante para a geração de um ambiente de cooperação internacional e estabilidade regional é o conhecimento mútuo entre integrantes de distintas forças armadas.
O funcionamento de centros de adestramento como o CAA-Sul, em Santa Maria-RS, poderá intensificar, por meios de exercícios combinados multinacionais, este tipo de cooperação, já que ela efetivamente existe, seja por meio de exercícios como a Operação Guarani e Hermandad, seja por meio do diálogo existente naturalmente entre as forças presentes na região de fronteira.
Ocasiões como esta, proporcionada pela Operação PANAMAX 2014, devem ser aproveitadas em todos os sentidos. Além de proporcionar uma adestramento de alto nível com relativamente baixo custo, o exercício possibilita diálogo e cooperação militar , gera o conhecimento mútuo, permite que se trabalhe as diferenças culturais na obtenção de objetivos militares e, ademais, proporciona aos militares um verdadeiro laboratório de lições aprendidas.