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Onça Juma, a mártir de uma Olimpíada que o Brasil não precisava

Coronel R1 Fernando Montenegro
Forças Especiais do Exército, Guerreiro de Selva Nº 3.922, foi Instrutor
Chefe do Centro de Instrução de Guerra na Selva e Comandou a Pacificação dos Complexos do Alemão e da Penha no Rio de Janeiro.
Atualmente na Reserva e Consultor de Segurança, morando em Portugal.


O AMBIFALCO, em Portugal, é uma organização que desenvolve atividades de educação ambiental e histórica com aves de rapina; paralelamente, recebe e acolhe aves irrecuperáveis dos centros de recuperação. Além disso, promove a conservação desses animais e a proteção do meio ambiente.  Várias pessoas que visitam o Palácio de Mafra acabam por não resistir e pagam para posar nas fotografias com esses animais. A verba é revertida para os cuidados com os animais.

Quem permanece olhando de fora, percebe que o momento é crítico do contato e o tratador pode ter que tomar uma atitude drástica, caso o animal saia do controle e ameace a segurança física das pessoas, o que seria intolerável. Essa atividade existe, sustenta e promove interesse pela temática do meio ambiente em inúmeras unidades de conservação e parques temáticos ao redor do planeta.

Os animais que se encontram em cativeiro ali são como idosos abandonados num lar de caridade. Não teriam chance de sobreviver no ambiente selvagem, assim como os idosos não resistiriam nas ruas. Situação similar verifica-se no Zoológico do Centro de Instrução de Guerra na Selva do Exército Brasileiro e vários outros estabelecimentos que existem em todos os continentes acolhendo animais irrecuperáveis.

O evento que marcava a passagem da tocha olímpica em Manaus não poderia deixar de ter a participação do Centro de Instrução de Guerra na Selva (CIGS), cujo zoológico é o 2º ponto turístico mais visitado de Manaus e os animais fazem parte da mística da unidade. Literalmente, todas as vezes que as onças não participam de atividades com o público, ouvimos reclamações.

Para quem não sabe, as onças são as celebridades do CIGS nos eventos públicos e isso pode vir a ser repensado. Assisti a centenas deles com a participação da Juma e outros felinos, ela comportava-se muito bem e era acostumada a essa atividade. Juma era uma das onças mais bem comportadas nas paradas militares.

Tenho certeza que não era o desejo de ninguém chegar a esse extremo. As onças do CIGS e outras unidades militares que tem possibilidade de interagir com humanos tem sua preparação iniciada desde o desmame e nunca comem carne. São alimentadas apenas com ração de felinos para não sentirem o gosto de sangue, evitando o estímulo ao instinto de caça.

Entretanto, já houve eventos em que onças escaparam e foram recapturadas sem atacarem ninguém. No passado, também já houve situações em que os animais tiveram que ser abatidos por razões de segurança. Normalmente, pede-se que não se deixe as crianças soltas correndo ou por perto, assim como pessoas usando roupas de cor vermelha ou com ferimentos expostos, pois os felinos ficam realmente muito excitados.

O zoológico do CIGS surgiu em 1967 a partir da necessidade de apresentar aos alunos do Curso de Operações na Selva, os elementos da fauna e flora amazônicas mais importantes. Em 1969, foi ampliado e aberto ao público em geral. O Zôo é parte integrante da Divisão de Veterinária, cujas instalações atuais foram inauguradas em 04 de junho de 1999, dentro da atual legislação ambiental.

O Zôo, é praticamente um refúgio de animais apreendidos por órgãos ambientais que não podem retornar ao habitat e possui em seu acervo somente animais amazônicos brasileiros, contando atualmente com cerca de 170 animais distribuídos em 56 espécies. A manutenção dessa estrutura que também envolve recursos humanos qualificados é cara e dispendiosa. Por sua vez, a disputa entre as dezenas de veterinários voluntários para servir no CIGS é enorme e a escolha dificílima.

Aqueles que não conseguem, temtam fazer algum estágio no hospital do Zoo para valorizar o currículo. O CIGS é o um dos principais centros de referência no tratamento e manuseio de felinos da América e, normalmente, somente os zoológicos sem recursos não enviam seus tratadores e veterinários para fazerem estágios lá .


 

Área do Centro de Instrução do CIGS (CICIGS)

É importante esclarecer também que não se realiza captura de animais para o Zôo. Cabe ainda ressaltar que são ainda realizados estudos sobre a fauna e a flora da região, em apoio a órgãos de pesquisa nacionais e internacionais, contribuindo assim para a preservação e conservação das espécies, dentro de um plano de gestão ambiental que inclui ainda o Campo de Instrução do CIGS (CICIGS).

A educação ambiental promovida pelo Zôo é direcionada a militares, universidades, escolas e as comunidades mais carentes da área do Campo de Intrução do CIGS. Uma das principais ferramentas na sensibilização das pessoas da preservação das espécies e do habitat é justamente quando ocorre essa proximidade. Os visitantes ficam hipnotizados com a beleza do animal e imploram para tirar fotografias.

O trabalho junto aos animais é desenvolvido no Hospital Veterinário, dotado em sua infra-estrutura de salas de cirurgia e anestesia, radiologia, medicina interna e ambulatorial.

O CIGS ainda abriga as instalações do Núcleo Avançado de pesquisas do IBEx (NAPIBEx). O complexo abrange um Laboratório de Pesquisas em Nível de Segurança Biológica NB2, com possibilidades técnicas que, permitirão, no futuro, a evolução para o Nível de Segurança Biológica  NB3.

A equipe de pesquisadores é constituída de militares da área de saúde do Exército Brasileiro, com qualificações em nível de Pós-graduação, Mestrado e Doutorado. 

Alguns dos projetos em desenvolvimento são:

Avaliação do Soro Antiofídico Trivalente Liofilizado.
O soro possui uma validade de cerca de três vezes maior do que o soro líquido convencional, não necessita de conservação sob refrigeração, podendo ser armazenado em ambiente natural e, é o primeiro trivalente no Brasil. Esse soro possibilitaria para os militares de Pelotões de Fronteiras e população de comunidades distantes a diminuição de seqüelas como amputações de membros, complicações renais e até óbito pelo acidente ofídico.
       
-“Avaliação do Estabelecimento de focos Filariose na Amazônia – Roraima”.
Existem ainda três projetos de pesquisa amazônica em fase de implantação: o primeiro deles é sobre “Investigação e controle de Tuberculose em Conscritos do Exército Brasileiro”; o segundo deles realiza “Pesquisa sobre a incidência da Larva migrans cutânea e Larva migrans Visceral em Organizações Militares” e o último, verifica a “Diversidade Genética e Biológica de Trypanosoma cruzi”.

Tem-se buscado fazer o reconhecimento nos municípios envolvidos, a começar por São Gabriel da Cachoeira e seus Pelotões Especiais de Fronteira, de modo a levantar possibilidades e dificuldades, a fim de adequar os projetos propostos à realidade encontrada.

A razão de ser do CIGS é a capacitação de recursos humanos para o combate na selva visando proteger a Amazônia Brasileira. Ao longo desse processo de aperfeiçoamento que já dura mais de meio século, essa escola passou a ser considerada por muitos países como o melhor centro de instrução para combate na selva do mundo. Basta observar as centenas de alunos estrangeiros formados até hoje.

Os cursos e estágios funcionam no gigantesco campo de instrução com o perímetro de 250 Km e  1.250Km², o equivalente a duas vezes e meia a região metropolitana de Manaus, com mais de dois milhões de habitantes. Tais dimensões permitem que sejam conduzidas uma variada gama de operações e um rodízio na utilização das áreas de instrução, possibilitando que o meio ambiente se regenere. Basta olhar as fotografias aéreas desse campo de instrução e de outros, sob a responsabilidade do Exército, para que se perceba a significativa contribuição que as Forças Armadas brasileiras prestam na conservação do meio ambiente.

Além das onças fazerem parte do folclore amazônico e fascinarem as pessoas com sua beleza, elas materializam o espírito do Guerreiro de Selva por todas as suas características. O distintivo dos especialistas em combate na selva é uma onça devido à astúcia, coragem e adaptabilidade ao ambiente.

É lógico que houve falha na segurança e que o animal ficou estressado na cerimônia. Entretanto, acidentes e incidentes ocorrem em todas as profissões e em todos os lugares. O Exército Brasileiro já está tomando as providências cabíveis, investigando o que ocorreu e serão tomadas providências para mitigar esses riscos. O momento mais crítico do manuseio das onças é ao retirá-las das jaulas e ao devolvê-las. E foi nesse contexto que ocorreu e não na cerimônia da tocha olímpica, como muitas pessoas estão veiculando. É possível que tenha havido alguma falha humana na colocação da coleira ou da corrente da Juma, o que será esclarecido.

Se o CIGS não acolhesse os felinos apreendidos pelo IBAMA, teriam que ser abatidos, pois não podem ser reintroduzidos. É provável que o Exército reveja a forma de participação dos felinos nas paradas militares. Não menos importante também é que as milhares de pessoas que as milhares de pessoas que visitaram o CIGS ao longo desses anos e fizeram questão de tirar a foto mais tradicional de todas, ao lado daquele magnífico felino, pensem no assunto e verifiquem se, com essa atitude, não passaram a compartilhar a responsabilidade pelo abate.  

O incidente ocorreu fora do evento da Tocha olímpica e dentro das instalações do Zoo, que faz parte da área do CIGS. As onças participam semanalmente das formaturas militares do CIGS, que ocorrem a 50m de suas jaulas. Assim sendo, na minha opinião, não cabe algumas declarações de que necessitaria de autorização do IBAMA.

A repercussão que o lamentável incidente tem tido é unicamente pelo fato de ter ocorrido quando vários jornalistas e pessoas estavam no interior do CIGS. O procedimento de segurança de abate de animal é uma medida extrema que ocorre em qualquer zoológico ou centro de reabilitação quando se considera que a integridade física de alguém possa estar ameaçada, as declarações do Exército apontam nessa direção. Cabe-nos apenas lamentar, aguardar as investigações e os novos reajustes sobre a participação dos felinos nos eventos.


Logo do CIGS com a figura da onça JUMA

Juma já é imortal, as suas fotografias foram estampadas no distintivo do CIGS e no distintivo do curso de Guerra na Selva. Milhares de pessoas têm fotografias com ela e estão postadas no facebook. É interessante conhecer alguns detalhes do CIGS e suas atividades para entender melhor o cenário do evento. No atual contexto do Brasil, quando muitas pessoas rejeitam as Olimpíadas e alguns aproveitam para se promover, uma onça que não tinha nada a ver com isso, acabou virando mártir.

SELVA!

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