Publicado Gazeta Mercantil 04 Fevereiro 2004
Virginia Silveira
O Comando da Aeronáutica concluiu a negociação com a empresa Eads Casa visando a modernização da frota de aviões de patrulha marítima P-3 Orion, da Força Aérea Brasileira (FAB). O diretor geral da Eads no Brasil, Eduardo Marson Ferreira, disse que a empresa aguarda agora os trâmites finais para a assinatura do contrato, avaliado em US$ 326 milhões.
Segundo informações do Subdepartamento de Desenvolvimento e Programas da FAB (SDDP), o contrato de financiamento do projeto P-3BR está sendo analisado neste momento pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional. A previsão da Aeronáutica é que o contrato comercial seja assinado com a Eads Casa no segundo semestre deste ano. A Eads Casa é uma empresa controlada pela Companhia Européia de Aeronáutica, Defesa e Espaço (Eads), a segunda maior empresa aeroespacial do mundo.
O projeto é considerado polêmico e divide opiniões até mesmo no âmbito da Aeronáutica, com base no argumento de que o P-3 é um avião muito antigo, fabricado há cerca de 40 anos e também pelo fato de existir uma opção nacional, desenvolvida pela Embraer. Trata-se do modelo P-99, que foi encomendado pela Força Aérea Mexicana e será entregue este ano.
O Centro de Comunicação Social (Cecomsaer) da Aeronáutica informou que a Embraer foi convidada para participar do projeto P-3 BR, mas declinou do convite em novembro de 2000, quando a FAB iniciava o processo de escolha da empresa que faria a modernização. Além da Eads Casa, também participaram da seleção a Alenia-Galileu Aviônica (Itália) e a Lochkheed Martin (EUA), fabricante original do P-3.
A assessoria de imprensa da Embraer disse que a empresa não vai se pronunciar sobre o assunto. Segundo a Aeronáutica, a Embraer também apresentou, fora do contexto do processo de seleção do P-3BR, uma proposta alternativa envolvendo o avião P99. A proposta da Embraer, segundo a Aeronáutica, foi estudada com bastante cuidado levando-se em conta a sua política de conceder preferência às empresas nacionais para a execução de projetos aeronáuticos.
"As análises levadas a efeito permitiram verificar que a aeronave, apesar das suas reconhecidas qualidades, não seria capaz de atender completamente as necessidades operacionais e aos requisitos estabelecidos pela FAB para as missões de patrulha marítima e anti-submarino no cenário brasileiro", declarou a FAB em nota enviada a este jornal.
A plataforma ERJ-145 da Embraer, segundo a Aeronáutica, depara-se com algumas limitações operacionais como autonomia, capacidade de carga e espaço reduzidos para as missões a que se destinariam no território brasileiro. "O P-3 dispõe de grande autonomia e raio de ação, 16 horas voando a 300 metros de altura sem reabastecimento e velocidades de cruzeiro de até 550 km/hora".
Em relação ao estudo recente feito pela Marinha dos EUA, que recomendou a troca das asas e da cauda do avião por problemas estruturais e de fadiga, a FAB informou que o objetivo da avaliação foi colher dados para o desenvolvimento de ações necessárias à extensão da vida útil da frota.
"As aeronaves P-3 do acervo da Aeronáutica são do modelo P-3 A com cerca de 60% de "Fatigue Life Expended" (FLE), sendo os 40% restantes suficientes para voar, durante o tempo previsto de sua utilização pela FAB, sem a necessidade de reparos estruturais ou troca das asas e empenagem horizontal".
As aeronaves compradas pela FAB, segundo o Cecomsaer, foram escolhidas após rigorosa seleção realizada por engenheiros da Diretoria de Material Aeronáutico e Bélico (Dirmab) da FAB. Com o projeto P-3 BR, segundo a Aeronáutica, a frota de P-3 estará operacional por mais 25 anos.
A Eads, que detém 5,6% do capital da Embraer e 45% da Dassault, disse que considera natural a existência de redundância de interesses entre duas empresas parceiras e que eventualmente pontos não convergentes são discutidos, como no caso do avião de patrulha marítima da FAB. "O nosso relacionamento com a Embraer é muito mais amplo e de longo prazo e não deve ser afetado por esse contrato com a FAB", disse o diretor, Eduardo Ferreira.
Os aviões P-3, segundo a Aeronáutica, são a única plataforma com autonomia suficiente para cobrir todo o espectro das missões constitucionais da FAB, inclusive acordos de busca e salvamento, com capacidade de lançamento de bote salva-vidas e conjuntos de sobrevivência. O projeto de renovação do P-3 contempla a integração de sensores e armamentos que colocarão os aviões brasileiros na fronteira tecnológica da aviação de patrulha marítima.
O alto grau de aceitação do P-3 no mundo, segundo o vice-presidente da Lochkheed para as Américas, Ron Covais, pode ser medido entre seus operadores, distribuídos em 17 países e com uma frota de mais de 400 aviões em serviço. A maior parte dessas frotas pertence à Marinha norte-americana, com cerca de 240 unidades. O programa SLAP (Service Life Assessment Program), que visa estender a vida útil do P-3 até 2015, é liderado pelos EUA.
Parceria com Embraer no Airbus
O diretor geral da Companhia Européia de Aeronáutica, Defesa e Espaço (Eads), segunda maior empresa aeroespacial do mundo, Eduardo Marson Ferreira, disse que a Embraer é prioridade para o grupo dentro da sua estratégia de inserção no mercado nacional. A Eads é uma das parceiras estrangeiras da Embraer com participação de 5,26% no capital acionário da empresa.
Segundo o executivo, as duas empresas estão negociando vários projetos de parceria. Um deles prevê a participação da Embraer na fabricação de partes e peças e a venda de serviços na área de projetos de engenharia para o Consórcio Airbus, onde a Eads tem 80% de participação. "Estamos iniciando as nossas discussões com a Embraer sobre áreas potenciais para cooperação mútua, mas vemos grandes possibilidades também em atividades de treinamento de recursos humanos e projetos na área de defesa", explicou Ferreira.
Alguns projetos na área de defesa já estão em pleno desenvolvimento, segundo Ferreira. Um exemplo são os sensores embarcados desenvolvidos para os aviões de patrulha marítima da Embraer. Toda a parte de sistemas de armas do projeto F-X, de caças supersônicos para a FAB, segundo ele, também será fornecida pela Eads, por meio de uma das empresas do grupo – a MBDA, com fábricas em vários países da Europa.
Maior fabricante de mísseis do mundo, a MBDA, produz o modelo Mica, que foi oferecido pelo Consórcio Mirage 2000BR na concorrência F-X da Força Aérea Brasileira (FAB).
O diretor da Eads disse ainda que não existe uma concorrência direta entre a nova família de jatos da Embraer 170/190 (de 70 a 118 lugares) e o modelo A318 da Airbus. "A versão A-318 começa em 118 lugares. Os dois aviões se tocam, mas não são concorrentes diretos, tanto que a Jet Blue encomendou no ano passado, tanto os aviões 190 da Embraer quanto os modelos da Airbus nessa faixa de assentos", disse Eduardo Marson Ferreira.