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F/A-18 – Voo – Parte 2, Ar-Ar sob a perspectiva do cockpit

Voo – Parte 2, Ar-Ar sob a perspectiva do cockpit
 

por Vianney Jr.


O fog havia decolado pouco antes de nós (ainda cruzaríamos com ele já na condição de stratus a uns 1.300 pés), e era hora de por o “Vespão” a zunir. Aqui, um ponto pro Super Hornet. O caça dispõe de uma APU – Unidade Auxiliar de Força, que provê a energia necessária para uma partida autônoma dos motores, ou seja, toda aquela parafernália de fontes externas ou compressores, está inserida na própria aeronave, e que além da energia necessária ao acionamento das turbinas, abastece também todo o sistema elétrico, bombas de combustível e hidráulicas e o ECS – sistema de controle de ambiente. Uma mão na roda se pensarmos na logística de operação nas mais remotas bases e até mesmo a partir de pistas de pouso improvisadas em rodovias (highway strip operations).
 
Observando que as “panelas” não excedam os 871ºC durante a partida, ouvimos a música (para quem gosta) de cada F414-GE-400 “pitando” a 61% de RPM em idle. Nos cheques de Go / No-Go que precedem uma nova decolagem, relembro de algo que já me pareceu curioso na apresentação feita pela equipe de engenharia da Boeing. Esta aeronave quando sai da linha de montagem sequer necessita de um voo de avaliação, uma vez que todos os sistemas dispõem de self-test integrado totalmente computadorizado.

Sendo assim, começa o pretakeoff BIT (built in test), acompanhado item a item no meu MFD (display multifunção) da direita, o que produz uma sinfonia de superfícies de controle acionadas e recolhidas, de sistemas diversos elétricos e hidráulicos que auto-avaliam sua perfeita condição e sensores que tentam reduzir a zero qualquer possibilidade de falha, misturando-se ao sibilar dos motores, ouvido amenamente dentro do cockpit, já com o canopy fechado. Curso completo das superfícies primárias de controle, livres: ailerons, profundores e lemes. Flaps, speedbrake e probe de reabastecimento em voo. Tudo checado em um balé coreografado em conjunto à equipe de apoio em terra.
 
OBOGS girado para posição “ON”, e sentimos em nossas máscaras o oxigênio puro, a 100%, gerado a bordo. Autorizados pela torre de Oceana para a o táxi, é hora de mover a alça de segurança da Martin Baker SJU-5/6 NACES zero/zero, para a posição “armado” e em caso de um imprevisto grave podemos nos ejetar com a aeronave ainda no solo e parada. Durante o táxi, me distraio por um momento da avaliação em curso, para apreciar as belas formas deste pássaro que conduziríamos aos céus dentro de instantes. Aproveito para checar a “seis” (posição 6 horas, correspondente à cauda do avião) e procurar pontos cegos na área em torno do caça.
 
Na cabeceira da 5R (Pista de pouso com direção arredondada para 050º em relação ao norte magnético da Terra. Como são duas pistas paralelas, uma é esquerda “L” e a outra direita “R”) recebemos autorização para decolar, o que fazemos com potência de pós-combustão, e nos erguemos do solo antes da primeira interseção, algo em torno de 500 metros da cabeceira, mesmo com o peso de decolagem de 22.524 kg.
 
Rapidamente, sob vetoração, o ROMAN 31 (nosso callsign) livra a ATZ (zona de tráfego de aeródromo) e atinge o nível de voo em rota para uma área dentro do espaço aéreo restrito onde poderíamos cumprir as etapas da missão sem por em risco aeronaves civis.
 
Interceptação
 
Em meio à congestionada região entre Virginia Beach e Norfolk, na qual só a Base Aeronaval de Oceana abriga em torno de 300 caças em constante treinamento e sem falar na rota de aeronaves comerciais e da aviação geral, utilizando o radar da Raytheon, AESA APG-79, cujo alcance é de aproximadamente 160 km, rastreamos múltiplos alvos aéreos por vez, explorando a variação de cobertura do scan de AZ/EL (azimute e elevação, respectivamente).

Todo o processo de seleção de armas, controle de modo de combate e elevação do radar, é feito, como já descrito em artigos anteriores, sem retirar as mãos dos controles (HOTAS – Hands On Throttle-And-Stick). Com o polegar direito selecionamos o míssil e o modo de combate, neste caso usamos o BST (boresight acquisition mode – modo de aquisição de alvo) e as funcionalidades do modo ACM (air combat manouveuring), e com o indicador esquerdo, designamos o alvo e a elevação da antena do radar.
 
Só para lembrar os princípios de uma interceptação, no sentido de usar o radar para detectar um alvo específico e então usar a geometria de interceptação, o piloto deve cumprir uma série de tarefas:
 
·         Aproximar-se do alvo
·         Estabelecer a identidade do alvo – friend or foe (um processo contínuo)
·         Se uma conversão for necessária, obter a separação suficiente do alvo
·         Seguir para uma curva de perseguição pura (pure pursuit)
·         “Encaudar” a aeronave hostil
·         Manobrar para dentro dos parâmetros da arma selecionada
 
A técnica mais usual para cumprir estes passos é a baseline intercept, a partir da qual situações táticas mais complexas se desenvolvem. Com o uso do APG-79, as informações dispostas no MFD facilitam a vida do piloto para gerenciar uma melhor aquisição do CATA (Collision Antenna Train Angle), ou simplesmente, o ângulo para a mais rápida interceptação do alvo. Além disso, as informações podem compor o cenário de SA – Situational Awareness, ou consciência situacional, exibidos no display central colorido do mapa móvel, dando uma clara noção de onde estão os jogadores neste tabuleiro de combate, suas vantagens e ameaças.
 
A velocidade de resposta e facilidade de operação da interface piloto-caça nos causou boa impressão e fica claro porque os projetos aeronáuticos militares surgem a partir de um ponto forte em particular. No Super Hornet a impressão que fica é que desenvolveram um caça multifunção com alta manobrabilidade, robustez e resistência a partir de um radar capaz de integradamente com outros sensores e sistemas, oferecer uma consciência situacional única se comparado aos modelos em operação de combate real na atualidade.
 
Para finalizar, como não nos seria possível “abater” aeronaves amigas, este “instinto agressivo” ficou guardado para o simulador, com exercício de voo online com outros pilotos do VFA-106, e que descreveremos num capítulo próximo.
 
Obs.: Esperamos que o caro leitor compreenda nosso melhor esforço em oferecer uma visão, por partes, dos sistemas do caça em questão, uma vez que sua operação em conflito real ocorreria numa consonância de comando, controle, comunicações e inteligência. Além disso, o próprio radar AESA APG-79 do F/A-18E/F “trackeia” simultaneamente alvos aéreos, terrestres e marítimos, e, em integração com outras informações a partir de sensores embarcados e externos, como o MIDS (Link 16), tem uma visão mais completa do que uma simples ameaça isoladamente. A formação tática também influi no próprio uso dos sistemas objetivando uma atuação mais furtiva e discreta. Para se ter um exemplo, de forma genérica, em uma esquadrilha com dois elementos (quatro aeronaves) cabe ao líder o planejamento e tomada de decisões, navegação e varredura radar primária, cobertura visual do número 2 e o engajamento do primeiro alvo, se for o caso.

O número 2 deve, além de manter a formação, fazer a cobertura visual e proteger o líder, manter consciência navegacional e alerta de recebimento de varredura radar hostil. Ao número 3 cabe apoiar o número 1, desempenhar o planejamento e tomada de decisões em caráter secundário, se determinado ou a situação exigir, navegação e monitoramento radar alternativo, cobertura visual do número 4 e é de sua competência atacar um segundo alvo, quando aplicável. O número 4 cobre o número 3 e igualmente cuida da formação, mantendo-se como os demais, atento à navegação e ao RWR – radar warning receiver, o que avisaria sobre a eventual “pintura” do grupo por radar inimigo.

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