EXCLUSIVO: O Comando do Ar em 2030
DefesaNet traz com exclusividade para seus leitores a provocativa análise do pesquisador Vianney Jr publicada pela Real Sociedade Aeronáutica, do Reino Unido, uma das mais respeitadas entidades no meio aeroespacial, no ano de seu 150º aniversário.
por Vianney Júnior
Pesquisador
@jrvianney
Como caças e drones irão trabalhar em conjunto no futuro?
O ano é 2035. O caça da Lockheed Martin F-35 Lightning II está próximo de se tornar o último caça pilotado da Força Aérea, Marinha e Fuzileiros dos Estados Unidos da América. Substituindo a tradicional “Red Flag”, o exercício “Linked Flag” é o atual treinamento avançado de combate conjunto integrado, levando pilotos e máquinas ao limite. Esforçando-se para estabelecer uma conexão segura, mesmo sob intenso ataque cibernético das forças vermelhas, UCAVs – drones armados de combate, compartilham dados e a aquisição de alvos com os poucos pilotos humanos ainda presentes na frente de combate, por meio de um datalink tático criptografado de alta velocidade. A essa altura, as aeronaves com geometria e cobertura stealth (furtiva), respectivamente de dispersão e absorção de emissões de frequência radar, tentam manter alguma margem de “invisibilidade” aos novos sensores baseados em tecnologia VHF modificada, e plasma.
Os “aggressors” aqui, tal qual as ameaças do mundo de então, empregam capacidades integradas e baseadas em rede, como parte de uma estratégia de A2/AD, ou anti-acesso, e negação de área, em um cenário de um espaço aéreo altamente contestado. Assim sendo, é quase impossível para as clássicas plataformas C4ISR (comando, controle comunicações, computadores, inteligência, vigilância e reconhecimento), como as convencionais aeronaves AWACS (alerta antecipado e controle), realizar missões de gerenciamento de batalha neste frenético ambiente de ameaças.
Assim sendo, diante de cenário tão inóspito, as plataformas não-tripuladas, menores e dispersas como um enxame, se tornaram uma ferramenta crítica para se garantir uma rede sustentável – e com capacidade de sobrevivência, viabilizando o comando e controle descentralizado e eficiente. Neste cenário de 2035, observa-se que o combate aéreo eficaz relembra uma alcatéia de hienas cercando sua presa (a espécie pode não ser tão glamurosa, mas a efetividade de suas táticas de ataque são indiscutíveis). Essa tática de combate-em-massa, no qual a aeronave (sensor) que acopla os alvos está constantemente se alternando, ao mesmo tempo que compartilha posição relativa, altitude, velocidade, azimute, deslocamento destes alvos, por meio de flashs rápidos de datalink, produz a dispersão do foco de um pacote inimigo, mesmo quando em maior número e equipado com aeronaves de tecnologia superior. O resultado do “Jogo da Hiena”, quando precisamente executado, é uma completa confusão da consciência situacional do inimigo, induzindo à quebra de sua formação tática, e propiciando um ataque limpo de “uma das hienas” (shooter do momento), dentro das melhor zona de mortalidade (kill zone) especificada para o armamento empregado.
Mesmo com todo estes treinamentos e exercícios realísticos, a situação em 2035 é que as avançadas ameaças ar-ar e supercífie-ar estarão ao alcance de mais países, pelos quatro cantos do mundo. Muito diferentemente da vantagem do poderio aéreo experimentado pelos Estados Unidos nos anos 90, em torno de 2030 a estrutura militar aérea americana, mesmo detendo o maior poder aéreo global, não será capaz de contrapor, com a costumeira ampla margem de sucesso, o vasto leque de capacidades de adversários potenciais.
Guardando um lugar para o piloto humano
Cada vez mais, o meio militar se convence da capacidade dos sistemas não-tripulados executar com eficácia de forma autônoma missões ISTAR – informação, vigilância, aquisição de alvos, e reconhecimento / ataque / combate aéreo. Os drones, mais especificamente os UCAVs (unmanned combat aerial vehicles), têm estabelecido sua presença nas doutrinas de emprego da arma aérea, e isto parece ser um ponto sem volta.
Contudo, quando observamos o desenvolvimento dos modelos e táticas de emprego dos drones, ou UAVs, pelas forças americanas – que têm estado na vanguarda deste processo, vamos encontrar no presente estágio, diferenças conceituais acentuadas. A US NAVY tem caminhado em direção de elementos de Inteligência Artificial (IA), e seus esforços demonstram a operação de drones basicamente sob um modo pré-programado. A US AIR FORCE por sua vez, prioriza a pilotagem remota destes veículos aéreos. A diferença fica bem explícita na própria nomenclatura adotada por estas Forças. A Marinha utiliza o termo “operadores de drones”, ao passo que a Força Aérea adota a denominação de “pilotos de drones”.
A futura interação entre drones e caças pilotados por humanos tem sido objeto recorrente de estudos conduzidos por pensadores dos estudos de guerra, militares e pela própria indústria de defesa. Uma das interessantes questões emergidas destes estudos é aonde a melhor interação se daria: drones com caças monoposto, ou drones com caças biposto, com piloto e operador de armas e sistemas. Como exemplo, destaca-se que a França emprega seus Dassault Rafale biplace em missões mais complexas, sobre território com ambiente aéreo altamente contestado, entre estas as nucleares.
Já com um robusto histórico, e o grande lagado de seus Naval Flight Officer (NFO), a US NAVY conhece com sobras as vantagens e amplitude das funções que podem ser absorvidas por uma tripulação dupla. Em favor da tecnologia e na contramão de sua experiência, a Marinha Americana com os F-35C, juntamente com os F-35B dos MARINES aposta que esta possível futura operação em conjunto com UCAVs repousa nas capacidades autônomas dos novos drones, e nos sistemas computadorizados dos Lightning II. Um único piloto conduz seu caça ao mesmo tempo que funciona como um controlador avançado (da sigla em inglês, FAC) de um grupo de drones de combate.
Estas mudanças são mesmo impactantes, e nelas instalam-se até mesmo as responsabilidades com a aquisição de meios e capacidades. Só para se ter uma idéia mais clara desta transformação e suas consequências, se olharmos para equipamentos e equipagens que compõem um porta-aviões da US NAVY, chamamos a atenção para o fato de que um X-47B (que já demonstrou sua capacidade de operação autônoma de pousos e decolagens no seletivo ambiente de um convoo) tem praticamente a mesma envergadura de um F/A-18 Super Hornet, o que o faz lembrar que por razões óbvias da Física, dois corpos não ocupam o mesmo lugar ao mesmo tempo. Logo, com as restritivas dimensões de um porta-aviões, para cada UCAV X-47B que entre, haverá a correspondente retirada de um caça tripulado. Assim, pode se deduzir que uma única aeronave com um humano pilotando, liderará entre um a quatro drones. Um tipo de formação tática que mantém a tomada de decisão nas mãos do homem. [Por quanto tempo mais?]
Encarando um futuro ameaçador
Em maio de 2016, o Chefe do Estado-Maior da Força Aérea Americana (USAF) divulgou o documento Air Superiority 2030 Flight Plan (AS 2030), resultado do trabalho da Equipe de Iniciativas de Capacidades Colaborativas (ECCT), que centrou esforços na reunião de opções de capacidades requeridas para habilitar uma Força Conjunta de Superioridade Aérea em teatros operacionais altamente contestados no ano de 2030 e além.
De acordo com o pensamento doutrinário americano, expressado naquele documento, os tipos de capacidades das ameaças provavelmente avançaram em duas direções nos próximos 15 anos:
i) Incremento dos cenários de ameaças: Os sistemas tradicionais, como aeronaves de caça, sensores e armas, com características avançadas e incorporação de melhorias tecnológicas, que estão ficando acessíveis a um número maior de países, fator que expande essas ameaças a cenários e locais diversos ao redor do globo;
ii) Incremento dos tipos de ameaças: O desenvolvimento de capacidades com efeito de negar a vantagem até então presumida do Poderio Americano no meio aéreo e espacial, tais como a intensidade de ameaças cibernéticas sofisticadas, armas hipersônicas, mísseis de cruzeiro com tecnologia stealth (furtiva), e modernos sistemas de mísseis balísticos convencionais.
É impossível não associar o polêmico (custo e prazo) desenvolvimento do caça de 5ª geração americano, F-35, com uma das conclusões apresentadas no AS2030: A equipe ECCT firmemente concluiu que a USAF deve evitar o pensamento focado em plataformas de “nova geração” (next generation). Esta “fixação” comumente cria um desejo de forçar os limites da tecnologia dentro dos limites de um programa formal. O alerta do documento quanto a esta questão, é que “forçando a barra destes limites dentro de um programa formal, aumenta-se o risco a níveis inaceitáveis, resultando em aumento de custo e atrasos no cronograma”. Novamente o AS2030 gera uma inevitável associação aos desafios de desenvolvimento deste caça de 5ª geração americano, quando descreve “o risco de cancelamento em virtude da quase inevitável performance abaixo das expectativas, que resulta na entrega de capacidades em atraso às necessidades por anos, ou mesmo décadas”.
Já em agosto de 2016, a USAF deu declarações sobre um futuro jato de caça, que seguiria ao F-35. Ao invés de mencionar um caça de 6ª ou 7ª geração, a Força Aérea Americana tem se referido a esta aeronave com os termos Next Generation Air Dominance (NGAD), ou Penetrating Counter Air (PCA). Para esta futura plataforma, a maior diferença com os caças como os conhecemos até aqui, será a forma de sua obtenção (desenvolvimento e aquisição), e a auto definição de “sensor––ponto-de-conexão” (sensor node), o que revela que estamos no fim de uma era. O piloto de caça como costumávamos imaginá-lo, é uma espécie ameaçada.
Enquanto isso, a Rússia já está desenvolvendo seu caça de 6ª, e possivelmente, de 7ª geração, de acordo com declarações do comandante-em-chefe de suas Forças Aérea e Espacial, General Viktor Bondarev. “Se a pesquisa e a fase de desenvolvimento [de vetores de futura geração] parasse agora, ira ser perdida para sempre”, afirmou Bondarev. A Rússia já decidiu que seu caça de 6ª geração será projetado para duas versões: pilotada, e não-tripulada. O comandante da Força Aérea Russa destaca as limitações do corpo humano, demonstrando encantamento com as possibilidades dos sistemas UCAVs, que segundo ele “são muito mais eficientes, e não estão sujeitos a qualquer limitação por fatores de carga [Força G]”. O General Bondarev ainda destaca sua visão do potencial futuro dos drones de combate russos: “você já imaginou a capacidade superior a dos humanos que um caça, bombardeiro, ou jato de ataque não-tripulado pode ter?”
Os enxames de drones consagrarão a tática das “hienas” ou das “abelhas”?
Em outubro de 2016 o Strategic Capabilities Office, do Departamento de Defesa dos Estados Unidos (equivalente americano ao Ministério da Defesa brasileiro), em conjunto com o Naval Air Systems Center, bem-sucedidamente realizaram o lançamento e uma complexa sequência de testes com um enxame de micro-drones. Três caças da US NAVY F/A-18 Super Hornet lançaram 103 drones PERDIX, que demonstraram no experimento, comportamento de ação coletiva em estrutura de enxame, sem uma pré-programação individual, mas sim a cooperação e sincornização como que em um organismo coletivo, compartilhando um “cérebro descentralizado e distribuído”, assim, a tomada de decisão é feita pela adaptação mútua, como um enxame de abelhas que compartilham uma “missão” comum.
Maior que o PERDIX, o SKYWALKER X6 chinês afirma em seus materiais de divulgação ser capaz de operar colaborativamente em rede e realizar missões de inteligência, vigilância e reconhecimento de forma integralmente autônoma. Acredita-se que a China disponha de drones kamikazes com cabeças de guerra. |
Descobrindo uma maneira de lutar (e vencer)
Em um ponto, as visões do Ocidente e Oriente concordam plenamente: a interação entre caças pilotados por humanos e sistemas não-tripulados terão um papel definitivo no esforço pelo “comando do ar” nos disputados céus de 2030 e além.
No entanto, pelo lado dos militares americanos, não há a crença em uma única capacidade apta a uma solução “tiro e queda”, ou uma única “silver bullet”, a bala de prata em expressão nativa. Um foco multidisciplinar das capacidades se faz necessário. A equipe da ECCT reuniu usuários e operadores de todas as áreas e funções da USAF com as comunidades de aquisição, e ciência e tecnologia. Empregando modelagem, simulação e jogos de guerra, de maneira independente, o grupo foi capaz de identificar cinco macro áreas de desenvolvimento das capacidades necessárias à superioridade aérea em suporte à missões conjuntas:
(1) bases e logística;
(2) identificação, correção, acompanhamento, e análise (que corresponde à reunião e análise de dados de fontes em todos os domínios, extraindo as informações operacionais relevantes, e confiavelmente distribuindo as conclusões para a tomada de decisões críticas);
(3) identificação de alvos e seu engajamento;
(4) comando e controle (C2);
(5) imateriais (doutrina, organização, treinamento, conteúdo, lógica, recursos humanos, facilidades, e políticas – DOTMLPF-P, da sigla em inglês).
O resultado prático produzido pelo AS2030 da ECCT foi o estabelecimento de cursos de ações de nível estratégico para mitigar “gaps” de capacidades, assim como, apontar oportunidades de mudanças de visão para a obtenção de maior eficiência e eficácia.
A lição por trás do AS2030 da USAF é, guardadas as devidas proporções e ajustadas às próprias realidades nacionais, válida para Forças Aéreas de todo o mundo. A otimização do formato atual e futuro de investimentos e de obtenção de capacidades requer mais que sempre uma abordagem holística e interdisciplinar das missões e correspondentes condições de uma determinada força aérea para que se possa garantir os requerimentos de operacionalidade [e poder dissuasório] adaptado ao cenário complexos de ameaças que veremos a partir de 2030.
Definindo um drone em meio á revolução tecnológica
É fácil de se reconhecer a velocidade com que os drones têm ganhado espaço no emprego das forças militares, como também a forma como sua atuação em combate tem evoluído. Como exemplo, o bem sucedido Northrop Grumman X-47B, primeiro demonstrador de tecnologia para um veículo aéreo de combate não-tripulado (UCAS-D) a fazer pousos e decolagens em um porta-aviões da Marinha Americana, agora é anunciado como uma futura plataforma-tanque para reabastecimento aéreo.
Originalmente concebido em 2006 como um drone stealth (de baixa assinatura radar) de ataque profundo sobre espaço inimigo, o programa migrou em 2011 para uma versão um pouco menos furtiva, e com armamento mais leve, para operar embarcado nos porta-aviões da US NAVY, e serviria como um “gap filler” nas ações contraterrorismo, naquele momento ameaçadas pela eventual perda de bases de drones no Afeganistão. Em 2016, nova mudança, e o anúncio de que o X-47B será designado oficialmente MQ-25A Stingray, e servirá primariamente como reabastecedor em voo (o que parece mais uma cortina de fumaça para a retomada do propósito original). Para os países que estão desenvolvendo seus próprios drones, a evolução dos requerimentos e capacidades dos UAVs americanos podem representar um ponto de reflexão: em qual desenvolvimento mirar, e para quais missões focar em uma realidade de rápido avanço tecnológico?
Questões éticas
Não há dúvidas, agora, da relevância dos veículos aéreos não-tripulados nos conflitos da atualidade – particularmente nos ataques de precisão com efeitos colaterais minimizados, na eliminação de alvos de alta importância. Ainda assim, mesmo com a efetividade demonstrada nas operações onde têm sido empregados, os drones têm levantado questionamentos, o que só deve aumentar, em razão de um grau cada vez maior de autonomia dos “robôs de guerra”.
A constante evolução das tecnologias e a capacidade dos sistemas computadorizados os tem feito, no âmbito do combate: vê primeiro, melhor avaliar uma situação, e tomar decisões instantâneas, pondo mesmo em cheque as habilidades humanas como guerreiro mais qualificado. No segundo semestre de 2016, um sistema de inteligência artificial (IA) “piloto de caça”, batizado “ALPHA”, desenvolvido pela Psibernetix, não apenas derrotou outros “pilotos artificiais”, como também abateu um experiente coronel da reserva da Força Aérea Americana. Numa série de combates aéreos simulados, ALPHA teve sucesso em destruir o piloto humano toda vez, em engajamentos 1×1 em arena BVR (combate com mísseis além do alcance visual).
A conclusão após as simulações foi de que o “piloto” IA foi capaz de melhor posicionar-se após detectar seu oponente humano, calcular a melhor distância, altitude relativa e velocidade para lançar seus mísseis e obter a maior probabilidade de letalidade (Pk), executar precisamente manobras de quebra do acoplamento do radar do caça pilotado, e desengajar no melhor momento. Cada cálculo, pelo menos 250 vezes mais rápido do que o tempo necessário ao seu inimigo humano para que o visualizasse como um alvo em seu radar.
Quanto tempo mais para que um combate como este saia do ambiente de simulação, e um drone abata um piloto humano pela primeira vez? Quais serão as consequências quanto esta nova realidade demonstrar sua superioridade, e sua condição de decidir pela vida ou morte de um oponente? Seja ele outro sistema, ou um ser humano? Enquanto os militares ocidentais manifestam orgulho em manter o homem no centro da decisão quanto esta envolve o emprego de força letal, outras nações (ou mesmo atores não estatais, como grupos terroristas) podem não ter a mesma consciência. Liberando estes “imbatíveis” pilotos IA, assim como ALPHA, no primeiro dia de guerra pode criar um desconfortável dilema ético para todos os lados – ou seguir o exemplo, ou perder rapidamente!
Estas tecnologias despertam um delicado equilíbrio de questões éticas. Há uma percepção que o “cobate robótico” possa conduzir a uma falsa impressão do distanciamento da guerra, ou mesmo, a “videogamezação” das consequências mortais das batalhas. Outra discussão, é onde e quando os conflitos envolvendo drones se encaixam como confrontos assimétricos. Neste aspecto em particular, um problemático efeito colateral do emprego de sistemas não-tripulados aumentam o risco de ações terroristas nos países responsáveis por sua operação, como uma forma de retaliação a um inimigo que não se pode diretamente combater. A não exposição dos operadores de drones ao risco de morte ou ferimentos, muitas vezes a milhares de quilômetros do local do engajamento, desperta a crença de uma ética de guerra na qual “aquele que deseja matar, deve estar disposto a morrer”.
Seu orçamento pode suportar?
Afora todas estas considerações, nuances e fatores, há a questão do custo x produção. “Estamos cometendo os mesmos erros hoje, que aqueles de quando nos vimos forçados à criar Top Gun [denominação não oficial da Navy Fighter Weapons School, que formou a elite da aviação naval americana]. Enamorados com as grandes tecnologias de última geração, não tendo rivais à altura por anos, e todos estão apostando que isso continuará assim para sempre. Eu estou apostando na China! Eles são capazes de produzir 6.000 novas aeronaves por dia e pô-las pra combater.
E aí quero ver o que vamos fazer!”. Estas palavras são atribuídas a Dan Pedersen, fundador e primeiro comandante da famosa escola americana, e nos fazem lembrar que temos visto nos conflitos recentes, equipamentos de 100 milhões de dólares sendo empregados contra armas do “Longedaquistão”, de mesmo fim, que custam 100 mil dólares. É claro que não se pode supor que tenham qualidade equivalente. Longe disso. Mas, ainda assim, se considerarmos um estrondoso “kill ratio” (razão de vitórias/perdas) chegar-se-á a um ponto onde seus bolsos estarão vazios, e você não terá sua “arma melhor” no fim da linha de montagem, a tempo de entrar em serviço.
Quebrando paradigmas
O “Comando do Ar” profetizado por Giulio Douhet em seu tratado se tornou realidade, e muito evolui desde a publicação do livro deste estrategista da arma aérea, no ano de 1921. Agora (e no futuro), mais do que sempre, conquistar o controle do espaço aéreo é uma condição fundamental para propiciar às forças amigas uma vantagem assimétrica para se obter a vitória. Superioridade aérea representa prevenção de ataques inimigos, liberdade para atacar, liberdade de acesso e consciência situacional.
A superioridade aérea total em espaço altamente contestado pode não ser um objetivo realista nos teatros de operação prognosticados para 2030 e anos seguintes. É mais racional se considerar, como atingir um nível menor de controle de um determinado espaço aéreo, por tempo limitado e sobre uma área geográfica requerida para a execução da operação pretendida. Desta forma, o desenvolvimento de capacidades para se prover superioridade aérea futura deve levar em conta os níveis de opções que possam dar aos comandantes para que disponham suas forças por um determinado período de tempo e dentro de um espaço definido. A rápida transformação dos ambientes operacionais exige a quebra de velhos paradigmas. Não é concebível para os dias de hoje que o desenvolvimento de sistemas de armas (sejam eles operados por humanos ou autônomos de inteligência artificial) continue a repetir as abordagens tradicionais.
O atual sistema de obtenção de capacidades, e seu formato linear de planejamento e desenvolvimento conduz a uma entrega sempre “atrasada-para-necessidade” de sistemas críticos. [grifo do editor: um bom exemplo, são alguns programas de obtenção de produtos de defesa em curso no Brasil, que quando da data final de entrega e sua entrada em serviço, já estarão defasados em relação à tecnologia, isso sem falar dos pagamentos, que ainda se arrastarão por anos, mesmo ante a essa defesagem]
O conceito analítico tech x timing x cost pode ser acessado para analisar os níveis de maturação técnica, a mitigação de gaps operacionais, custo, e nível de interdependências, o que reforça a necessidade de alavancar a experimentação e a simulação. Um eficiente esforço de modelagem, simulação e jogos de guerra, o qual pode levar à determinação de um portifólio consistente de inovações advindo dos setores de ciência e tecnologia, é considerado pela equipe da USAF que produziu o Air Superiority 2030 Flight Plan (AS 2030), a chave para o sucesso.
Por meio da adoção desta abordagem, melhores opções serão criadas para que os futuros comandantes empreguem o conjunto de capacidades, integradas e centradas-em-rede, nos anos após 2030. Estas inovações tecnológias devem ser rápida e constantemente validadas através de uma eficaz prototipagem, e absorvidas ao atingirem um grau de maturação que permita sua incorporação, agregando capacidades avançadas dentro das Forças.
Tanto embora o tipo de abordagem, holístico e abrangente, adotado pelo AS 2030 tenha indubitavelmente beneficiado o pensamento acerca da Superioridade Aérea em espaços aéreos contestados, em torno de 2030, é ainda assim necessário constantemente aprimorá-lo, adicionando por exemplo, questões não especificamente militares, mas com alto poder de influência no resultado destas operações. Para além das pressões advindas de questões econômicas e financeiras, nós temos assistido em recentes eventos por diferentes partes do mundo, o incremento dos efeitos da opinião pública – dinamizados pela troca de informações em tempo real [grifo do editor: e muitas vezes influenciada por ações tendenciosas de setores da grande mídia], sobre os políticos responsáveis pela tomada de decisões [grifo do editor: leia-se, a explosão do populismo]. Os danos colaterais de uma operação militar – mesmo quando totalmente justificada e absolutamente necessária – podem gerar pressões contra a Força Militar, ou mesmo aumentar o risco de ameaças irregulares contra o estado. No final das contas, os medos, as expectativas e as demandas dos contribuintes serão refletidos em votos em uma próxima eleição. [grifo do editor: e o resultado já sabemos – nossos políticos não arriscarão seus projetos de poder ante à responsabilidade de decisões necessárias]
De volta ao início deste texto, nós concluímos que aquele exercício para a guerra aérea que será travada após 2035, começa aqui e agora.
Agradecimento Especial
DefesaNet agradece a Royal Aeronautical Society pela autorização para publicação da versão em português da análise “Command of the air in the 2030s”, e cumprimenta a todos os seus membros pela comemoração dos 150 anos de existência desta respeitada entidade. Nossos especiais agradecimentos a Tim Robinson, editor-chefe da AEROSPACE Magazine, revista oficial da RAeS, que originalmente publicou esta versão aberta da análise. |
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