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Embraer : Um caso a ser imitado

Luiz Carlos Mendonça de Barros

A Embraer anunciou na última quinta-feira ter completado a venda de 60 de seu jatos E 175 para a empresa American Airlines, no valor aproximado de US$ 2,5 bilhões. Além desta venda firme, segundo o jargão da indústria aeronáutica, a empresa americana assinou um contrato de opção de compra de mais 90 aeronaves do mesmo tipo. Se realizado, a venda total passará de US$ 6 bilhões.

Esta notícia com certeza já caiu no esquecimento da grande maioria dos leitores nesta segunda feira em que minha coluna mensal está sendo publicada. Afinal vivemos um período em que as atenções de todos os que se interessam por economia estão voltadas para a reunião do Federal Reserve nesta semana. Com a aprovação de um orçamento fiscal bianual pela Câmara de Representantes, o caminho para o Fed iniciar a retirada dos super estímulos monetários na reunião da próxima semana está aberto. O já famoso "tapering" está sendo considerado por muitos o carrasco das economias emergentes e o momento em que a economia brasileira pode voltar a viver os dias terríveis de 2002.

Por isto vou trazer algumas reflexões sobre o sucesso da Embraer e o que ele representa para nós brasileiros, pois acho importante que no momento em que se discute novamente a questão da privatização ele seja revisitado com profundidade .

A Embraer é hoje uma das três empresas mais importantes no setor de fabricação de aeronaves civis, ficando atrás apenas dos gigantes Boeing e Airbus. Além disso, já é um dos participantes mundiais de peso no setor de defesa e armamentos. No Brasil, sua posição como empresa de tecnologia avançada é única, pois nosso parque industrial é muito pobre neste quesito. Por isto quero provocar o leitor com uma pergunta simples: porque a Embraer conseguiu esta posição única de destaque? O que aconteceu de diferente para que o país da cerveja e do futebol tenha uma empresa como a Embraer? Para mim a resposta é simples e está relacionada com a definição do papel do setor público em uma economia em desenvolvimento, questão que divide os economistas no Brasil.   Para começar a contar esta história de sucesso temos que voltar no tempo e chegar ao início da segunda década do século passado quando um grupo de sonhadores militares da aeronáutica decidiu empreender um esforço para implantar a indústria aeronáutica no Brasil. Este pequeno exército de Brancaleone iniciou sua caminhada com uma decisão que permitiu a Embraer ser a empresa que é hoje: fundaram uma escola de engenharia aeronáutica (ITA) para criar no Brasil — antes de tudo — uma inteligência na área da engenharia aeronáutica.

Por muitas décadas, na medida em que desenvolvia a excelência na busca de sua missão, o ITA passou a formar engenheiros para atuar na atividade civil. Somente muito tempo depois é que a Aeronáutica toma o segundo passo estratégico na busca da criação da Indústria Aeronáutica no Brasil: passar do campo da engenharia de projetos de aviões para o da construção de aviões. Isto foi feito com a criação da Embraer como empresa 100% estatal e financiada com parte do orçamento destinado à Força Aérea.

Neste ponto acho que devo alertar o leitor que ao contar esta história estou me valendo de informações de terceiros, que me foram passadas no período em que, como presidente do BNDES, estive envolvido de forma importante na vida da Embraer. Por isto posso estar errando em alguns detalhes do ocorrido neste período, mas garanto que não no eixo central dos acontecimentos.

Voltando portanto à história que estou narrando, foi com a Embraer estatal que iniciou-se no Brasil a indústria de construção de aviões civis e militares. A crônica deste período precisa ser construída com cuidado pois os vários fracassos e os prejuízos da companhia precisam ser colocados no contexto da construção, a partir do zero, de uma indústria sofisticada e difícil. Mas, no início da década dos 90 do século passado a Embraer, que já tinha aprendido a projetar aviões, tinha produzido alguns modelos com amplo mercado a ser explorado.

E foi neste momento que o segundo passo crucial para se chegar ao sucesso — o primeiro foi a decisão de começar a caminhada pelo ITA — foi tomado. O presidente Itamar Franco decide privatizar a Embraer para que o setor privado assumisse a empresa e desse a ela a dinâmica necessária para explorar seus produtos.

Este segundo passo foi essencial para o sucesso de hoje e mostra nitidamente até onde pode chegar a parceria setor público e setor privado na construção de uma economia eficiente e de mercado, mesmo em países emergentes. Certamente nenhum grupo privado teria dado o primeiro passo na caminhada da indústria aeronáutica no Brasil e, também certamente, não teríamos chegado à venda dos jatos E175 para a American Airlines se o presidente Itamar Franco não tivesse tido a coragem de enfrentar as resistências de setores militares e da esquerda à privatização.

E o mesmo raciocínio deve ser estendido agora ao programa de concessões de rodovias que parece finalmente decolar com os últimos sucessos. Como a Embraer da American Airlines poderemos ter, em futuro próximo, nas regiões produtoras da riqueza agrícola brasileira, estradas com duas pistas e sem buracos, mudando a realidade deste setor tão importante para nós brasileiros.

Luiz Carlos Mendonça de Barros , engenheiro e economista, é diretor-estrategista da Quest Investimentos. Foi presidente do BNDES e ministro das Comunicações. Escreve mensalmente às segundas

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