O Exército Brasileiro e a Independência do Brasil
Sgt Julio Cezar Rodrigues Eloi
No dia 7 de setembro, celebraremos mais um aniversário da emancipação política do nosso país de Portugal. Ao tratar da grandiosidade que a marca temporal carrega, por se tratar do Bicentenário, destaca-se o indelével papel da Força Terrestre na luta pela Independência, assegurada desde 1822, fato histórico que marcou o início da nação (EB, 2021).
Reconhece-se que o Exército Brasileiro tem o seu espírito combativo originado em 19 de abril de 1648, por ocasião da expressiva derrota a que os invasores holandeses foram submetidos, em decorrência da união das três raças no berço da brasilidade, na 1ª Batalha nos Montes Guararapes, no estado de Pernambuco (GONDIM, 2011).
Em termos organizacionais, é interessante pontuar a atuação do discípulo do Conde de Lippe, o Tenente-General germânico Johann Heinrich Böhn, na guerra hispano-portuguesa que ocorreu de 1776 a 1777. O conflito projetou as defesas no extremo sul, salvaguardadas para o futuro território brasileiro, em contraponto ao outrora poderoso Vice-Reino do Rio da Prata (OBERACKER, 1959).
A invasão da metrópole, no período das guerras napoleônicas, obrigou a família real a encontrar refúgio na América do Sul, de modo que, a partir da instalação da nova capital do Império Português no Rio de Janeiro, por elevação do Brasil à categoria de Reino, houve empregos destacados das Forças Armadas luso-brasileiras nas invasões de territórios que compreendem a Guiana Francesa e a República Oriental do Uruguai (DONATO, 1987; e BARROSO, 2019).
Nesse contexto, a pesquisadora PAULA (1962) explica que ocorreu uma nova reorganização do Exército com a criação, por Dom João, do 1º Regimento de Cavalaria em 1808, o atual “Dragões da Independência”, bem como de unidades de corpo de tropa das demais Armas e de estabelecimentos de ensino militares, além do desenvolvimento de arsenais para evitar a dependência de material estrangeiro, que pode ser traduzido na gênese da Base Industrial de Defesa.
Com a derrota de Napoleão Bonaparte no Velho Continente, as cortes lusitanas pressionaram Dom João VI para que retornasse a Portugal e transferisse a sede da monarquia para Lisboa.
Pressões crescentes de além-mar exigiram o regresso imediato do príncipe Pedro de Alcântara, que, convencido pela elite brasileira, decide-se pelo “Fico” em 9 de janeiro de1822 (FAUSTO, 1996; e DE MENDONÇA, 2010).
Das tentativas de rebaixar nossas terras à colônia, surge o movimento pela independência, materializado às margens do riacho Ipiranga, que, com a liderança do herdeiro da dinastia de Bragança e o fundamental apoio das forças terrestres e navais, expulsa as tropas portuguesas do recém-criado Império do Brasil, com episódios dramáticos nas províncias da Cisplatina, Bahia, Piauí, Maranhão e Pará (DONATO, 1987; CALÓGERAS, 2009; VARNHAGEN, 2010; e BARROSO, 2019).
Tal vínculo com a defesa da integridade nacional se confirma na luta do exército imperial pelos interesses nacionais no Brasil e no exterior, destacado ao vencer as diversas revoltas ocorridas no período regencial (Balaiada, Cabanagem, Farrapos, Liberais e Sabinada).
Reforçam-se tais esforços nas vitórias ocorridas nas Questões Platinas no II Reinado, nas campanhas contra Oribe e Rosas (1851-1852), Aguirre (1864), e na Guerra da Tríplice Aliança (1865-70), conforme apontado por DONATO (1987), BARROSO (2019), e BAZUCHI (2016).
O desgaste do Império como entidade política levou à sua substituição pela República, que exigiu a manutenção de uma força de combate apta a defender os interesses da Nação contra diversas contestações internas. Nesse sentido, novos embates, como a Revolução Federalista, a Guerra de Canudos e o conflito do Contestado, foram destroçados com o emprego da Força Terrestre na manutenção dos poderes constituídos (DONATO, 1987).
Na Era Vargas, a luta contra as potências do Eixo, Alemanha, Itália e Japão, trouxe nova doutrina e novos equipamentos para o Exército Brasileiro. Foi criada a Força Expedicionária Brasileira (FEB), que teve importante atuação para o sucesso dos aliados em operações na II Guerra Mundial, de 1942 a 1945. Mesmo sem o treinamento e o preparo das tropas norte-americanas, os famosos “pracinhas” souberam muito bem cumprir a sua missão na luta contra- nazifascismo (MOREIRA BENTO, 1992).
Em consequência do seu reconhecido profissionalismo, desde a época da Liga das Nações, entidade precursora da atual Organização das Nações Unidas (ONU), ANDRADE, FRANCO e SILVA FILHO (2019) esclarecem que o Exército Brasileiro passou a contribuir com diversos contingentes em missões de paz, iniciando com o envio de observadores militares para a localidade colombiana de Letícia em 1936. Em seguida, passou a colaborar com o envio de tropas para Suez (1956), Moçambique (1994), Angola (1995) e Timor-Leste (1999-2006) e, neste século XXI, colaborou de forma mais robusta, com a liderança do contingente multinacional no Haiti, a partir de 2004.
Entende-se, à luz dos eventos narrados, que o Exército possui uma vasta folha de serviços relevantes em prol da Nação brasileira e que, além de sua atividade-fim, também colabora com o desenvolvimento econômico e social por meio de ações subsidiárias, como as obras de engenharia nos mais longínquos rincões da Amazônia (LEÃO, 2019), a distribuição de água e a perfuração de poços no sertão nordestino, o suporte à defesa civil em calamidades (GRENTESKI, 2020), a acolhida aos refugiados (PINHO, 2019) etc.
Assim sendo, neste bicentenário da Independência do Brasil, é salutar rememorar os fatos relevantes da nossa história militar protagonizados pelo Exército Brasileiro, pela Marinha do Brasil e pela Força Aérea Brasileira. Como assinala MENDES (2020), são instituições de grande credibilidade perante a população e responsáveis por salvaguardar os mais de 8 milhões de km2 do território nacional, cerca de 17 mil km de fronteiras e quase 8 mil quilômetros de litoral e riquezas incalculáveis.
Referências
ANDRADE, I. O.; FRANCO, L. G. A.; SILVA FILHO, E. B. (2019). A atuação do Exército Brasileiro em operações de paz das Nações Unidas. In: Desafios contemporâneos para o Exército Brasileiro. Brasília: Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA), p. 155-181.
BARROSO, G. (2019). História Militar do Brasil. Brasília: Senado Federal.
BAZUCHI, J. V. S. (2016). Ensaio crítico sobre a política externa brasileira no período imperial. Especialização em Política e Relações Internacionais. Fundação Escola de Sociologia e Política de São Paulo (FESPSP). São Paulo.
CALÓGERAS, P. (2009). Formação Histórica do Brasil. Brasília: Senado Federal.
DE MENDONÇA, S. R. (2018). A independência do Brasil em perspectiva historiográfica. Revista Pilquen. Sección Ciencias Sociales, 12(1), p. 1–10.
DONATO, H. (1987). Dicionário de Batalhas Brasileiras – dos conflitos com os indígenas, às guerrilhas políticas urbanas e rurais. São Paulo: IBRASA.
EXÉRCITO BRASILEIRO [EB]. (2021). Portaria EME/ C Ex nº 620, de 13 de dezembro de 22021. Aprova a Diretriz para as comemorações do Bicentenário da Independência do Brasil (EB-20-D-01.089).
FAUSTO, B. (1996). História do Brasil. São Paulo: Editora da Universidade de São Paulo (EDUSP).
GONDIM, A. M. C. (2011). A pátria nasceu aqui: o discurso das batalhas dos Guararapes e a educação nas décadas de 1960 e 1970. Dissertação de Mestrado. Programa de Pós-Graduação em Educação da Universidade Federal de Pernambuco (PPGEdu/ UFPE). Recife.
GRENTESKI, A. L. (2020). Ampliação das ações imediatas do Exército Brasileiro em apoio às calamidades com origem em eventos climáticos. Especialização em Política, Estratégia e Alta Administração do Exército. Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME). Rio de Janeiro.
LEÃO, E. M. (2019). A participação das Unidades de Engenharia de Construção na integração da região Amazônica brasileira do período dos governos militares aos dias atuais.
Especialização em Ciências Militares. Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME). Rio de Janeiro.
MENDES, L. O. C. (2020). Bicentenário da Independência do Brasil: a evolução do papel constitucional do Exército Brasileiro ao longo dos duzentos anos da Independência do Brasil.
Especialização em Ciências Militares. Escola de Aperfeiçoamento de Oficiais (EsAO). Rio de Janeiro.
MOREIRA BENTO, C. (1992). As Duas Faces da Glória. A Defesa Nacional, (755), p. 59-62.
OBERACKER Jr., C. H. (1959). João Henrique Böhn: o fundador do Exército Brasileiro. Revista de História da USP, v. 18, nº 38, p. 339-357.
PAULA, E. S. (1962). As origens do Exército Brasileiro. Revista de História da USP, v. 24, n.49, p. 57-72.
PINHO, A. P. (2019). O Exército Brasileiro na Operação Acolhida. Especialização em Política, Estratégia e Alta Administração do Exército. Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME). Rio de Janeiro.
VARNHAGEN, F. A. (2010). História da Independência do Brasil. Brasília: Senado Federal