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Conferência dos Exércitos Americanos: passado, presente e futuro

A Conferência dos Exércitos Americanos (CEA) é uma organização militar de caráter internacional, integrada e dirigida por exércitos do continente americano. Foi criada com a finalidade de se tornar um fórum de debates para o intercâmbio de experiências entre os exércitos do continente. Sua finalidade é a análise e o intercâmbio de ideias e experiências relacionadas com os assuntos de interesse comum no âmbito da defesa para aumentar a colaboração e a integração entre os exércitos e contribuir com a defesa e o desenvolvimento democrático dos países-membros.

A primeira Conferência dos Exércitos Americanos aconteceu entre 8 e 12 de agosto de 1960, no Forte Amador, no Panamá. Naquele momento, não foi estruturado um documento formal de criação, porém foi deixado claro seu objetivo inicial: “A convocação dos Exércitos da América para tratar de temas comuns que ajudem a conseguir uma sinergia entre os exércitos da região, e assim poder enfrentar de maneira combinada e integral possíveis ameaças contra o continente.

Durante os cinco primeiros anos, a conferência seguiu com o mesmo enfoque, e só foram firmados acordos relacionados aos temas abordados em cada uma delas. Durante a sexta Conferência dos Exércitos Americanos, em 1965, com a participação de 18 países do continente, foi assinado um acordo que materializou a base do compromisso dos países integrantes e as normas de funcionamento dessa organização, ficando estabelecida como sua “Ata de Criação”.

Atualmente, a CEA está integrada por 23 exércitos membros: Antígua e Barbuda, Argentina, Barbados, Bolívia, Brasil, Canadá, Chile, Colômbia, Equador, El Salvador, Estados Unidos da América, Guatemala, Guiana, Honduras, Jamaica, México, Nicarágua, Paraguai, Peru, República Dominicana, Trinidade e Tobago, Uruguai e Venezuela.

Também fazem parte dois exércitos observadores, Belize e Suriname; assim como dois observadores especiais, o Exército de Terra da Espanha e o Serviço Nacional de Fronteiras da República do Panamá. Além disso, a CEA conta com duas organizações militares observadoras, a Conferência das Forças Armadas Centro-Americanas (CFAC) e a Junta Interamericana de Defesa (JID).

A Conferência dos Exércitos Americanos se desenvolve em ciclos de dois anos, para os quais se estabelece um tema obrigatório que deverá ser abordado nos diferentes eventos, tais como Comités Ad-Hoc, Conferências Especializadas e Exercícios. Esses eventos, organizados pelos exércitos membros, permitem chegar a conclusões e a recomendações extraídas da participação ativa dos oficiais de ligação e dos delegados de cada um dos exércitos e das organizações. Cabe destacar que os eixos temáticos, que contribuem com o tema obrigatório, são tratados respeitando o marco legal vigente em cada um dos exércitos e das organizações que integram a CEA.

Na metade do segundo ano de cada ciclo, ocorre a reunião preparatória para a Conferência de Comandantes, em que se consolidam as conclusões e recomendações extraídas dos eventos ocorridos para que depois sejam transformadas em acordos que serão apresentados para aprovação durante a Conferência de Comandantes.

A Conferência de Comandantes dos Exércitos Americanos constitui o principal evento do ciclo e se desenvolve ao final desse. Além dos acordos aprovados, realiza-se também a cerimônia de transferência da sede para o exército que terá a responsabilidade de exercer a presidência do ciclo seguinte e de constituir a Secretaria-Executiva Permanente da CEA (SEPCEA).

Os principais temas abordados pela conferência durante os últimos vinte anos tiveram como eixo condutor a interoperabilidade dos exércitos no âmbito das operações de paz militares; as operações de ajuda em caso de desastres; e a liderança e o apoio militar às autoridades civis nos ambientes conjuntos e interagências.

No Ciclo XXXIV 2020-2021, liderado pelo Exército Argentino, pela primeira vez, foi abordada uma temática relacionada à formação e à profissionalização dos sargentos como líderes das diferentes frações e como auxiliares de uma equipe (staff) ou estado-maior nos exércitos do continente americano.

As conclusões obtidas durante os eventos realizados permitiram revalorizar o papel das praças em cada uma das organizações e identificar a necessidade de se reorganizar os programas de educação e capacitação para que melhores ferramentas sejam oferecidas, permitindo que suas capacidades como líderes de frações menores sejam aumentadas e enfrentar as exigências que os conflitos e as crises atuais apresentam da melhor maneira possível.

Com a emergência sanitária desencadeada pela covid-19 e as ações que os exércitos deveriam realizar em apoio aos Estados nacionais para mitigar os efeitos da pandemia, a CEA decidiu incluir, como parte do tema obrigatório, o debate e o intercâmbio das lições aprendidas na luta contra a covid-19 e suas implicações futuras para os exércitos, especialmente no tocante à liderança, às participações em operações de proteção civil e ao treinamento em ambiente de pandemia. As principais conclusões foram as seguintes:

  • A importância de uma adequada ação militar conjunta e interagências, além da necessidade de aumentar as medidas de coordenação e cooperação diante da crise.

  • A condução de operações de proteção civil exige uma dupla capacidade de recursos e organização dos exércitos.

  • A revalorização da Forças Armadas como instrumento do Estado para a resolução de crises sanitárias, principalmente devido à sua capacidade de organização, aos seus meios logísticos e ao seu desdobramento territorial.

Durante mais de 60 anos de história da Conferência dos Exércitos Americanos, muitos exércitos tiveram a honra de ser sede desse renomado fórum internacional, contribuindo com o enriquecimento de seu acervo e com o fortalecimento dos laços de amizade e fraternidade entre os exércitos.

O Exército da República Federativa do Brasil volta a ser sede, pela quarta vez, da Conferência dos Exércitos Americanos, sendo o General de Exército Marco Antônio Freire Gomes, Comandante do Exército, quem exerce a presidência do atual Ciclo XXXV (2022-2023).

O tema obrigatório aprovado para este ciclo é: A contribuição da Conferência dos Exércitos Americanos no processo de transformação e preparação do Exército do Futuro para a ampliação da cooperação e integração no enfrentamento dos desafios e das ameaças que possam afetar a segurança e a estabilidade do continente americano.

No âmbito das atividades previstas para o Ciclo XXXV, entre os dias 18 e 21 de abril de 2022, aconteceu, na cidade de Brasília (DF), a cerimônia de abertura, que contou com a presença de comandantes e representantes de 20 exércitos, além de duas organizações observadoras da CEA. Esse importante evento marcou o início do ciclo liderado pelo Exército Brasileiro, em que foram estabelecidas atividades e objetivos que aprofundarão o intercâmbio e a cooperação entre os exércitos e as organizações da CEA.

No calendário previsto para o presente ciclo, estão detalhados os exércitos que terão a responsabilidade de ser os anfitriões em cada um dos eventos e também os objetivos fixados para cada um deles, o que permitirá desenvolver o tema obrigatório do ciclo.

Como um aspecto relevante, foi criado um comitê de estudos especializados encarregado de analisar aspectos que contribuam para o desenvolvimento do tema obrigatório do ciclo XXXV: Interoperabilidade, Ensino e Preparo, Inteligência, Ciência e Tecnologia. Esses comitês de estudos especializados são liderados por oficiais dos exércitos do Chile, da Colômbia, da Guatemala e do Brasil, sob a direção do Vice-Secretário Executivo Permanente da CEA.

Entre as atividades programadas está a Operação PARANA III, que terá duas etapas: uma de planejamento durante o ano de 2022 e outra de execução no terreno durante o ano de 2023. Esse exercício tem, dentre seus objetivos, preparar uma operação de socorro em caso de desastre natural, dirigida e coordenada por um sistema nacional de emergência, buscando alcançar a interoperabilidade das Forças Militares e a integração com organizações civis de emergência.

Atenta às preocupações comuns dos exércitos membros, a CEA planejou uma conferência especializada sobre defesa cibernética, que acontecerá no mês de novembro deste ano em Buenos Aires, na República Argentina. Essa conferência tem como objetivo aumentar a interação e o intercâmbio de experiências entre os membros da CEA com relação à defesa cibernética e também avaliar as dimensões da defesa no espaço cibernético.

Com esse programa de atividades, previsto para o ciclo XXXV, a CEA demonstra sua importância como fórum de debates, intercâmbio de experiências e lições aprendidas, permitindo aos exércitos e às organizações membros ter informações valiosas para enfrentar as exigências do presente e projetar seu olhar em direção aos desafios do futuro.

O Exército dos Estados Unidos do México terão a responsabilidade de levar adiante o próximo ciclo XXXVI (2024-2025) da CEA. O tema obrigatório e o cronograma de eventos serão aprovados na Conferência de Comandantes que acontecerá no Brasil entre os dias 6 e 10 de novembro de 2023.

As situações que se projetam em um mundo cada vez mais em transformação e interconectado exigem uma maior interação entre todos os organismos e fóruns multilaterais, fortalecendo a confiança e contribuindo para o incremento de capacidades para fazer frente às demandas atuais.

Nesse sentido, a Conferência dos Exércitos Americanos tem muito pontos em comum para continuar compartilhando produtos e lições aprendidas. Sem dúvida, temas como a administração das ações em situações de desastres naturais e ajuda humanitária, a integração de gênero e a defesa cibernética são de interesse comum e podem ser contribuições valiosas entre os exércitos e as organizações.

A crise desencadeada pela pandemia em todo o mundo demostrou claramente a legitimidade e a importância dos foros multilaterais, não só como um meio de intercâmbio de informação, mas também, e principalmente, como um meio de análise dos problemas enfrentados no continente, além de ser uma forma de desenvolver métodos para se obter uma resposta eficaz e coordenada entre os países da região.

Conclusões

A CEA é o fórum multilateral mais importante para os exércitos do continente e um excelente ambiente para a discussão de temas de interesse comum.

A CEA é um fórum militar em que são tratados, exclusivamente, assuntos relacionados com a defesa e onde se dá autonomia a cada exército sede para que exerça sua liderança com total liberdade de ação.

O espírito democrático da CEA deve continuar refletindo-se na escolha do tema obrigatório que será tratado em cada ciclo, procurando evitar abordar aqueles que são exclusivos da política de defesa, como também aqueles vinculados a outras agências do Estado como as forças de segurança.

A Conferência de Comandantes dos Exércitos Americanos é o evento em que o conhecimento pessoal e a troca de pontos de vista sobre temas que preocupam os exércitos do continente são compartilhados entre os comandantes. Um fato concreto foram as lições aprendidas e as ações realizadas para mitigar os efeitos da pandemia de covid-19 trocadas entre os exércitos.

A rede de comunicações fluida mantida pela CEA constitui uma ferramenta essencial para responder oportunamente a qualquer solicitação dos exércitos membros e aprofundar a interoperabilidade através do emprego dos meios com que contam cada um dos exércitos. Em decorrência, é realizado o exercício de comunicações eletrônica a cada ano.

O fator de sucesso para lidar com situações de crise está em estabelecer ferramentas de comunicação e medidas de coordenação antes que elas aconteçam. Nesse sentido, a CEA contribui significativamente com o fortalecimento das medidas de confiança mútua e de cooperação militar tanto bilateral como multilateral.

Bibliografia:

  • Acervo histórico da CEA.

  • Página Web da CEA (https://www.redcea.com/SitePages/Home.aspx).

O autor é Tenente-Coronel de Cavalaria do Exército Argentino, da turma de 1997, licenciado em Administração, oficial de Estado-Maior do Exército Argentino e do Exército da República Popular da China e Mestre em Ciências Militares. Possui as seguintes habilitações: Paraquedista Militar e Especialização Especial de Blindados. Como oficial subalterno, serviu no Regimento de Cavalaria de Tanques 1, no Esquadrão de Exploração de Cavalaria Paraquedista 4, no Regimento de Cavalaria Leve 13, no Regimento de Cavalaria de Tanques 12 e também fez parte do Batalhão Conjunto Argentino 1 na República do Haiti. Como oficial chefe serviu na Escola Superior de Guerra (aluno), na Escola Superior de Guerra Conjunta (aluno), na Escola de Comando e Estado-Maior do Exército da República Popular da China (aluno), na Direção-Geral de Material, no Regimento de Cavalaria de Tanques 1 como 2º Chefe de Regimento e na Conferência dos Exércitos Americanos como Oficial de Operações. Atualmente, é Adjunto na Seção de Operações da Secretaria-Executiva Permanente da Conferência dos Exército Americanos (SEPCEA). Contato: mariano_kreiman@hotmail.com

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