Luis Kawaguti
Dois meses após seu início, a intervenção federal na segurança pública do Rio sai da fase de planejamento e entra na etapa de ação, afirmou ao UOL o coronel Roberto Itamar, porta-voz do Gabinete de Intervenção Federal. Segundo ele, o início dessa fase será marcado pela chegada da verba federal, estimada em R$ 1,2 bilhão, e pelo treinamento e reorganização do efetivo da Polícia Militar.
"Toda a parte de diagnóstico está sendo praticamente concluída, e agora se inicia uma nova fase, que são as ações", afirmou Itamar. Quando a intervenção federal foi decretada pelo presidente Michel Temer em 16 de fevereiro, não havia um projeto traçado previamente, segundo fontes ouvidas pelo UOL.
Desde então, a equipe do interventor Walter Braga Neto se dividiu em grupos de trabalho para diagnosticar os problemas da segurança no estado, traçar planos e colocar pessoas de confiança em cargos estratégicos.
O UOL levantou no Diário Oficial do Rio de Janeiro que, além da nomeação do secretário de Segurança Pública e dos chefes das polícias civil e militar, mais de 40 funcionários em cargos de diretoria, corregedoria ou em funções estratégicas nas Secretarias da Segurança Pública e da Administração Penitenciária foram substituídos.
As mudanças ocorreram por meio de atos do interventor publicados entre os dias 27 de fevereiro e 9 de abril. Nos últimos 60 dias, os interventores visitaram batalhões da PM, delegacias de Polícia Civil e unidades prisionais para tentar identificar problemas.
Segundo Itamar, eles elaboraram planos administrativos para aumentar e treinar o efetivo da Polícia Militar, adquirir mais veículos e armamentos, melhorar as ações de inteligência e fazer mudanças na administração financeira dos órgãos de segurança.
De acordo com o porta-voz, a fase de implementação desses planos chegou. O treinamento dos policiais militares foi iniciado na semana passada, com a capacitação de agentes do 14º Batalhão da PM (Bangu) – que receberam aulas de instrutores do Exército sobre como agir em confrontos.
A ideia é que todos os batalhões do Rio passem pelo processo até o fim do ano. Policiais treinados para policiamento comunitário que atuam em ao menos metade das 38 Unidades de Polícia Pacificadora devem começar a receber treinamento complementar e ser transferidos para os batalhões de área.
Os primeiros devem ir da UPP da Vila Kennedy, que será dissolvida, para o 14º Batalhão. Em paralelo, a Secretaria da Segurança está negociando a devolução de cerca de 700 PMs emprestados para órgãos como Assembleia Legislativa, Tribunal de Justiça e prefeituras.
Itamar disse ainda que nesta semana, após a solução dos últimos procedimentos burocráticos, deve começar a execução financeira da verba federal. O governo Temer prometeu destinar R$ 1,2 bilhão para a segurança do Rio. "O dinheiro está disponível, só precisamos nomear agentes públicos que vão fazer execução financeira desses recursos", disse.
Com a verba, os interventores devem fazer investimentos e convocar cerca de 1.000 policiais que já passaram em concurso público. Também aumentarão em 10% o número de policiais no patrulhamento diário de ruas por meio do pagamento de RAS (Regime Adicional de Serviço, que remunera policiais que trabalham nos horários de folga).
O Secretário da Segurança, Richard Nunes, havia dito ao UOL na semana passada que isso representará cerca de 1.000 policiais a mais por dia nas ruas. Os interventores também querem fazer um pente fino nas licenças de saúde para trazer à ativa policiais que possam exercer funções administrativas.
O objetivo final, segundo Itamar, é aumentar o efetivo da PM no patrulhamento das ruas e assim diminuir a ocorrência de crimes e aumentar a sensação de segurança. Ações emergenciais As ações descritas acima são classificadas pelos interventores como "estruturantes", ou seja, seriam uma tentativa de mudar o funcionamento dos órgãos de segurança pública.
Segundo Itamar, os resultados delas não serão visíveis rapidamente. Mas, em paralelo, estão sendo tomadas ações descritas como emergenciais, que objetivam ter resultados mais imediatos e aparentes.
As principais delas são as operações das polícias e das Forças Armadas em favelas (já ocorreram operações em cerca de dez delas) e o reforço do patrulhamento de rua por militares do Exército e da Marinha, este último iniciado na última semana de março.
Há ainda um esforço para reduzir o número de roubos de veículos que, segundo o secretário da Segurança Richard Nunes, levam a outros crimes, especialmente latrocínios (roubos seguidos de morte). Porém, segundo um levantamento da organização Fogo Cruzado, que pesquisa ocorrências de violência em fontes abertas, como redes sociais e reportagens de imprensa, a violência não diminuiu.
O número total de tiroteios ou disparos de armas de fogo nos últimos 60 dias na região metropolitana do Rio chegou a 1.502. Os locais mais violentos foram a Praça Seca (67 casos), o Complexo do Alemão (44), a Vila Kennedy (43), a Cidade de Deus (36) e a Rocinha (35).
O número representa uma elevação de 15% em relação aos 1299 casos registrados nos 60 dias anteriores ao decreto de intervenção de 16 de fevereiro. Os dados oficiais da violência do Instituto de Segurança Pública abrangendo os dois primeiros meses da intervenção ainda não foram publicados.
"As consequências das ações emergenciais são mais imediatas e os resultados das ações estruturantes aparecem mais a médio e longo prazo", disse o coronel Itamar. "Até o final da intervenção muitas coisas serão resolvidas e outras serão deixadas como legado. Os resultados [do legado] vão ser observados mais adiante", disse o porta-voz.