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A Doutrina Militar Terrestre no combate ao coronavírus

Cel Flávio Roberto Bezerra Morgado

A Constituição Federal de 1988 e a Lei Complementar n° 97, de 9 de junho de 1999, estabelecem que é da responsabilidade do Presidente da República o emprego das Força Armadas na defesa da Pátria e na garantia dos poderes constitucionais, da lei e da ordem, e na participação em operações de paz.

O Exército Brasileiro estabelece que a Doutrina Militar Terrestre deve ser permanentemente atualizada em função da evolução da natureza dos conflitos, resultado das mudanças da sociedade e da evolução tecnológica.

As mudanças experimentadas pelas sociedades, com reflexos na forma de fazer política e o surgimento de nova configuração geopolítica, conduzem a horizontes mais incertos e complexos para planejar a Defesa da Pátria1.

T. Owen Jacobs, no livro Strategic Leadership: The Competitive Edge, criou o acrônimo VUCA (Volatility/volatilidade, Uncertainty/incerteza, Complexity/complexidade, Ambiguity/ambiguidade), a fim de caracterizar o ambiente na Era da Informação.

Novos tipos de ameaças ganharam importância, exigindo que os Estados estejam aptos para contrapô-las, neste ambiente VUCA, exigindo visões prospectivas cada vez mais apuradas a fim de evitar danos à sociedade.

A pandemia COVID-19, doença causada pelo novo coronavírus, configura-se em uma nova ameaça ao País. Como o Exército Brasileiro, utilizando o que está previsto na Doutrina Militar Terrestre Brasileira, está preparado para enfrentar esta nova ameaça?

O Conceito Operativo do Exército é aquele que interpreta a forma de atuação dos elementos da Força Terrestre para obter e manter resultados decisivos nas operações no amplo espectro dos conflitos, mediante a combinação de operações ofensivas, defensivas ou de cooperação e coordenação com agências, de forma simultânea ou sucessiva, prevenindo ameaças, gerenciando crises e solucionando conflitos armados, em situações de guerra e de não guerra.

A Doutrina Militar Terrestre estabelece que os elementos da Força Terrestre executem as operações básicas (ofensivas, defensivas e de cooperação e coordenação com agências) para cumprirem as missões recebidas dos escalões superiores.

No contexto de enfretamento da Pandemia Covid-19, as Organizações Militares do Exército estão realizando uma Operação de Cooperação e Coordenação com Agências. Este tipo de operação é executado em apoio aos órgãos ou instituições (governamentais ou não, militares ou civis, públicos ou privados, nacionais ou internacionais), definidos genericamente como agências. Destinam-se a conciliar interesses e coordenar esforços para a consecução de objetivos ou propósitos convergentes que atendam ao bem comum. Buscam evitar a duplicidade de ações, a dispersão de recursos e a divergência de soluções, levando os envolvidos a atuarem com eficiência, eficácia, efetividade e menores custos2.

 Figura 1 – Exemplos de agências

Dentre as circunstâncias abrangidas pela Operação de Cooperação e Coordenação com Agências destacam-se a Garantia da Lei e da Ordem e as Atribuições Subsidiárias. A Garantia da Lei e da Ordem tem por objetivo a preservação da ordem pública e da incolumidade das pessoas e do patrimônio. As Atribuições Subsidiárias são cooperações com o desenvolvimento nacional e com a defesa civil, na forma determinada pelo Presidente da República, e também podem cooperar com os órgãos públicos federais, estaduais e municipais e, excepcionalmente, com empresas privadas, na execução de obras e serviços de engenharia. Destinam-se, ainda, à cooperação com os órgãos federais, quando se fizer necessário, na repressão aos delitos de repercussão nacional e internacional, no território nacional, na forma de apoio logístico, de inteligência, de comunicações e de instrução.

Além disso, no contexto das operações terrestres, observa-se um rol de ações comuns às operações, podendo ser realizadas por tropas de qualquer natureza desde que estas tenham as capacidades necessárias. Com relação ao combate à Pandemia Covid-19, destacam-se a Cooperação Civil-Militar e a Defesa Química, Biológica, Radiológica e Nuclear.

A Cooperação Civil-Militar caracteriza-se por atividades que buscam estabelecer, manter, influenciar ou explorar as relações entre as forças militares, as agências, as autoridades e a população, em uma determinada região. As atividades abrangem reparações e reconstrução de infraestruturas, incremento das condições da saúde pública e apoio à administração civil.

A Defesa Química, Biológica, Radiológica e Nuclear compreende as ações relacionadas ao reconhecimento, à detecção e à identificação de agentes químicos, biológicos, radiológicos e nucleares, bem como à descontaminação de pessoal e de material expostos a tais agentes.

Figura 2 – Slogan do Exército Brasileiro

O Exército Brasileiro é uma instituição nacional permanente e regular, organizada com base na hierarquia e na disciplina, sob a autoridade suprema do Presidente da República, e sua missão é de contribuir para a garantia da soberania nacional, dos poderes constitucionais, da lei e da ordem, salvaguardando os interesses nacionais, e cooperando com o desenvolvimento nacional e o bem-estar social3.

A existência de uma doutrina que permite à Força Terrestre empregar suas Organizações Militares em uma situação inédita, enfrentando uma ameaça complexa, como no caso da Pandemia Covid-19, demonstra o elevado grau de profissionalismo, a visão prospectiva e o nível de prontidão existentes no Exército Brasileiro, sempre orientado por seus valores e suas tradições, alicerçados na hierarquia e na disciplina.

 Artigo publicado no site do Observatório Militar da Praia Vermelha, ECEME, em 13 de maio de 2020.

1 Manual EB20-MF-10.102 Doutrina Militar Terrestre.

2 Manual EB70-MC-10.223 Operações.

3 Manual EB20-MF-10.101 Exército Brasileiro.

Referências:

 

BRASIL, Exército Brasileiro. Manual de Campanha EB20-MF-10.102 Doutrina Militar Terrestre, 2ª Ed. 2019. Disponível em: http://bdex.eb.mil.br/jspui/bitstream/123456789/4760/1/EB20-MF-10.102.pdf Acesso em 13 Mai de 2020.

BRASIL, Exército Brasileiro. Manual de Campanha Manual EB70-MC-10.223 Operações, 5ª Ed. 2017. Disponível em: http://bdex.eb.mil.br/jspui/bitstream/1/848/3/EB70-MC-10.223- Operações Acesso em 13 Mai de 2020.

BRASIL, Exército Brasileiro Manual de Campanha Manual EB20-MF-10.101 Exército Brasileiro, 1ª Ed. 2014. Disponível em: https://www.eb.mil.br/documents/10138/6563889/Manual+-+O+Exército+Brasileiro/09a8b0d2-81d0-4a69-a6ea-0af9a53eaf45 Acesso em 13 Mai de 2020.

 

Sobre o Autor:

Flávio Roberto Bezerra Morgado é Coronel de Cavalaria exercendo atualmente a função de Chefe da Divisão de Doutrina da Escola de Comando e Estado-Maior do Exército. Foi Assessor do Secretário de Estado de Segurança durante a Intervenção Federal no Estado do Rio de Janeiro e Instrutor do Centro de Instrução de Blindados.

 

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