Major João Paulo Diniz Guerra
Pasquale de Chirico (1873-1943), artista italiano radicado na Bahia, é o autor das duas estátuas de bronze que guarnecem a entrada da centenária Escola de Comando e Estado-Maior do Exército (ECEME/www.eceme.eb.mil.br) – Escola da Praia Vermelha –,criada em 2 de outubro de 1905. As estátuas, também conhecidas como guardiões do saber, foram um presente do governo francês ao Brasil no final do século XIX em reconhecimento à proclamação da República. Um dos soldados usa quepe de infantaria e o outro de engenharia, em uma perfeita união da tática com a ciência em defesa da pátria.
A homenagem não poderia ter sido mais preditiva, pois em 1919 o governo brasileiro viria a estreitar seus laços de amizade com a França ao contratar a Missão Militar Francesa (MMF) para orientar, a partir de 1920, a modernização do Exército e permanecendo entre nós até 1940.
Na ECEME, naquela época chamada de Escola de Estado-Maior, a MMF contribuiu para a profissionalização do Oficial de Estado-Maior, adotando um método de raciocínio capaz de desenvolver o espírito criador, estimulando a busca de soluções para situações inéditas com temas práticos e impulsionando o pensamento doutrinário da Escola.
A missão da ECEME é forjar líderes do Exército, formar o Oficial de Estado-Maior e o assessor de alto nível, produzindo conhecimento e pensando o Exército do futuro, além de contribuir para a construção de uma mentalidade de defesa na sociedade.
Para cumprir sua missão, o estabelecimento de mais alto nível do sistema de educação e cultura do Exército, baseia-se nos pilares Ensino-Pesquisa-Doutrina para formar tanto oficiais da linha bélica (nacionais e estrangeiros) quanto médicos e engenheiros militares que realizam cursos de altos estudos e de política e estratégia.
Até 1970, a ECEME esteve diretamente subordinada ao Estado-Maior do Exército, tendo sido um verdadeiro laboratório doutrinário e protagonista do pensamento crítico e inovador, tornando-se a escola que pensa no Exército do futuro. Desde então, passou à subordinação do sistema de educação do Exército, mas continuou desenvolvendo uma doutrina militar autóctone.
Recentemente, com o reconhecimento pela CAPES dos programas de pós-graduação “strictu sensu” (mestrado e doutorado), a ECEME passou a contar também com alunos civis no Instituto Meira Mattos (IMM), voltado à construção de uma ponte entre Escola com o meio acadêmico e com centros de estudos estratégicos dentro e fora do País.
Dessa maneira, a Escola segue na vanguarda para alcançar o objetivo de ampliar a integração do Exército com a sociedade, por meio do fomento à pesquisa científica, com ênfase na conscientização dos civis acerca da relevância da temática da Segurança & Defesa, uma vez que a defesa da pátria é uma das missões constitucionais das Forças Armadas e pilar basilar para o desenvolvimento nacional, constituindo dever de todo cidadão contribuir para tal.
O ensino na ECEME tem como foco o ineditismo e o caráter analítico, a partir das percepções do oficial de estado-maior no sentido de que ele aprenda o que já há de concreto, mas, principalmente, anteveja a guerra do futuro e pense nas novas capacidades que o mundo exigirá do Exército.
Com a metodologia do processo de planejamento aprendido na ECEME (Escola do Método) e contando com o apoio do seu corpo docente e discente, inúmeros problemas já enfrentados pelo Exército e pelo Brasil tiveram soluções práticas e eficientes desenvolvidas nos bancos escolares da ECEME.
Por exemplo, foi possível estabelecer as estratégias para reestruturar o Brasil durante os governos militares (1964 a 1985), fazendo-o saltar da 48ª para a 8ª economia mundial; foi operacionalizado o escopo do Projeto Rondon, na década de 60, com a finalidade de levar a juventude universitária a conhecer a realidade brasileira; e foram pensados e desenvolvidos o Sistema de Planejamento do Exército (SIPLEx), o processo de modernização do ensino no Exército e o Programa de Transformação do Exército.
Da mesma forma, o corpo docente da Escola contribuiu de maneira significativa para o planejamento da missão do Gabinete de Intervenção Federal, que atuou no Rio de Janeiro no ano de 2018, ao se deparar com um problema inédito e de difícil solução. Além disso, a Escola continua, até os dias atuais, subsidiando a evolução doutrinária do Exército por meio de seus projetos interdisciplinares e estudos sobre temas de interesse da Força.
Em 2005, por ocasião das comemorações do seu centenário, a ECEME recebeu a denominação histórica de Escola Marechal Castello Branco. Uma homenagem ao antigo comandante e grande incentivador da transformação da Escola em um centro de evolução doutrinária do Exército, cujos ensinamentos se multiplicaram e se perpetuaram até os dias atuais.
Em seu busto na entrada da Escola está uma de suas célebres frases: “ao chefe não cabe ter medo das ideias, nem mesmo das ideias novas. É preciso, isto sim, não perder tempo, empreendê-las e realizá-las até o fim”.
Com a finalidade de contribuir para o incremento e a difusão da mentalidade de Defesa na sociedade, foi criado o Observatório Militar da Praia Vermelha (http://ompv.eceme.eb.mil.br) em 2017, estrutura que constitui um instrumento de integração de conhecimentos destinado ao acompanhamento geopolítico da conjuntura.
O Observatório, definido por áreas temáticas a partir da capacidade de análise político-estratégica, também proporciona a aproximação de instituições congêneres nacionais e internacionais e de colaboradores externos, civis e militares. Assim, a Escola que pensa o Exército aprimora-se constantemente na maneira de pensar o Brasil e o sistema internacional.
O Marechal Castello Branco mostrou que a ECEME carrega em sua história o culto à tradição que foi muito bem distinguida da rotina em suas palavras: “A rotina é a tradição corrompida, deturpada e morta, ao passo que a tradição é a conservação do passado vivo.
É a luta contra a morte do passado. É a entrega, a uma geração, dos frutos da geração passada. Separar o que merece durar. Deixar sair o que merece perecer”. Assim, podemos deduzir que o próprio patrono da Escola incumbiu a eterna missão aos guardiões do saber: “separar o que merece durar e deixar sair o que merece perecer” na Escola que pensa o Exército e a defesa da Pátria.
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Sobre o autor: O autor é oficial da arma de Infantaria e foi formado pela Academia Militar das Agulhas Negras no ano de 2002. Foi instrutor do Curso de Infantaria da EsAO e do CPOR/PA. Como oficial superior foi comandante da Companhia de Comando da 10ª Região Militar, Fortaleza. Atualmente, é aluno do Curso de Comando e Estado-Maior na ECEME.