Sérgio de Oliveira Netto
Procurador Federal. Mestre em Direito Internacional (Master of Law), com concentração na área de Direitos Humanos, pela American University – Washington College of Law. Especialista em Direito Civil e Processo Civil. Professor do Curso de Direito da Universidade da Região de Joinville – UNIVILLE (SC).
A recente decisão proferida pelo Supremo Tribunal Federal (STF) no dia 07/11/2019, que concluiu o julgamento das Ações Declaratórias de Constitucionalidade (ADC) 43, 44 e 54, que foram julgadas procedentes (maioria apertada 6×5), considerando que o início de cumprimento das penas somente pode ocorrer após o denominado trânsito em julgado (momento processual em relação ao qual não cabe mais nenhuma discussão sobre a condenação), é apenas o “primeiro ato” da implosão do sistema jurídico, que está por se consolidar (1° ATO).
Ainda dois outros “atos” estão para entrar em cena de forma definitiva. E, quando isto acontecer, o sistema jurídico nacional sofrerá abalo de escala astronômica. Aumentando o grau de falta de credibilidade nas instituições forenses. Abaixo resumidamente descritos.
2° ATO: STF decidiu que delatados têm direito a apresentar alegações finais depois de delatores (02 de outubro de 2019). Tema que envolve a discussão sobre a concessão de prazos diferenciados para a apresentação de alegações finais em processos criminais, decidido quando da análise do HC 166.373. Por mais que o STF tenha firmando este entendimento, e anulando a condenação no caso específico em que esta tese foi analisada, ainda está por ser definido se os efeitos deste julgado terão (ou não) efeitos retroativos. Vale dizer, ser este precedente também será aplicado a todos os outros processos, nos quais já tenham sido proferidas condenações, e em relação aos quais não tenham sido concedidos prazos diferenciados para as alegações finais. O que poderá derrubar (em um efeito dominó), por exemplo, condenações proferidas no âmbito da Operação Lava Jato. Causando imenso retrocesso na tramitação processual.
3° ATO: COMPETÊNCIA DA JUSTIÇA ELEITORAL para julgar crimes comuns que tenham, de alguma forma, conexão com crimes eleitorais. Este precedente firmado pelo STF em 14 de março de 2019 no âmbito do Inquérito (INQ) 4435, não vem despertando muita atenção. Porém, seus efeitos podem ser avassaladores no momento atual, muito maiores que os outros “dois atos” acima descritos. Porque podem gerar a ANULAÇÃO de todos os processos que se encaixem neste contexto, e não apenas da sentença proferida, e que estavam tramitando perante a Justiça Federal, como é o caso da Lava Jato.
Ou seja, se pela decisão do STF de somente permitir o início do cumprimento da pena a partir da chamada Segunda Instância alguns condenados (contra os quais ainda não exista decisão transitada em julgado) estão sendo colocados em liberdade (1° ATO), e se pela decisão do STF de estabelecer prazos diferenciados para a apresentação de alegações finais pode acarretar na anulação de sentenças condenatórias, determinando a reabertura de prazo para as alegações finais e posterior nova sentença (2° ATO), pelo reconhecimento da incompetência da Justiça Federal para processar crimes conexos aos crimes eleitorais, por exemplo, como o de lavagem de dinheiro (Lei n° 9.613/98) todo o processo instaurado está sob o risco de ser anulado. Desde o início da primeira decisão judicial de recebimento da acusação (3° ATO).
Posto que, como é previsto no Código de Processo Penal (arts. 564, I, e 567), a matéria relacionada a competência é tratada como sendo de ordem pública, de efeitos imediatos e não sujeitas a preclusão, podendo ser alegada (e reconhecida) a qualquer tempo e grau de jurisdição.
E os prazos de prescrição (prazos legais estabelecidos para que o Poder Público promova os atos necessários para o processo e julgamento e execução das penas) estão fluindo, não sendo paralisados por estes efeitos processuais acima descritos.
Com a agravante de que, muitos dos agentes que estão sendo processados nos recentes escândalos nacionais (como é o caso da LAVA JATO), contam com idade avançada. E, pela lei, se tiverem mais de 70 anos de idade na data da sentença o prazo de prescrição será contado pela METADE, como estabelecido pelo Código Penal, art. 155: São reduzidos de metade os prazos de prescrição quando o criminoso era…na data da sentença, maior de 70 (setenta) anos.
Sendo que existem precedentes do STF em sentido contrário, aceitando a redução deste prazo de prescrição até o momento em que o título condenatório se tornou imutável (e não somente até a sentença, esta considerada como sendo proferida pela 1° Instância). Quer dizer, da data da última decisão a ser proferida pela última instância julgadora (por exemplo, o STF), independentemente do tempo que leve esta tramitação recursal (HC 89969-RJ, 1ª T., 26/06/07, Informativo 473, Relator Min. Marco Aurélio).
Noutros dizeres, pelo menos em relação a vários destes acusados com idades avançadas, somados todos os obstáculos acima referidos, pode acontecer que, no momento do trânsito em julgado, ser reconhecida a ocorrência da prescrição com prazo contado pela metade, inviabilizando o cumprimento de qualquer pena que eventualmente tenha sido aplicada.
A conjugação desta TRÍADE decisória, será como a “tempestade perfeita” no mundo jurídico, enterrando de vez as expectativas daqueles que genuinamente anseiam por justiça.
O cenário é bastante grave, além de gerador de impunidade e, se confirmado, reforçará o sentimento de descrença nas instituições julgadoras.
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