Dan Strumpf e
Nicole Friedman, de Cingapura
The Wall Street Journal
Colaborou Benoit Faucon
A queda histórica registrada nos preços do petróleo provocou um grande aumento dos estoques do combustível. A maior parte dele se acumula nos Estados Unidos e outros países industrializados, que se comprometem a divulgar regularmente os volumes estocados. Mas milhões de barris também estão fluindo para locais fora do radar dos profissionais que monitoram o setor.
Alguns países, como a Rússia e a China, preferem não divulgar seus níveis de estoque. E negociadores e empresas de petróleo também não têm obrigação de revelar o volume que guardam em navios petroleiros.
A decisão de manter esses dados em sigilo torna o mercado de petróleo mais volátil e difícil de decifrar. Quanto petróleo está armazenado nesses lugares, e com que rapidez ele pode ser comercializado, são fatores que podem afetar os preços da commodity.
“Os dados em si mesmos são inconsistentes”, diz Harish Sundaresh, gestor de portfólio e estrategista de commodities da Loomis, Sayles & Co., que administra US$ 240 bilhões. “Em países como Nigéria, Brasil e Angola, eles não são confiáveis.”
Acompanhar os estoques de petróleo vem se tornando uma tarefa mais complicada à medida que países em desenvolvimento armazenam e consomem cada vez mais o combustível.
Cingapura, que tem um dos portos mais movimentados do mundo e é sede asiática de muitas das grandes empresas que negociam petróleo, está entre os enigmas que desafiam analistas. As águas ao redor desse país-ilha se tornaram um dos maiores pontos de armazenamento de petróleo do mundo, mas não está claro quanto combustível está guardado nos petroleiros ancorados lá.
No início de julho, 23 superpetro capazes de armazenar um total de 43 milhões de barris de petróleo, ficaram ancorados por um mês ou mais nos estreitos de Cingapura, segundo o serviço de monitoramento de navios da Thomson Reuters. No início do ano, eram só 15 navios. Se eles estivessem cheios, o volume seria suficiente para atender a demanda dos EUA por mais de dois dias.
Mas não existe nenhum cálculo oficial desse petróleo. A Thomson Reuters e outros oferecem apenas estimativas baseadas na linha de flutuação dessas embarcações. Além disso, alguns navios provavelmente estão carregados com óleo combustível, um produto refinado usado em embarcações, dizem analistas. Outros podem ainda estar carregando água do mar, o que complica ainda mais as estimativas.
“Há muitos dados diferentes sendo mencionados em termos do número de navios que estão atualmente sendo usados para estocagem” e do volume de petróleo que eles contêm, diz Tom Bonehill, diretor-gerente da Norstar Shipping, uma firma que possui petroleiros.
Os estoques também estão assumindo um papel mais importante agora que a Organização dos Países Exportadores de Petróleo renunciou à sua tradicional missão de controlar os preços, dizem analistas. Desde novembro de 2014, a Opep elevou sua produção até quase sua capacidade total. A iniciativa reduziu a capacidade ociosa do grupo, tornando os estoques ainda mais vitais caso haja um recuo na oferta de outras regiões.
A Opep parou de ser um “swing supplier”, diz Antoine Halff, diretor do programa de mercado de petróleo do Centro de Políticas de Energia Global da Universidade Columbia, nos EUA, referindo-se aos fornecedores capazes de equilibrar o mercado e influenciar os preços ao elevar ou reduzir a produção. Como não há uma certeza de que a produção de petróleo em formações de xisto nos EUA consiga cobrir eventuais interrupções no fornecimento, os estoques é que terão que fazer isso, diz ele.
A incerteza sobre os estoques mundiais de petróleo ficou clara com os ataques a unidades petrolíferas na Nigéria, em maio e junho. Depois dos ataques, alguns analistas previram que a produção nigeriana iria cair, o que ajudou a elevar os preços para acima de US$ 50 por barril. Mas dados de embarque mostraram que as exportações nigerianas se mantiveram estáveis e acima de 1,5 milhão de barris por dia, segundo a firma de dados marítimos Windward.
De onde vieram essas exportações? “É uma boa pergunta”, diz Omry Hochberg, gerente de produtos financeiros da Windward. “Eles estão usando estoques ou sua produção é maior do que as pessoas pensam?”
A Nigéria acabou tornando públicos os seus dados de estoque de julho, mas só semanas após os ataques. A Nigerian National Petroleum Corp., petrolífera estatal do país, não respondeu a pedidos de comentário.
A Iniciativa Conjunta de Dados de Organizações (Jodi, na sigla em inglês) coleta dados globais de estoques de petróleo, mas não possui números sobre a Rússia, China e outros países. Alguns países não têm recursos para coletar esses dados ou não os veem como uma prioridade, dizem especialistas.
Os países que não fazem parte da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Econômico (OCDE), organização intergovernamental que reúne 35 países com economia de mercado, estão consumindo mais petróleo. Eles agora são responsáveis por 50% da demanda global, ante 41% há dez anos.
“Mas isso não foi acompanhado por um aumento equivalente na divulgação de estoques”, diz David Fyfe, diretor de pesquisa e análise de mercado da trading Gunvor Group. “Isso deixa o mercado mais opaco”, acrescenta.
Além disso, os países não divulgam os “estoques flutuantes”, ou o volume guardado nos petroleiros ancorados em seus litorais, como em Cingapura. A Agência Internacional de Petróleo informa que os estoques flutuantes cresceram para 95 milhões de barris em junho, o nível mais elevado desde 2009.