Marta Watanabe
Historicamente deficitários na balança comercial, os segmentos que dependem mais da importação de tecnologia desenvolvida no exterior passaram a contribuir menos para a deterioração do saldo total de exportações e importações da indústria brasileira de transformação. Com saldo negativo de US$ 29,98 bilhões em 2011, os setores de alta tecnologia registraram alta de 14,6% no déficit comercial, na comparação com o ano anterior.
Quem mais contribuiu para o saldo negativo foi o segmento de média-alta tecnologia, cujo déficit cresceu 33,4% no mesmo período, atingindo US$ 52,36 bilhões em 2011. O déficit total da indústria de transformação em 2011 foi de US$ 48,74 bilhões.
Os cálculos da balança industrial de acordo com a intensidade tecnológica são do Instituto de Estudos para o Desenvolvimento Industrial (Iedi). Para Julio Gomes de Almeida, economista do Iedi, os dados revelam que a origem do crescimento do déficit comercial da indústria não está mais concentrada na produção de alta tecnologia, na qual se destacam os segmentos de aeronáutica, informática, TV, comunicação e os farmacêuticos.
A maior deterioração da balança da indústria em 2011 foi provocada principalmente por setores de média-alta tecnologia – automóveis, produtos químicos, bens de capital mecânicos e elétricos -, além de segmentos tradicionais de baixa tecnologia, como têxtil, vestuário e calçados. "O jogo é o mesmo, mas mudou a escalação", resume Almeida.
O déficit comercial mantém a tendência de aumento, mas está sendo alimentado por setores com menor dependência tecnológica, explica. "Isso significa que estão pesando mais a falta de competitividade e os custos dos fatores de produção."
O economista lembra que nos segmentos de alta tecnologia o fraco desempenho da exportação foi o fator que pesou mais para o saldo negativo. A indústria aeronáutica exportou no ano passado 0,5% a menos do que em 2010 e a indústria brasileira de áudio, vídeo e telecomunicações amargou queda de 15,1% nos embarques.
O total do segmento de alta tecnologia ficou com aumento de apenas 2,6% de exportação. As importações de alta tecnologia aumentaram 11,4%, bem abaixo da alta de 23,5% verificada no total da indústria de transformação.
No setor de média-alta tecnologia, porém, houve uma dinâmica diferente. As importações cresceram em ritmo acima da média, com alta de 25,9%. Nos segmentos de automóveis e produtos químicos (exceto farmacêuticos), por exemplo, as exportações também tiveram alta, mas em grande descompasso com o ritmo mais acelerado das importações. A indústria de automóveis exportou no ano passado 15,7% a mais do que em 2010, mas as importações cresceram 29,1% no mesmo período.
Em média-alta tecnologia estão segmentos que foram muito dinâmicos no período recente da economia brasileira, diz Almeida. O descompasso entre embarques e desembarques é um sinal do avanço das importações na economia do país, acredita. Apesar do dinamismo no mercado interno, lembra, são setores que aproveitaram parcialmente o crescimento econômico porque houve maior concorrência com os importados.
Silvio Campos Neto, economista da Tendências, acredita que a elevação de importados nesses segmentos não está restrita a bens finais, mas também à troca de insumos nacionais pelos adquiridos de fornecedores externos. O câmbio ainda foi favorável às importações e permitiu à indústria nacional melhorar sua competitividade com a compra de matéria-prima a preços mais baixos. "A maior concorrência com os importados ficou evidente no setor de veículos, o que resultou no aumento de imposto para os importados", diz, referindo-se ao Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), cuja alíquota aumentou em 30 pontos percentuais para carros comprados do exterior.
A expansão dos importados foi permitida pela expansão da classe média, que aumentou a demanda doméstica, diz Welber Barral, sócio da M Jorge Consultores. "A indústria nacional, porém, não conseguiu aproveitar esse crescimento para ganhar mercado."
No segmento de máquinas e bens de capital, diz Barral, há também um problema de falta de oferta nacional. "Máquinas e equipamentos para a indústria de petróleo e gás, por exemplo, são importados simplesmente porque o Brasil não produz", explica. Em outros segmentos, há, porém, a questão de competitividade. "A indústria do setor sofreu com o aumento de custos de produção local. Insumos como aço e eletricidade ficaram bem mais caros. Além disso, a indústria brasileira muitas vezes não é capaz de concorrer com a importação sustentada por mecanismos de financiamento externo, com juros muito baixos", acrescenta.
O que mais chama a atenção, diz Barral, são os segmentos que até pouco tempo contribuíram com superávit, viraram o sinal e agora vêm aprofundando o déficit. Além de automóveis, são exemplos os segmentos de têxteis, couros e calçados. De acordo com o levantamento do Iedi, essas três atividades tiveram déficit de US$ 1,5 bilhão em 2011. No ano passado, o saldo devedor foi de US$ 215 milhões, mas em 2009 esses segmentos ainda geravam superávit, de US$ 354 milhões. Nesses setores de mão de obra intensiva, pesou o custo com salários.