Santanu Choudhury
de Adibatla, Índia
Depois de ter fechado uma série de contratos multibilionários com empresas estrangeiras para fabricar peças de helicópteros, aeronaves e trens nos últimos anos, a Índia enfrenta dificuldades para encontrar pessoas qualificadas para produzi-las.
Em uma iniciativa de US$ 3,3 bilhões, a Índia está correndo para treinar 15 milhões de pessoas até 2020 com as habilidades necessárias para atingir a meta do primeiro-ministro indiano Narendra Modi de atrair mais produção industrial de valor agregado ao país.
Os desafios são grandes, já que empresas estrangeiras como Boeing Co., Airbus Group SE e Alstom AS geralmente não encontram funcionários com treinamento e experiência suficientes para atender ao programa “Faça na Índia”, de Modi.
Mais de 80% dos engenheiros da Índia não têm condições de serem contratados, afirmou a Aspiring Minds, empresa indiana de avaliação de empregabilidade, em um relatório de janeiro elaborado a partir de uma pesquisa com 150 mil estudantes de engenharia em cerca de 650 faculdades do país. A falta de cursos especializados obriga as empresas a treinar seus próprios funcionários a partir do zero.
Em um centro de treinamento na região de Hyderabad, no sul da Índia, novos funcionários com pouco mais de 20 anos lidam com ferramentas de alta precisão, aprendendo como fixar rebites em chapas de alumínio para a produção de aviões como parte de um programa de treinamento de um ano.
Os funcionários — uma mistura de engenheiros e pessoas com diplomas de escolas técnicas — esperam obter as qualificações necessárias que os ajudem a garantir uma vaga nas fábricas da Tata Advanced Systems Ltd., braço aeroespacial e de defesa do conglomerado local Tata Group.
O engenheiro mecânico Anubhad Dutta não sabia como fixar rebites ou parafusos em estruturas metálicas de aviões quando entrou na Tata Advanced. Com 23 anos, Dutta é um dos dois recém-formados contratados no programa de recrutamento de uma faculdade de engenharia na cidade de Guwahati, capital do Estado de Assam, no nordeste da Índia. Os novos contratados são obrigados a passar por um treinamento de até um ano.
No curso de engenharia, recebemos a formação teórica. Aqui, estamos lidando com a realidade”, diz Dutta, que estuda num centro de treinamento no enorme complexo industrial da Tata.
A empresa, que abriu sua primeira fábrica em 2010 para fazer a fuselagem do helicóptero S-92 da Sikorsky Aircraft Corp., está entre as várias firmas indianas que buscam se beneficiar da visão de Modi, assim como ajudar a concretizá-la. A companhia também produz peças para as unidades aeroespaciais da Lockheed Martin Corp. , Rolls-Royce Holdings PLC e General Electric Co. , entre outros.
Entre as metas de Modi está a modernização dos setores militar, ferroviário e outros de infraestrutura, ao mesmo tempo em que impulsiona a indústria da Índia, há muito tempo ofuscada pela China. Cada negócio fechado com uma empresa estrangeira exige que algumas peças sejam feitas na Índia.
Analistas estimam que a Índia precisará de cerca de 90 mil trabalhadores na indústria aeroespacial e de defesa nos próximos dez anos. “A Índia não tem escassez de mão de obra — ela tem escassez de mão de obra qualificada”, diz Tom Captain, líder global do setor aeroespacial e de defesa da consultoria Deloitte Touche Tohmatsu.
Para atender à demanda por qualificação, o governo de Modi anunciou dois planos em julho envolvendo investimentos totais de 220 bilhões de rúpias (US$ 3,29 bilhões) para treinar 15 milhões de pessoas até 2020.
As empresas ocidentais estão aumentando seus próprios investimentos diante da necessidade de treinamento. A Boeing completou o primeiro curso de montagem básica de aeronaves para 30 aprendizes este ano, em parceria com o National Skill Development Corp., organização criada para promover a qualificação no país.
Todos os formandos foram contratados por um fornecedor indiano da Boeing, que agora negocia com o governo indiano uma expansão do programa, diz Pratyush Kumar, diretor-superintendente da Boeing India.
A francesa Alstom, que recentemente fechou um pedido de 800 locomotivas com a Índia, avaliado em US$ 3 bilhões, enviou 80 indianos para treinamento no Brasil e capacitou outros 250 na Índia para trabalhar na primeira fábrica de produção de trens de metrô da Alstom no país.
A Índia tem milhares de faculdades de engenharia e escolas técnicas, mas elas não estão formando profissionais com as qualidades exigidas, diz Bharat Salhotra, diretor administrativo da Alstom India & Sudeste Asiático.
A GE tem recebido encomendas de bilhões de dólares da Índia nos últimos anos para produzir de turbinas de energia a equipamentos aeroespaciais e locomotivas de trens. Para atender às expectativas de qualidade de suas fábricas, a empresa promove um vasto treinamento interno. A GE não comentou para este artigo.
A estatal Hindustan Aeronautics Ltd., a parceira local de joint ventures com várias empresas internacionais do setor aeronáutico e de defesa, liderou, no ano passado, o lançamento do Conselho de Qualificação Aeroespacial e de Aviação para treinar centenas de milhares de trabalhadores do setor e 6 mil instrutores nos próximos dez anos.
A Tata Advanced agora está se preparando para o próximo passo. Ela quer passar de fabricante de peças a responsável pela montagem completa de helicópteros e aeronaves, diz Sukaran Singh, diretor-presidente da empresa. A Tata Advanced tem enviado engenheiros para o exterior para que se aperfeiçoem na produção total de aviões.
A Índia tem que subir na cadeia de valor. De outra forma, não teremos nem o trabalho de montagem”, diz Singh.