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Incendiar ministérios é ato de terrorismo

Ruth De Aquino

Talvez, no dia em que chamarmos as coisas pelos nomes que elas têm, fique mais claro saber como agir. Dilapidar patrimônio público, intimidar servidores com rojões e bombas, roubar computadores do Estado, pichar a catedral, colocar fogo na Esplanada dos Ministérios, com o risco de ferir ou matar alguém que nada tem a ver com luta política ou ideológica, não é só baderna de jovens inconsequentes.

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Se continuarmos a passar a mão na cabeça mascarada de black blocs ou a tecer teses acadêmicas sobre o desencanto juvenil com a política, sem prender quem vandaliza a democracia e sem identificar quem está por trás desses atos criminosos, correremos o risco de jogar o país na anarquia e na radicalização. Interessa a quem? Não à população, que odeia quebra-quebra.

Estou cansada de ouvir autoridades como o ministro da Defesa, Raul Jungmann, dizer que a manifestação contra Michel Temer “degringolou” porque os ânimos estavam “exacerbados”. Vamos combinar que isso acontece desde 2013, quando as ruas acordaram em protestos contra a corrupção generalizada. O roteiro é o mesmo. A manifestação começa ordeira e pacífica e, de repente, degringola com excessos da Polícia Militar ou de mascarados “infiltrados”.

Num momento em que o presidente é alvo de 13 pedidos de impeachment, um deles da OAB, sob acusação de graves crimes de improbidade, as forças da lei e da ordem não podem ser “surpreendidas” por um bando que escapa à revista dos policiais e sai quebrando os prédios do governo.

E só sete são presos e logo liberados? É muita desmoralização do aparato de segurança na capital, Brasília. O protesto nem sequer foi espontâneo. Foi marcado. Quinhentos ônibus levados por centrais sindicais a Brasília. Quando ouço mencionar a “inteligência” de nossas forças de segurança, tenho vontade de rir.

Não me preocupo com os deputados e senadores, que se encarregam de xingar e se agredir uns aos outros, em cenas de black bloc explícitas, sem máscara, uma bagunça de baixo nível. Não dá para esperar muito de um Congresso com tantos investigados por corrupção, propina e desvios. Nossos políticos se igualam aos arruaceiros na ignorância.

E o que dizer de nossa Polícia Militar? Em Brasília, um PM deu tiro no chão e chutou a perna de André Coelho, do jornal O Globo, mesmo após ele se identificar como repórter fotográfico. Vimos o PM gordinho, sem preparo físico nem psicológico, correr atirando com arma de fogo.

Queremos mártires para justificar endurecimento do regime? Queremos ficar parecidos com a Venezuela de Nicolás Maduro, que impede opositores e jornalistas críticos de viajar para o exterior, cancelando seus passaportes?

É oportuno lembrar que foi Dilma Rousseff, como presidente, que sancionou em março do ano passado a Lei Antiterrorismo que criminaliza manifestantes. Segundo a lei, depredar e incendiar patrimônio privado e público pode ser considerado ato de terror, inafiançável e passível de condenação de 12 a 30 anos de prisão. A dupla de black blocs que matou com um rojão o cinegrafista Santiago Andrade, em manifestação no Rio de Janeiro em fevereiro de 2014, irá agora a júri popular.

O debate sobre a convocação das Forças Armadas para conter os protestos que haviam saído de controle em Brasília foi contaminado pelo partidarismo e pela histeria. Pouco a pouco, a medida, pontual, foi colocada em contexto. A então presidente Dilma apelou às Forças Armadas para garantir a paz em leilão de pré-sal e em protestos em 2013. O Rio de Janeiro aplaudiu a presença do Exército em várias ocasiões, na ocupação de favelas dominadas por traficantes ou em eventos internacionais como a Olimpíada.

É compreensível o simbolismo negativo de cavalarias e soldados em frente à Esplanada dos Ministérios, num país que sofreu uma ditadura militar. Alguém lembrará que, em 1988, a intervenção do Exército contra uma greve da CSN matou três operários. Mas não consta, em anos recentes, que o Exército tenha abusado de suas prerrogativas quando convocado. Ao contrário. Tem agido na dissuasão da violência e não na promoção do conflito.

Muitos brasileiros ficariam mais tranquilos em participar, hoje, de uma manifestação protegida pelo Exército do que pela PM. A maneira como PMs partem para a boçalidade, chegando a montar falsos flagrantes para incriminar manifestantes, compromete a imagem da instituição.

Protestos descambam para a violência também em Paris e Londres. Carros, bancos e lojas são queimados. Mas nunca vi manifestante ameaçar as instalações do Senado, na Rive Gauche de Paris, ou o Parlamento de Westminster, em Londres. Isso só é imaginável por parte de terroristas. Assim a gente chama as coisas pelo que são.

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