Carlos Alberto Pinto Silva[1]
A intervenção das forças armadas na segurança pública deve obedecer a um requisito fundamental: a fidelidade ao princípio de que o instrumento militar somente deverá ser empregado quando todas as outras modalidades do Poder Nacional para o setor tenham se exaurido, ou quando o jogo político requerer o emprego da força, como última instância, para proteger ou assegurar os direitos da sociedade. A importância do objetivo político determinará o objetivo militar e definirá o nível de esforço requerido.
Se, em função da magnitude e do tipo da crise, o Estado decidir utilizar suas Forças Armadas, a ameaça que motivou tal decisão deverá ser consideradaum problema de Defesa, levando à necessária decretação do Estado de Defesa para amparar legalmente tal emprego e dar segurança jurídica à tropa empregada.
Ocorre que a destinação básica de nossas Forças Armadas é a defesa da Pátria e, nesse ofício, sua preparação deve estar, principalmente, voltada para o conflito bélico, para a guerra, ambiente no qual imperam a violência e a destruição. É por isso que o seu emprego na segurança pública deve ser evitado, a não ser que a sociedade como um todo esteja preparada para a possibilidade do uso da força de forma violenta e letal, pois a intervenção militar gera violência e a violência nunca se sujeita ao controle absoluto.
O que vemos hoje no Brasil é uma fusão de táticas terroristas, de conexões com traficantes de drogas, de insurgência urbana e de fuzis AK-47. Os atores das ações de violência são caracterizados por grupos armados, terroristas, milícias e organizações criminosas. Estes grupos veem no conflito a única maneira de alcançar seus objetivos e utilizam violentas e criminosas ações, que perduram por um longo período, buscando atingir um controle coercitivo sobre a população, acuar as autoridades de segurança e defesa, e desmoralizar poder político (Governos Federal e Estadual).
No planejamento e na execução da Defesa, tanto como na Garantia da Lei e da Ordem (GLO), normalmente numerosos tomadores de decisão intervêm. É preciso que cada um deles tenha a noção correta do tipo de ação que lhes compete resolver, podendo assim, de um lado serem tomadas decisões políticas e estratégicas sem ingerência na estratégia militar, operacional ou na tática, e de outro lado ocorrer o assessoramento oportuno à autoridade superior sem que cada nível deixe a perder nada que é de sua competência. Isto demanda pensamento flexível, especialmente na chegada de conclusões lógicas ao testar qualquer experiência de algo novo.
O nível político deve escolher seus objetivos com cautela e cuidado e ordenar com precisão ao Poder Militar suas modalidades de emprego. Um sucesso militar sobre um objetivo mal selecionado ou onde haja um Poder Militar empregado erroneamente é capaz de acarretar uma derrota final, pois ele pode ser suscetível de gerar novos inimigos ou descontentamentos e, então, inverter o balanço do efeito.
Algumas imposições que os chefes políticos e militares devem considerar antes de uma intervenção:
– entender claramente o resultado político desejado;
– o chefe político deve definir claramente objetivo político da intervenção[2];
– visualizar o resultado antes de intervir;
– conduzir as ações por uma cadeia de comando simples e direta.
Caso a intervenção implicar em combate (uso violento da força):
– usar forças de elite em primeiro lugar (deixar de empregar meios para economizar transporte, alojamento, alimentação e etc.);
– planejar e executar um assalto inicial esmagador (nunca ter de se arrepender por deixar de empregar o poder máximo disponível);
– facilitar a desistência do oponente;
– parlamentar com o oponente;
– restaurar a paz e a ordem tão rápida quanto possível.
Por fim é necessário ressaltar dois Princípios:
– Princípio da Subsidiariedade: sustenta que um organismo superior não deve assumir responsabilidades que podem, e devem ser exercidas por um organismo subordinado. Na situação de “subsidiariedade” o controle vem depois do fato.
– Princípio do uso do Poder Eficaz: é de grande importância o uso inteligente, eficaz e integrado do conjunto completo de ferramentas à disposição do Poder Nacional, e ainda a seleção da ferramenta ou da combinação de ferramentas adequadas para cada situação que se dispõe para enfrentar as novas ameaças, o emprego na Segurança Pública.
[1]Carlos Alberto Pinto Silva / General de Exército da reserva / Ex-comandante do Comando Militar do Oeste, do Comando Militar do Sul e do Comando de Operações Terrestres; Membro da Academia de Defesa e do CEBRES.
[2]Para a Estratégia Militar: os objetivos militares são fixados pela Política; um conceito estratégico pode ser definido como a linha de ação militar resultante do estudo de situação estratégico, podendo combinar um largo espectro de linhas de ação; e recursos militares referem-se a efetivos, material de emprego militar, recursos orçamentários, logística, e outros, e determinam as possibilidades do cumprimento da missão. Esta ideia é aplicável aos quatro níveis da guerra, político, militar, operacional e tático.