Antônio Muller
Presidente da Associação Brasileira para Desenvolvimento das Atividades Nucleares (Abdan)
A matriz energética brasileira é 88% renovável, o que confere ao país um lugar de destaque num mundo a cada dia mais preocupado com a sustentabilidade. O consumo de energia tem crescido em todas as áreas, sendo que os investimentos previstos para os próximos anos e o crescimento da população farão que o consumo de eletricidade passe dos atuais 361.3 TWh para 941.2 TWh em 20 anos, segundo a Empresa de Pesquisa Energética (EPE). Torna-se necessário, portanto, o bom aproveitamento das fontes energéticas, convencionais ou alternativas.
O Plano Nacional de Energia 2030, elaborado pela EPE, prevê que a totalidade dos aproveitamentos hidrelétricos econômicos estará esgotada naquela década, tornando-se necessária uma fonte firme e segura para complementar a matriz que tem como fonte a água dos rios. Sob esse contexto, a energia nuclear seria a fonte mais confiável, econômica e não poluente para a geração da energia suplementar de que o país vai necessitar. Tanto é verdade que o Plano Plurianual (PPA) 2012-2015, que define prioridades de ação para o país no período, sancionado no fim de janeiro, incluiu como meta viabilizar e projetar quatro usinas termonucleares no Brasil, além da construção de Angra 3, que deverá ficar pronta em dezembro de 2015.
Certamente, as fontes hidrelétricas continuarão sendo desenvolvidas prioritariamente. Entretanto, nosso grande potencial hídrico resume-se, hoje, à Amazônia, região sob crescentes dificuldades para a implantação de grandes barragens, mesmo quando atendem a projetos com reservatórios reduzidos, a fio d"água, de modo a diminuir os impactos ambientais. Usinas em construção, como Santo Antônio, Jirau e Belo Monte, são exemplos de empreendimentos que sofrem com restrições que invariavelmente acabam por elevar o preço da energia vendida aos consumidores. Já as energias alternativas, como a eólica e a solar, necessitam de complementação para se tornarem fontes confiáveis e não atenderão à demanda por energia do Brasil a curto prazo.
Nesse cenário, é preciso que o governo tenha uma postura clara e transparente sobre o futuro do nosso programa nuclear, sinalizando de maneira a atrair o interesse da indústria privada e estimular a formação de novo contingente de profissionais qualificados, capaz de dar continuidade ao processo de construção de plantas nucleares.
Mesmo diante da tecnologia absorvida e desenvolvida entre as décadas de 70 e 80, a falta de continuidade do Programa Nuclear Brasileiro e a indefinição sobre o seu futuro afastaram o interesse da indústria nacional e reduziram a capacidade de geração de mão de obra especializada. Profissionais do setor estão chegando à aposentadoria sem transmitir o conhecimento às novas gerações.
No início do programa, foram tomadas providências para assegurar a independência do setor. Assim, acelerou-se a prospecção de urânio e foram criadas a Nuclebrás e as subsidiárias Nuclen (hoje, Eletronuclear), para projetos e construção das usinas; Nuclep, para a fabricação dos componentes; e INB (Indústrias Nucleares do Brasil), para a fabricação de combustíveis.
Com a sexta reserva de urânio do mundo — com possibilidade de ser a terceira com novas prospecções — e um dos três países que dispõem de urânio e tecnologia para a fabricação do combustível, com uma indústria capaz de produzir internamente componentes fabricados em pouquíssimas nações, o Brasil perde a oportunidade de se impor como detentor de tecnologia de ponta. Hoje, toda a infraestrutura criada desde a década de 70 está subutilizada.
A participação privada depende ainda da criação de uma agência reguladora independente, integrada por profissionais qualificados que definam um processo de licenciamento competente, transparente e permanente, conferindo ao setor privado a segurança indispensável para a construção das usinas com prazo e custo previstos. E faz-se necessário um programa de longo prazo, que estimule a participação do capital privado e permita a evolução desse setor estratégico.
A falta de garantias no fornecimento de energia para os próximos anos compromete nosso crescimento. Não podemos abrir mão de uma fonte de energia segura, eficiente, limpa e viável economicamente, que garanta desenvolvimento sustentável ao país.