Nota DefesaNet
O escritor Fabrício Carpinejar escreveu o texto (Um Brigadiano de Valor), no jornal Zero Hora, sobre a morte do soldado da Brigada Militar/RS Fabiano Heck Lunkes.
Ao ser ofendido por um leitor retrucou com um texto mais polêmico (Engraxaria os Coturnos de Fabiano).
Reproduzimos pelo significado dos texto e as palavras corretas de Fabricio Carpinejar.
O Editor
ENGRAXARIA OS COTURNOS DE FABIANO
Fabrício Carpinejar
Escrevi sobre a morte do soldado da Brigada Militar, Fabiano Heck Lunkes, 34 anos, baleado por assaltantes de banco na última quinta (24/4), em Porto Xavier (RS).
Era de se esperar que viria um comentário absolutamente insensível nas redes sociais, demonstrando o imenso descaso com os policiais que se arriscam no dever, apesar dos baixos salários e das condições de insalubridade no combate ao crime.
Respondendo ao comentário irônico do seguidor, eu engraxaria os coturnos do Fabiano, engraxaria sim, com toda a humildade, com toda a admiração, com todo o orgulho. Porque eu não chego aos pés da coragem desse homem que se sacrificou em uma operação de captura a uma quadrilha.
Eu lustraria os seus coturnos porque ele deu a sua vida pelo Rio Grande do Sul. Eu deixaria os seus coturnos brilhando com escova e paciência, burilando o tempo que fosse para que o couro voltasse a ser novo, não mediria esforços, esfolaria os dedos, não largaria as solas até o sol cansar de competir comigo.
Mas o meu pequeno ato não preencheria a sua ausência, não devolveria o brigadiano para a sua família, não diminuiria o luto da sua esposa e de seu filho de 4 anos. Eu sei que jamais conseguiria tirar a mancha de sangue no peito de seu uniforme.
Um Brigadiano de Valor
Fabrício Carpinejar
Quando os policiais tombam, mal nos emocionamos. Os protestos são simbólicos. Acostumamo-nos com as perdas e não percebemos o tamanho desesperador das lacunas. Preocupados em denunciar as desigualdades, acabamos nos esquecendo daqueles anônimos que lutam pela nossa segurança.
Gostaria de falar de um conterrâneo, o brigadiano Fabiano Heck Lunkes, que faleceu na última quinta (24/4), baleado em buscas por assaltantes de banco em Porto Xavier, na Região Noroeste do Rio Grande do Sul. O tiro atravessou o colete e atingiu o peito dele.
Ele só tinha 34 anos, sendo dez dedicados como soldado da Brigada Militar. Uma biografia inteira de sua pouca história destinada a proteger a lei. Desde jovem, assumiu a vocação quixotesca de colocar a farda e se impor mesmo com a falta de estrutura, mesmo com armamentos defasados, mesmo com carros menos velozes, mesmo com as deficiências do Estado para se igualar ao crime organizado, mesmo com a consciência de que os mocinhos não têm final feliz.
É muita honestidade. É muita bravura. Ele sabia que não ficaria rico dentro dessa profissão. Ele sabia que teria que economizar todo o fim de mês para pagar as contas. Ele sabia que deveria manter uma rotina simples no interior, desprovido de grandes luxos. Ele sabia que precisaria atravessar madrugadas de plantão sem a certeza de que voltaria para casa. E aceitou o serviço por amor. Um amor estranho, improvável e ousado a ideais de uma corporação.
É um herói não pela sua morte, que devemos lamentar incansavelmente, mas pela escolha rara e corajosa de dar a sua vida em tempos tão impessoais e insensíveis.
Não temos noção do tamanho do seu sacrifício. Em nome dos outros, ele deixará de acompanhar a infância de seu filho de 4 anos. Não poderá vê-lo aprendendo a ler e escrever na escola. Em nome dos outros, ele não poderá se despedir de sua esposa. Não existe como consolar as lágrimas da precoce viuvez com algum bilhete de adeus. Em nome de quem ele nem conhece, de quem jamais cumprimentou, em nome de nós, de todos nós, ele abdicou de envelhecer um dia e de se aposentar um dia e de sorrir com a sua família novamente um dia.
Cedeu os seus direitos por um dever moral. Não há maior prova de generosa solidariedade.