Luiz Carlos Azedo
Jornalista, colunista do Correio Braziliense
Sempre é bom identificar as linhas de força do processo para imaginar aonde as crises podem chegar. E levar em conta que o governo é sempre a forma mais concentrada de poder, mesmo quando está fraco, desmoralizado, isolado, porque as funções de Estado funcionam no piloto automático. Não há força capaz de suplantá-lo enquanto for capaz de arrecadar, normatizar e coagir. Como num baile que vira rififi, a orquestra não pode parar. É mais ou menos o que acontece nessa crise.
Ao primeiro sinal de que a economia poderia destrambelhar novamente, diante do boato de que o presidente Michel Temer renunciaria, o ministro da Fazenda, Henrique Meirelles, patrioticamente, anunciou que permaneceria no posto caso isso acontecesse. O ministro da Defesa, Raul Jungmann, permaneceu no cargo, e os comandantes militares mandaram o recado: políticos e magistrados, resolvam isso aí! Foi o bastante para acalmar o mercado, até que outra turbulência sinalize que a política econômica esteja em risco. Segue o baile.
A principal linha de força do processo, porém, ameaça virar tudo de pernas para o ar: a Operação Lava-Jato. O procurador-geral da República, Rodrigo Janot, acusa o presidente Michel Temer e o senador afastado Aécio Neves (PSDB-MG) de agirem “em articulação” para impedir o avanço da Lava-Jato, com o deputado afastado Rodrigo Rocha Loures (PMDB-PR). O ministro do Supremo Tribunal Federal (STF) Luiz Edson Fachin determinou a abertura de inquérito para investigá-los por corrupção passiva, obstrução à Justiça e organização criminosa, com base no acordo de delação premiada de executivos do frigorífico JBS.
Constitucionalista e político experiente — presidiu a Câmara dos Deputados por três vezes —, o presidente Temer resiste às pressões dos aliados e da oposição para que renuncie ao cargo, ao qual foi alçado pelo impeachment da presidente Dilma Rousseff. Ontem, no Palácio do Planalto, fez novo pronunciamento, no qual reiterou que não renuncia, proclamou sua inocência, desqualificou os acusadores e desafiou o procurador-geral da República e o ministro relator da Lava-Jato. Era outro Temer, falou com sangue nos olhos e a veemência dos políticos em luta pra se manter no poder. Mas também discursou como criminalista, conhece o Código de Processo Penal. Ao fazê-lo, trouxe o Supremo Tribunal Federal (STF) para o olho do furacão.
Temer perdeu a blindagem constitucional ao ser investigado no exercício do mandato, mas quer reverter a decisão de Fachin no plenário do STF, com argumento de que está sendo vítima de uma grande armação. Desqualificou o empresário Joesley Batista, que gravou clandestinamente uma conversa privada realizada na noite de 7 de março, no Palácio do Jaburu. Deixou evidente que caíra numa armadilha. Mas a carga principal do seu pronunciamento foi contra Janot e Fachin. Temer está convencido de que é vítima de uma conspiração e resolveu contra-atacar. Além de anular a gravação, que sofreu várias edições, quer reformar a decisão de Fachin, questionando-o sobre a relação entre os casos da JBS e da Petrobras, objeto inicial das investigações da Lava-Jato. Ou seja, invoca o princípio do juiz natural.
Até agora, apesar das frequentes intervenções públicas de seus integrantes, o Supremo vinha atuando como um poder moderador. Esse papel teve o seu ápice no impeachment da presidente Dilma Rousseff. Agora, passou a protagonista da Operação Lava-Jato. Dependendo de como o caso foi parar no gabinete de Fachin, até a presidente do STF, Cármem Lúcia, com todo o seu equilíbrio e discrição, será arrastada para a crise política, já que pode vir a assumir a Presidência em caso de afastamento de Temer. Basta que os presidentes da Câmara, Rodrigo Maia (DEM-RJ), e do Senado, Eunício Oliveira (PMDB-CE), que também estão respondendo a inquéritos e podem vir a virar réus, sejam considerados impedidos pela Corte.
Julgamento
São duas semanas decisivas até o julgamento da chapa Dilma Rousseff- Michel Temer na ação impetrada pelo PSDB por abuso de poder político e econômico nas eleições de 2014. O vice-procurador-geral eleitoral, Nicolau Dino ,pediu a cassação do mandato de Temer e dos direitos políticos de Dilma, por oito anos. Seu parecer está em linha com o que pensa o relator do processo, ministro Herman Benjamin. Ambos somente teriam o apoio da ministra Rosa Webber. São sete ministros.
O presidente do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), ministro Gilmar Mendes, marcou para os dias 6, 7 e 8 de junho o julgamento da ação que pede a cassação da chapa Dilma/Temer, que venceu a eleição presidencial de 2014. Quatro sessões foram reservadas para o julgamento, a pedido do ministro Herman Benjamin, sendo duas no dia 8. Sob liderança de Gilmar Mendes, os ministros Napoleão Nunes Maia Filho, Admar Gonzaga, Tarcísio Neto e Luiz Fux votariam contra a cassação de Temer. Esse prognóstico da rádio corredor do TSE subiu no telhado.