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Vila Kennedy, uma região com muitas barreiras

Criminosos recolocaram barricadas nas vias de acesso à Vila Kennedy, na Zona Oeste do Rio. Uma operação com 1,4 mil homens do Exército, realizada no sábado (3), tinha retirado 16 obstáculos das ruas da comunidade. Após a saída dos militares, os traficantes voltaram a colocar as barreiras.

Imagens feitas pelo Globocop na manhã desta segunda-feira (5) mostram um tonel com concreto no meio Avenida Marrocos, uma das vias de acesso mais importantes da região.

Os obstáculos colocados pelos bandidos dificultam o acesso à comunidade de veículos blindados das polícias e das tropas federais. Por volta das 9h45, a Polícia Militar informou que o Batalhão de Choque (BPChq) fazia uma operação na comunidade.

Operação das Forças Armadas

Na ação de sábado, além de retirar as barricadas, o Exército também prendeu cinco pessoas, de acordo com o Comando Conjunto das Operações que atuam em Apoio ao Plano Nacional de Segurança Pública. Cerca de 700 pessoas e 300 veículos foram revistados.

Essa foi a primeira operação no Rio realizada exclusivamente por militares desde que o presidente Michel Temer assinou decreto de intervenção federal na área da segurança no RJ. Essa foi a segunda operação na Vila Kennedy em menos de 10 dias.

Desde o dia 16 de fevereiro até o dia 1° de março, foram retiradas quase 100 barricadas na região da Vila Aliança e Vila Kennedy. O Comando Militar do Leste (CML) está avaliando esta situação para ver que providências vai tomar.

Vila Kennedy, uma região com muitas barreiras¹

Entre as indústrias de Bangu e a zona rural de Campo Grande, em um terreno onde agricultores cultivavam laranja, nasceu a Vila Kennedy. Contratados por uma empreiteira de portugueses, os operários tiveram pressa para erguer as 5.054 casas de 20 metros quadrados: construíram em média 14 unidades por dia e concluíram a obra antes do prazo.

Mas a velocidade teve um preço: na inauguração, em 20 de janeiro de 1964 — Dia de São Sebastião —, não havia luz, água e nem transporte público para os moradores, distantes quase 60 quilômetros do Centro. Três linhas de ônibus precisaram ser criadas, uma delas para a Praça Mauá. Aos 20 mil habitantes iniciais se juntaram outros: 16 favelas nasceram ao redor do conjunto, multiplicando por cinco o número de pessoas.

Localizada no quilômetro 53 da Avenida Brasil, a Vila Kennedy tem sido um laboratório do que o Comando Militar do Leste pretende fazer na intervenção federal no estado. Os militares foram três vezes à região em oito dias, a última delas no último sábado. Mas enquanto as ações sociais prometidas, como atendimentos odontológicos, não começam, o trabalho dos militares tem se mostrado inócuo.

Parecem enxugar gelo ao retirar barricadas instaladas por traficantes para bloquear os acessos à favela, pois os bandidos recolocam as estruturas de concreto assim que os soldados voltam para a caserna. O filme a que se assiste na região é o mesmo de sempre: no domingo à noite, um tiroteio entre traficantes e policiais da UPP, instalada em 2014, matou um inocente, Valdir Vieira da Silva, de 66 anos, atingido por bala perdida. Uma mulher de 40 anos também foi alvejada, mas passa bem.

Primeiro de uma série de conjuntos habitacionais planejados nos anos 60, quando o então governador da Guanabara, Carlos Lacerda, criou sua política de erradicação de favelas, o local recebeu moradores do Esqueleto, no Maracanã, e do Morro dos Pasmado, em Botafogo, a imensa maioria removida contra a vontade. Mas nenhuma das casas existiria se não fosse um homem chamado John Fitzgerald Kennedy.

No calor da Guerra Fria, o presidente dos Estados Unidos queria impedir que a revolução cubana de 1959 se espalhasse pela América Latina. Por isso, lançou o projeto “Aliança para o Progresso", que financiava iniciativas sociais e melhorias urbanas no continente. A vila se chamaria Progresso, não fosse o assassinato de Kennedy, em Dallas, no dia 22 de novembro de 1963, quando um projétil Winchester Mannlicher-Carcano de calibre 6,5 atravessou seu crânio. Em homenagem ao seu patrocinador, Lacerda rebatizou o lugar como Vila Kennedy.

Na Praça Miami, um dos 448 logradouros da favela, foi instalada uma réplica da Estátua da Liberdade esculpida pelo francês Frederic Auguste Bartholdi, o artista que fez a estátua original. Ela está lá até hoje.

— Foi o primeiro projeto de habitação popular que fiz na vida. É uma pena, com o fim do Estado da Guanabara, a prefeitura nunca assumiu a manutenção dos espaços. Todos os conjuntos foram dominados pelo crime — lamenta o arquiteto Giuseppe Badolato, de 83 anos.

Segundo o IBGE, 62,3% dos moradores da vila ganham até um salário mínimo — número bem pior do que a média da cidade, onde 37,7% da população ganha no máximo um salário. Alçada ao posto de bairro no ano passado, a Vila Kennedy tem hoje 25 linhas de ônibus, uma UPA, uma clínica da família, 11 escolas e três creches. Parece muito, mas não há médicos nem educadores para todos.

— A UPA estava em greve até esses dias. A creche da minha bisneta fica em Bangu — conta Maria Arlinda, de 85 anos, removida de um barraco sem banheiro no Esqueleto. — Aqui falta tudo. Mas a gente ama esse lugar.

“É uma pena. Todos os conjuntos habitacionais foram dominados pelo crime ” Giuseppe Badolato Arquiteto.

Comandante do Exército pede cooperação

O comandante do Exército, general Eduardo Villas Bôas, se reuniu ontem no Rio com os militares que integram a cúpula da Segurança do estado. Ele visitou as instalações do quartel-general da intervenção federal, o Centro Integrado de Comando e Controle (CICC), na Cidade Nova. Após o encontro, ele usou sua conta pessoal no Twitter para afirmar que “compreende a ansiedade” vivida com a insegurança, mas que a equipe da intervenção “não fará promessas que não pode cumprir”.

— Oferecemos muita dedicação e trabalho, e esperamos a cooperação dos diversos atores nesta pesada missão — escreveu o oficial.

Mais cedo, ele já havia se manifestado pela mesma rede social. “Após reunião com o general Braga Netto (o interventor federal), reforço a minha convicção de que o planejamento e as ações em andamento em breve serão percebidas pela sociedade carioca. Vamos nos unir para que esta janela de oportunidade permita a recuperação da capacidade operacional da Segurança Pública do Rio”, divulgou.

Assim que chegou ao Rio na noite de domingo, acompanhado de três outros generais de sua equipe, Villas Bôas postou que o Exército apoia a intervenção, “esta difícil missão”. No ano passado, o comandante do Exército fez críticas, pelo Twitter, à mobilização de tropas federais para reforçar a segurança de alguns estados.

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"Não faremos promessas que não poderemos cumprir", diz comandante do Exército no Twitter [Link]

¹Caio Barreto Briso

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