André Luís Woloszyn,
Analista de Assuntos Estratégicos, Pós–graduado em Ciências Penais e Criminologia,
especialista em terrorismo (EUA), diplomado pela Escola Superior de Guerra.
Muito se tem escrito e debatido sobre o programa das Unidades de Polícia Pacificadora que foi implantado nas favelas da cidade do Rio de Janeiro como instrumento para reduzir o impacto das facções criminosas vinculadas ao tráfico de drogas. Principalmente quando a Comissão Internacional sobre Política de Drogas afirmou, em recente relatório, que a guerra global contra as drogas teria fracassado obtendo apenas vitórias aparentes na eliminação de fontes e organizações, que eram substituídas pelo surgimento de outras fontes e traficantes quase que imediatamente.
Nestas condições, a cada nova manifestação dos traficantes na busca pela reconquista dos espaços perdidos para o poder público voltamos novamente a questionamentos sobre a real eficácia das ações que estão sendo realizadas e se, de fato, podemos vencer esta guerra que tudo indica, deve ser de longa duração. Para uma compreensão mais analítica do problema devemos levar em conta alguns fatores intervenientes que contribuem para o recrudescimento do fenômeno e influem diretamente para a eficácia ou ineficácia do programa.
Em primeiro lugar, a compreensão de que a questão do tráfico de drogas é um problema internacional, um crime considerado transnacional que deve ser combatido com ações combinadas inclusive, envolvendo outros países. Esta avaliação está presente quando levamos em consideração o aspecto geopolítico de nosso território. Possuímos uma grande extensão de fronteiras terrestres e marítimas o que nos torna vulneráveis a entrada de drogas e armas que são a matéria prima que alimenta as facções que dominam as favelas e regiões metropolitanas das principais cidades brasileiras. Esta situação é agravada quando fazemos fronteira com países considerados primeiro, segundo e terceiro produtores mundiais de cocaína, e com o segundo no ranking mundial na produção de maconha. Assim, quando existem ações repressivas como as que estão ocorrendo no México e na Colômbia, é natural que a matéria prima seja reduzida o que obriga as facções brasileiras a travar uma guerra interna em busca de pontos para a venda e distribuição da droga.
O segundo aspecto a ser considerado são as condições caóticas e de super lotação das penitenciárias brasileiras, nascedouro de todas as facções criminosas que temos notícia e que são protagonistas dos episódios sistemáticos de violência que vivenciamos. Além de acentuado crescimento em seus quadros a atuação destas organizações vem demonstrando inequivocadamente um alto grau de planejamento e coordenação, muito embora, institucionalmente, algumas autoridades teimem em negar a evolução de tais ameaças. Para alguns especialistas, a concordância da extrema gravidade da situação foi tácita quando solicitado o emprego das Forças Armadas para a garantia da lei e da ordem em um problema de segurança pública cuja solução policial se constitui apenas em uma das ações, não a principal e muito menos a única.
Um terceiro fator que deve ser levado em conta neste quadro é o aspecto da legislação penal. A aprovação da nova lei 12.403/11, que modifica as condições de prisão em flagrante e prisão preventiva e arbitra fiança a crimes com pena de até quatro anos, deverá beneficiar integrantes das facções criminosas tornando-as aparentemente mais fortalecidas. Crimes usualmente combatidos pelo efetivo policial das UPPs nas favelas como o porte ilegal e disparo de armas de fogo, cárcere privado, formação de quadrilha, receptação, apropriação indébita, homicídio simples, lesão corporal gravíssima, uso de armas restritas, dentre outros, não serão punidos imediatamente, tendo o benefício das medidas cautelares.
Um quarto aspecto e com certeza o mais importante que deve caminhar simultaneamente com a pacificação é o incremento de políticas sociais efetivas destinadas a estas comunidades e que tenham como resultado a melhoria das condições de vida e maiores perspectivas para suas populações. Provavelmente neste quesito é que a guerra global contra as drogas tenha fracassado com a inabilidade de alguns em perceber que muitos aderem ao tráfico de drogas por falta de oportunidades, especialmente jovens e adolescentes.
Como verificamos, a missão das UPPs é árdua, complexa e depende de uma conjuntura e de outras iniciativas complementares. Se as autoridades conseguirem sanar ou mesmo minimizar alguns destes problemas, então poderemos comemorar o êxito do maior programa já criado e destinado a neutralizar ações das facções criminosas brasileiras. Caso contrário, o descrédito será inevitável e o programa não resistirá a outra investida das proporções dos episódios que ocorreram em dezembro do ano passado.