André Luís Woloszyn
Analista de Assuntos Estratégicos.
Sabemos que o terrorismo é um crime complexo especialmente por suas características de natureza indiscriminada, imprevisibilidade e seu caráter de anomia, o que o torna de difícil detecção pelas forças policiais e agências de inteligência. Porém, o recente episódio do massacre de Toulouse, que vitimou sete pessoas, aparentemente não seguiu os procedimentos que geralmente norteiam as forças de segurança no trato com este tipo de ameaça.
As autoridades francesas, já vinham monitorando Mohamed Merah há pelo menos um ano, tinham conhecimento de suas ligações com grupos terroristas no Paquistão, sabiam de sua ideologia extremista, possuíam diversos registros policiais de agressões e ameaças, inclusive, contra familiares. Sabiam também, que estava incluído na lista das pessoas proibidas de embarcar em vôos com destino aos EUA por envolvimento com o terrorismo e, o tinham como principal suspeito de ter executado os três militares, paraquedistas do Exército.
Indagados sobre o motivo de não terem adotado providências logo após o primeiro ataque de Merah aos paraquedistas, já que era suspeito, a polícia alegou não ter indícios suficientes para uma ação policial decisiva, o que teria impedido o segundo atentado e a morte de mais quatro pessoas inocentes, dentre estas, três crianças. De fato, é difícil analisarmos o contexto deste episódio, em particular, pois a ação ou omissão no agir deverá obviamente estar embasada na legislação penal francesa o que no Brasil, corresponde ao princípio constitucional da presunção da inocência. Após muita polêmica, especialmente com a adoção do Patriot Act pós atentados do 11-S, crescem e se multiplicam os defensores da teoria do alemão Gunther Jacobs, lançada em 1985, que trata do “Direito Penal do Inimigo” onde é defendida a suspensão de certas garantias processuais a pessoas que não admitem integrarem-se ao Estado e por este motivo, não poderiam ter o mesmo tratamento destinado aos seus cidadãos.
A questão principal é exatamente esta. Qual o bem maior que procura-se tutelar num caso concreto como este, vidas humanas e o interesse coletivo ou direitos individuais, e até que ponto e em que circunstâncias um poderia se sobrepor ao outro? Lembro-me de um artigo do psicanalista Heitor De Paola sobre “inversão e introjeção da culpa” onde ele habilmente se refere, como exemplo, aos combatentes de uma guerra assimétrica afirmando que estes “se permitem lutar em plena potência, sem respeitar nenhuma lei, a não ser a da força justificada pela própria ética que a move”. E, no caso do terrorismo, acrescenta, “usa-se a liberdade e a abertura da sociedade livre e legal forçando-a a restringir seus métodos de defesa legais enquanto movem-se livremente sem nada respeitar”. Esta forma de atuação ou modus operandi se encaixa perfeitamente no episódio em questão como também foi decisivo em outros atentados ocorridos na década que passou e que vitimou milhares de pessoas.
Certamente esta tragédia trará muitas polêmicas e repercussões. A única certeza cabal que ela demonstrou até o momento é a de que não se pode ficar em cima do muro nestas situações e circunstâncias, pois enquanto isso estiver ocorrendo, mais pessoas inocentes continuarão a perder suas vidas numa ética sem sentido.