Fábio Grellet
Em pronunciamento de menos de quatro minutos, após mais de uma hora de reunião no Rio de Janeiro sobre a intervenção na segurança pública do Estado, o presidente Michel Temer (MDB) afirmou na noite desta quarta-feira, 21, que “tudo indica que poderá haver uma tendência de queda” nos índices de criminalidade no Estado do Rio.
Ele também ressaltou ações sociais realizadas na Vila Kennedy (comunidade da zona oeste onde as Forças Armadas concentraram seus esforços por enquanto) e afirmou que “nos próximos dias” o governo vai disponibilizar R$ 1 bilhão prometidos para a intervenção no Rio.
“Tudo revela que poderá haver uma tendência de queda nas várias espécies delituosas”, disse Temer. “Não restou dúvida em relação a isso. Ao longo do tempo isso realmente ocorrerá”, afirmou, após reunião no Centro Integrado de Comando e Controle (CICC), no centro da capital fluminense, onde debateu com o governador Luiz Fernando Pezão (MDB) e o interventor na segurança pública do Estado, general Braga Netto, questões relativas à intervenção. Temer não respondeu perguntas da imprensa.
“Ouvi postulações referentes às necessidades administrativas do gabinete do interventor, que serão supridas pela União e pelo governo do Estado. A verba ontem mencionada (pelo Gabinete de Intervenção Federal) de R$ 3 bilhões, boa parte dela se refere ao passivo, portanto no passado, e as necessidades giram em torno de R$ 1 bilhão. Nos próximos dias nós estaremos definindo a alocação desses recursos”, afirmou Temer.
O presidente também elogiou as ações sociais realizadas durante a intervenção. “Não basta combater a insegurança, é preciso praticar gestos de natureza social. Cerca de 13 mil atendimentos sociais foram feitos na Vila Kennedy e isso vai continuar por todo o período da intervenção”, afirmou, no rápido pronunciamento.
Temer viajou de Brasília para o Rio na noite desta quarta-feira acompanhado por três ministros: Raul Jungmann (Segurança Pública), Joaquim Silva e Luna (que ocupa interinamente o Ministério da Defesa) e Sérgio Etchgoyen (Gabinete de Segurança Institucional da Presidência da República), além de integrantes das Forças Armadas.
A comitiva chegou ao Rio por volta das 21h30, desembarcou no 3º Comando Aéreo Regional, no aeroporto Santos Dumont, no centro, e seguiu para o CICC, onde se reuniu das 22h até por volta das 23h15 com Pezão e o general Braga Netto.
Até as 23h30, a assessoria de Temer não havia informado se ele iria passar a noite no Rio ou retornaria para Brasília durante a madrugada.
Experiência não solucionou o problema da segurança no Rio, mas mostrou um caminho possível¹
Há 25 anos, o Rio viu pela primeira vez o Exército intervir e ocupar uma favela por conta da violência. Foi uma experiência pequena e pontual que, obviamente, não solucionou o problema da segurança pública na cidade, mas mostrou um caminho possível, nunca mais trilhado.
Situado entre duas favelas do Complexo da Maré, à beira da baía de Guanabara, o 24º Batalhão de Infantaria Blindada (BIB) virou alvo durante disputas de traficantes, em outubro de 1993. Alvejado por dias seguidos, ficou com várias marcas de bala e teve um sentinela atingido.
O comandante do batalhão, coronel Marco Guedes, decidiu tratar o caso como um crime militar, sob sua jurisdição, e entrou na favela em busca dos criminosos que atacaram o quartel. Levou não só o braço forte, mas a mão amiga: conversou com a comunidade, ofereceu atendimento médico, recuperou creches, levou lazer.
O então responsável pelo Comando Militar do Leste, general Rubem Bayma Denys, pediu ao prefeito César Maia que fosse feito um trabalho conjunto de “ocupação social” da favela. E assim foi, inclusive com a transferência de moradores de palafitas para os conjuntos habitacionais do então nascente projeto Favela-Bairro.
A intervenção militar não ocorreu sem incidentes, é claro. Os moradores da favela foram fichados —como se fez agora na Vila Kennedy—, para identificar eventuais criminosos.
O apoio da comunidade, no entanto, foi total. Quando surgiu o rumor de que o 24º BIB seria transferido de área (o que acabaria acontecendo anos depois), houve um protesto dos locais. Desse episódio, depreende-se que há um quarto de século, no mínimo, as Forças Armadas já sabiam que não adianta levar para favelas apenas a repressão.
A mesma lição foi repetida com sucesso no Haiti. Infelizmente, parece ter sido esquecida na atual intervenção federal.