Com a mudança na cúpula da segurança pública, o governador Geraldo Alckmin dá mais um passo importante para enfrentar a onda de violência na Grande São Paulo. Não se pode dizer que a saída de Antônio Ferreira Pinto, que apresentou ontem seu pedido de demissão da Secretaria, onde será substituído por Fernando Grelha Vieira, ex-procurador-geral de Justiça do Estado, constitua uma surpresa. O seu desgaste era evidente, principalmente por causa do erro de avaliação da real força do Primeiro Comando da Capital (PCC), cometido pouco antes da eclosão da atual crise.
Segundo o ex-secretário, essa organização criminosa estava enfraquecida e se limitava a "30 ou 40 indivíduos que estão presos há muito tempo e se dedicam ao tráfico". Não apenas os integrantes do PCC estavam muito longe de ser esse punhado de gatos pingados, como seus líderes, mesmo presos em penitenciárias ditas de segurança máxima, continuam a comandar ações criminosas de dentro delas – cujo alvo principal no momento é a própria polícia como está se vendo. Embora esse episódio não seja, é claro, a única marca de sua passagem pela Secretaria, ele tornou sua posição insustentável nas atuais circunstâncias.
É bom que com a nomeação de Grelha Vieira – de quem se deve esperar uma reavaliação da situação da segurança – o governador deixe clara mais uma vez sua determinação de combater a criminalidade sem trégua e com todos os recursos disponíveis. Em primeiro lugar, porque isso depende essencialmente do Estado. Em segundo, porque, mesmo a ajuda limitada que ele pode esperar do governo federal – só relevante em alguns pontos – vem às vezes acompanhada de declarações infelizes, que só dificultam as coisas.
É o caso da comparação – claramente maliciosa e provoca- dora – do ministro da Secreta- ria-Geral da Presidência, Gilberto Carvalho, da situação de São Paulo com a da Faixa de Gaza: "A gente estava alarmado com os mortos na Palestina e as estatísticas mostram que só na Grande São Paulo você tem mais gente perdida, assassinada, do que num ataque desses". E, como se isso não bastasse, acrescentou que o problema da segurança em São Paulo não deve ser objeto de "utilização política ou partidária", por se tratar de algo "muito grave", embora tenha sido exatamente o que fez.
Não se deve misturar coisas diferentes, principalmente quando graves e dramáticas como essas, e quando quem se dedica a esse lamentável exercício é uma alta autoridade. Não fosse isso, o ministro Gilberto Carvalho certamente encontraria outros objetos mais apropriados – e próximos de seus correligionários e aliados – para suas comparações.
Provocadora também é a afirmação do ministro de que "finalmente houve por parte do governo de São Paulo a aceitação dessa parceria com o governo federal". Ele poderia aproveitar a ocasião para explicar por que o levantamento sobre pessoas ligadas ao PCC, feito pelo Conselho de Controle de Atividades Financeiras (Coaf), do Ministério da Fazenda, mostrando seu fortalecimento nos últimos anos, não foi repassado ao governo paulista. E também por que só agora foi feita a integração dos serviços de inteligência da Polícia Federal e das Polícias Civil e Militar de São Paulo. Por que não antes?
Essas medidas e a transferências de líderes do PCC para presídios federais são as únicas contribuições de peso que o governo federal pode oferecer. A tão decantada vigilância nas estradas, poitos e aeroportos – embora devam ser reforçadas sempre mais -, que começou a ser feita com ajuda federal, tem efeito limitado sobre o tráfico de drogas e contrabando de armas, como mostra o exemplo de países ricos, a começar pelos EUA. E o Brasil – São Paulo não pode ser considerado isoladamente – tem 23 mil quilômetros de fronteiras, sendo 16 mil terrestres, boa parte com países produtores de coca, e 7 mil marítimas.
Finalmente, é preciso ter sempre em mente que, se não se deve negar a gravidade da situação em São Paulo, também não se pode esquecer de que o Estado continua a ser, de longe, o que apresenta os mais baixos índices de criminalidade do País.