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Polarizadores no Brasil, black blocs surgiram na Alemanha

No último dia 8 de outubro, ruas do centro do Rio de Janeiro amanheceram como se houvera acontecido ali uma batalha. Prédios tinham a fachada manchada por coquetéis molotov, ônibus estavam queimados, e agências bancárias, de tão danificadas, estavam inutilizáveis. Entre os estabelecimentos comerciais, eram poucos os que não tinham marcas de destruição. Nem a sede de um consulado, o de Angola, escapou da depredação.

Na noite anterior, centenas de professores haviam escolhido o local para protestar por melhores condições de trabalho. Não demorou, no entanto, até que a violência se instaurasse. A marcha pacífica durou precisamente até o momento em que um grupo vestido de negro, com capuzes e faixas cobrindo o rosto, se infiltrasse.

Os black blocs são um dos elementos mais polarizadores da série de protestos que desde meados do ano acontecem no Brasil. Têm como ideologia questionar a ordem vigente – opõem-se ao capitalismo e à globalização. Sua principal arma é promover o dano material, e seus alvos costumam ser bancos, empresas e sedes de instituições públicas.

A tática acaba os levando ao inevitável confronto com a polícia – e lhes rendendo a alcunha de vândalos, adotada por parte da imprensa e pelas autoridades brasileiras. No estado do Rio, onde estão mais presentes, uma lei foi aprovada no mês passado proibindo o uso de máscaras em protestos de rua.

"Os black blocs não agridem pessoas, mas símbolos do poder. Eles não se consideram violentos porque entendem que um objeto não é vítima de violência. Para eles, violenta é a polícia, que agride os manifestantes e, ao mesmo tempo, protege o patrimônio dos bancos", afirma o cientista político Pedro Fassoni Arruda, especialista em movimentos sociais da PUC-SP.

Origem na esquerda radical

O Black Bloc é hoje mais uma tática anarquista do que uma organização. E não é exclusividade do Brasil, embora tenha ganhado notoriedade nos últimos meses no país. Seus adeptos estiveram, por exemplo, na convulsão social de março de 2011 em Londres e nas marchas estudantis chilenas; causaram confusão nas manifestações de janeiro passado no Egito, quando se lembrou um ano da revolução; e se infiltraram nos recentes atos contra o governo da Turquia.

Sua origem, porém, é alemã. O termo Black Bloc (Schwarzer Block) foi usado pela primeira vez por um promotor da Alemanha em 1981, ao tentar acusar um grupo violento de manifestantes por associação a um movimento terrorista. Na época, seus adeptos aderiram aos protestos contra a energia nuclear e a construção de mais uma pista de decolagem no aeroporto de Frankfurt.
 

"Os black blocs são claramente um produto do movimento de 1968 criado na cena radical de esquerda em Frankfurt", explica o cientista político Wolfgang Kraushaar, do Instituto de Estudos Sociais (HIS) em Hamburgo. "Após confrontos de militantes com a polícia na sequência de uma manifestação de 1º de maio de 1980, eles apareceram na mídia e, desde então, também em panfletos."

No Brasil, o movimento garante não ter hierarquia – reúnem-se de forma quase instintiva. Mas, segundo Kraushaar, os black blocs são mutuamente influenciados por estruturas informais dentro do grupo, nos quais há porta-vozes e outras autoridades.

Perda de apoio

A intensificação da forma de protestar e os inevitáveis confrontos com a polícia vêm levando o grupo a perder apoio entre os brasileiros. Se nos protestos antes da Copa das Confederações eles eram, segundo seus defensores, aqueles que, na linha de frente, enfrentavam uma suposta violência desproporcional das forças de segurança, hoje são muitos os que querem se afastar deles.

Grupos da sociedade civil, como sindicatos, que geralmente convocam manifestações pacíficas, não querem se identificar ou se associar com o quebra-quebra promovido pelos black blocs.

"Observo uma reação contra os black blocs. Isso cria uma reação muito negativa por parte da população civil. Em vez de estimular mudanças sociais, os black blocs podem estar estimulando o ódio e a contrariedade por parte de alguns", afirma o cientista político David Fleischer, da Universidade de Brasília (UnB). "Eles estão perdendo a legitimidade e a simpatia junto à população."

Uma das principais queixas dos defensores do grupo é quanto à rotulação de suas ações como vandalismo gratuito. Mas, apesar das críticas dos black blocs às grandes mídias, Kraushaar vê uma certa troca entre o movimento e a imprensa. Ele diz que, desde o início, houve uma afinidade entre os dois lados.

"Uma ação violenta parecia ser valorizada pela mídia. Em geral, ações sem violência não recebiam atenção, muito menos os militantes. Entre a mídia e os militantes existe até hoje algo como uma aliança secreta. Cada um sabia da existência do outro e o que poderia ser eficaz em termos de notícia", afirma o cientista político alemão.

Para o sociólogo Simon Teune, do Instituto de Pesquisas em Protestos e Movimentos da Universidade Técnica de Berlim (TU-Berlin), desde a criação do movimento a leitura do público quanto aos black blocs não mudou. Os manifestantes, explica, são estigmatizados como agressores irracionais e despolitizados – e quanto a isso, segundo ele, há uma grande unanimidade não só na imprensa brasileira.

"Não é do meu conhecimento se aqui na Alemanha eles foram compreendidos em algum momento na mídia privada ou pública como um protesto legítimo", afirma Teune. Ele explica que, na Alemanha, o Black Bloc é uma parte da cultura de protesto, enquanto em países como o Brasil e o Egito ainda é algo recente. "Por isso não é claro se este fenômeno continuará a existir nesses países."

 

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