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Estratégia policial enérgica divide opiniões na Copa

Luis Kawaguti
 

Reações enérgicas das forças policiais contra grupos reduzidos de manifestantes que tentam se aproximar de estádios vêm marcando a maior parte das manifestações ocorridas desde o início da Copa do Mundo.

Para analistas ouvidos pela BBC Brasil, com essa estratégia, as autoridades brasileiras tentam evitar publicidade internacional negativa, mas podem acabar ferindo o direito de manifestação da população.

Em capitais como São Paulo e Belo Horizonte, pequenos grupos de manifestantes foram dispersados desde o início do Mundial com gás lacrimogêneo e balas de borracha por numerosos contingentes policiais – antes mesmo de conseguirem se concentrar para marchar em direção aos estádios.

Essas ações policiais vêm sendo bastante criticadas por organizações não governamentais, como ONG de defesa de direitos humanos Anistia Internacional, que acusa a política de uso excessivo de força durante a Copa.

Já os governos defendem suas ações principalmente com os argumentos de impedir vandalismo por parte de grupos manifestantes radicais e evitar que importantes vias das cidades usadas na Copa do Mundo sejam bloqueadas. As autoridades dizem que o direito de manifestação não está sendo impedido.

Segundo os analistas, essa estratégia da polícia deve continuar sendo adotada por ora, pelo menos enquanto não ocorrer um erro policial ou ocorrência grave em um protesto, ou até após as eleições, quando os eleitos poderão tomar as decisões políticas necessárias para atender as demandas das ruas.

Impedir concentrações

Até agora, as manifestações com centenas de milhares de pessoas que marcaram o ano passado não têm se repetido durante o Mundial. O embate de estratégias de manifestantes e de autoridades tem gerado polêmica internamente, porém baixa repercussão fora do Brasil – onde as notícias esportivas relacionadas ao Mundial têm ganho muito mais destaque.

De acordo com a Anistia Internacional, diferente do que ocorria antes do início do mundial, forças policiais brasileiras não estão permitindo que manifestantes sequer se concentrem para iniciar protestos. Especialmente se o objetivo é se aproximar de estádios.

"Estão restringindo o direito e a liberdade das pessoas de se manifestarem pacificamente", segundo Renata Neder, assessora de direitos humanos da Anistia Internacional Brasil.

Segundo ela, a organização investiga casos com essas características em São Paulo e Belo Horizonte. Na capital paulista, essa tática teria sido usada no último dia 12 – quando manifestante teriam tentado fechar uma das principais vias de acesso à Arena Corinthians na abertura do Mundial.

A Anistia diz que um grande contingente policial usou armamentos não letais contra um grupo pouco numeroso.

A reportagem da BBC Brasil estava no local e constatou que, pelo menos no início da ação, foi usada uma quantidade maior de balas de borracha em relação ao que vinha sendo empregado em protestos anteriores. A presença de policiais a cavalo também foi um elemento novo.

Imagens de uma TV local também mostraram um homem ser atingido por gás de pimenta mesmo depois de dominado por policiais.

O comandante da Polícia Militar paulista Benedito Roberto Meira disse na ocasião que o uso de balas de borracha faz parte dessas ações e quem deve mudar de postura "são os manifestantes".

O secretário de Segurança de São Paulo, Fernando Grella, negou que o direito de manifestação tenha sido cerceado. Ele disse que esse direito deve ser balanceado com o direito de ir e vir – referindo-se à intenção dos manifestantes de bloquear a avenida Radial Leste.

Segundo a Anistia, em Belo Horizonte no último dia 14, a polícia teria impedido parte dos manifestantes de chegar ao local escolhido para o protesto.

O secretário de Defesa Social de Minas Gerais, Rômulo de Carvalho Ferraz, disse à BBC Brasil que a tática usada na cidade foi confinar os manifestantes em um espaço físico limitado para evitar depredações. Ele disse porém que os manifestantes ficaram livres para entrar ou sair individulamente desse espaço. "Não adotamos postura para impedir manifestação", disse.

Episódios de manifestantes dispersados enquanto se dirigiam ao local de protesto também ocorreram em outras capitais, embora tenham sido menos debatidos.

Além de investigar esses casos, a Anistia está investindo em campanhas sobre temas relacionados, como pela presença de defensores públicos dentro de estádios e a regulamentação federal do uso das armas não letais.

Equilíbrio

Para o analista de segurança internacional Peter Tarlow, autor do livro Tourism Security ("Segurança do Turismo", sem versão em português), o Brasil precisa encontrar um equilíbrio entre as demandas nacionais e os objetivos internacionais com a Copa.

"O (governo do) Brasil não pode tolerar desordem ou bagunça. Eles (os governos) precisam ter uma mão firme para não permitir má publicidade (internacional)" , disse Tarlow.

"Agora, do ponto de vista das pessoas que moram lá (no Brasil), é uma situação muito difícil, porque eles estão perdendo seu direito de protestar."

"Se eu fosse um brasileiro não gostaria de ver a polícia usando a força", completou.

Mas ele acha que se a polícia não continuar adotando ações enérgicas, em teoria a tendência é que os protestos cresçam.

Ele disse também que as ações podem ser fortes, mas abusos de policiais não podem ser permitidos.

"Geralmente quando a polícia não mostra a capacidade de manter a ordem, então as manifestações podem crescer, não diminuir, mas pelo menos o que temos até o momento é que as manifestações têm sido pequenas (no Brasil)”, disse.

Postura sustentável?

Mas a postura de ação rápida e enérgica contra manifestantes que tentam se aproximar de instalações da Fifa será mantida até o fim do mundial?

Segundo Neder, ela não deveria, pois o direito de manifestação pacífica vem sendo prejudicado.

Já Tarlow afirmou que a estratégia vem sendo "eficaz" para o objetivo de não criar publicidade negativa no exterior.

Segundo ele, o sucesso dos jogos do mundial aliado a problemas internacionais também ajudam a tirar a atenção internacional das questões sociais do Brasil.

"O Brasil perdeu muito prestígio por causa das manifestações antes dos jogos da Copa do Mundo, mas durante a Copa a maior parte das pessoas está prestando atenção nos jogos.”

“E também tem muitos problemas no mundo, problemas no Iraque, nos Estados Unidos. Isso está ajudando a ocultar os problemas que há no Brasil”, disse Tarlow.

Contudo, o cenário pode mudar radicalmente se alguma força policial cometer um erro grave ou ocorrer uma “tragédia” em um protesto. Por isso, segundo ele, a polícia tem que adotar postura flexível.

Já para Tânia Pinc, pesquisadora da Fundação Getúlio Vargas e membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, a postura das polícias pelo país pode estar relacionada às eleições de outubro.

Para ela, o que ocorre nos protestos é resultado de uma interação dos grupos sociais, forças policiais e governos.

"Os governos nunca pautaram o direito de manifestação nas agendas, sempre trataram como um assunto de segurança pública. A questão política sempre era deixada em um plano secundário".

Segundo ela, o vandalismo provocado pelos chamados black blocs cria justificativas para isso.

Assim, disse ela, a ineficiência dos governos em resolver as questões levantadas nas manifestações faria com que essas autoridades usem as polícias para postergar as decisões políticas.

A pesquisadora acredita que os temas propostos pelos manifestantes dificilmente serão tratados antes das próximas eleições, e a postura policial deve permanecer inalterada.

Manifestações têm perfil diferente

Segundo o especialista em segurança Guaracy Mingardi, também membro do Fórum Brasileiro de Segurança Pública, as manifestações que vêm ocorrendo tem um perfil diferente dos protestos do ano passado.

Ele afirmou que as polícias nunca tiveram a preparação completa para diferenciar manifestantes pacíficos de black blocs.

Mas nos atuais protestos, de menores proporções, tornou-se mais fácil para os policiais diferenciar quem é quem.

Por causa disso, em sua opinião, os protestos estariam se tornando menos violentos que os ocorridos no início de junho de 2013.

"Há um número menor de manifestantes pacíficos e um número igual de black blocs. Fica mais fácil para a polícia controlá-los".

Presença policial

Na última quinta-feira a opção feita pela polícia de São Paulo foi diferente do que havia ocorrido desde o início da Copa.

Os manifestantes do Movimento Passe Livre divulgaram com antecedência o roteiro de sua manifestação – e ela não passava pela Arena Corinthians.

Atendendo aos manifestantes, o governo não enviou a Polícia Militar para acompanhar o protesto. Mas ao fim dele, mascarados black blocs vandalizaram concessionárias e bancos.

A violência deu o alerta para a Fifa e para o governo local – que prometeu que a polícia estará presente nos próximos atos.

Resta saber se depois disso a repressão rápida e enérgica da polícia realmente continuará como a principal tática. Nesta segunda-feira, quando o Brasil enfrenta Camarões, novos protestos estão previstos.

 

 

 

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