Em 17 de dezembro de 1996, quatorze membros do Movimento Revolucionário Túpac Amaru (MRTA), uma organização terrorista do Peru, ocuparam Embaixada do Japão em Lima. Centenas de convidados estavam presentes para a celebração do aniversário do imperador nipônico quando os terroristas infiltraram-se no complexo e fizeram todos reféns. No decorrer das horas subsequentes, dezenas de reféns – dentre os quais todas as mulheres – foram autorizados a deixar o lugar, restando apenas 72 pessoas (ver quadro).
No dia seguinte, os principais líderes militares elaboraram um plano para resgatar os reféns restantes. Por um período de quatro meses, 140 comandos foram treinados, preparados e instruídos para aquela que viria a ser a operação de resgate de maior sucesso na história do Peru. A Operação Chavín de Huántar foi desencadeada em 22 de abril de 1997, quando os comandos invadiram a embaixada e libertaram todos os reféns. A operação durou apenas 30 minutos, mostrando que a preparação, o planejamento e o treinamento concretizaram-se satisfatoriamente.
O atual diretor da Escola de Comandos, Coronel José Oliva, explicou que o alicerce para aquele exercício começou na instituição. Desde a sua criação, há mais de 50 anos, a escola tem treinado não apenas os melhores soldados do Peru, mas também de outros países, incluindo Argentina, Brasil, Colômbia e México.
“Nossa principal missão aqui na escola é treinar nossos soldados para serem comandos”, disse o Cel. Oliva. A escola foi fundada oficialmente em 1961, após o Exército peruano perceber a necessidade de ter uma unidade de forças especiais. Quatorze policiais foram selecionados para viajar para Fort Benning, na Geórgia, para completar o curso intensivo da Ranger School, escola do Exército dos EUA. Ao retornarem ao Peru, os oficiais empregaram todo o treinamento e princípios básicos na primeira turma de cadetes, criando, assim, o primeiro curso de graduação de comandos. A Escola de Comandos ainda se mantém firme aos princípios fundamentais aprendidos na Ranger School dos EUA, mas eles foram adaptados pelo Exército peruano para melhor atender às suas necessidades. Cursos táticos, como os de combate ao terrorismo, tornaram-se essenciais com a ascensão do Sendero Luminoso e do MRTA na década de 1980.
O curso de seis meses não é para quem tem coração fraco. Um bom condicionamento físico e mental é de suma importância para a sua conclusão. Para oficiais, as matrículas geralmente estão abertas para membros com patentes que vão de segundo-tenente a capitão, ao passo que para não-oficiais, os admitidos variam de terceiro a primeiro sargentos. O treinamento dos cadetes da escola é dividido em três fases: básica, técnica e prática.
Na fase básica, além do treinamento físico diário, os cadetes aprendem os fundamentos de primeiros socorros, comunicação e direitos humanos – um aspecto muito enfatizado pela escola. A parte técnica testa a resistência física dos cadetes, com provas de sobrevivência na água, alpinismo, corrida de obstáculos, patrulhamento e marchas com mochilas. O não cumprimento de qualquer parte desta fase fará com que o soldado seja excluído da escola. “Ao longo de todo o curso, o desgaste é um fator natural”, disse o Cel Oliva. “Normalmente, a turma média de graduados é de 25 a 30 alunos, após inscrição inicial de 50 ou 60.”
Durante a fase final do curso, os cadetes colocam em prática, com a geografia diversificada do Peru, tudo que aprenderam. Por exemplo, a fase de alpinismo é conduzida na altitude da região de Huaraz, localizada 3.052 metros acima do nível do mar, a cerca de 420 quilômetros ao norte de Lima. Ao completar este estudo, os alunos passam para a fase da mata, que normalmente ocorre na região do Vale dos Rios Apurímac e Ene, o celeiro das atividades do Sendero Luminoso atualmente.
Quando um cadete é bem sucedido e completa o programa da Escola de Comandos, recebe formação complementar especializada em áreas como treinamento de tiros de precisão/atirador de elite, alpinismo, busca e salvamento, ou ainda operações subaquáticas. Completar todo o curso e fazer parte da irmandade dos comandos é uma questão de honra para esses soldados de elite. O lema deles pode ser traduzido como “ser e não parecer”, uma referência para que não apenas se vangloriem de suas ações, mas cumpram a missão e façam tudo como verdadeiros soldados dos comandos. O hino da Escola de Comandos diz: “A vitória é para todos os nossos irmãos no campo, não apenas para os comandos.”
“Se você perguntar a todos no Exército, a maioria dos soldados gostaria de ser um comando, mas nem todos podem ser um”, disse o Cel Oliva. “Para mim é uma questão de orgulho pessoal ter me formado como comando por causa de tudo o que aprendemos e passamos; isso mostra o que a vontade do espírito humano é capaz de fazer”.
A ousada operação de resgate no Peru
DIÁLOGO
Durante quatro meses, os soldados escavaram por entre as rochas e cimento diariamente. Escavaram com ferramentas e equipamentos muito básicos, a fim de minimizar o ruído. Eles escavaram até que finalmente chegaram à parte inferior da embaixada japonesa, que havia sido ocupada por terroristas.
Quatro meses antes, na noite de 17 de dezembro de 1996, membros do Movimento Revolucionário Túpac Amaru (MRTA), uma organização terrorista peruana, invadiram a residência do embaixador japonês Morihisa Aoki, onde mais de 500 convidados celebravam o aniversário do imperador nipônico. Os 14 terroristas, armados com fuzis de assalto, RPGs e granadas, desencadearam duas explosões e tomaram os convidados em pânico como reféns.
Ao longo da noite, todas as mulheres e altos dignitários foram liberados, até que restassem 72 reféns. Dentre eles, estavam autoridades japonesas e altos funcionários das forças de segurança do Peru, incluindo o Almirante-de-Esquada Luis Giampietri, que provou ser peça fundamental para as Forças Armadas peruanas durante a crise.
Em 18 de dezembro, um dia após o cerco, a Operação Chavín de Huántar, em referência a um famoso sítio arqueológico peruano conhecido por suas passagens subterrâneas, foi posta em prática pelo governo do Peru, sob sigilo máximo. Em preparação para a operação, uma réplica em tamanho real da embaixada foi construída em uma base militar. Lá, 140 comandos das forças especiais apresentam-se como voluntários para a missão e treinaram cada detalhe da operação. Simultaneamente, túneis começaram a ser escavados a partir de edifícios adjacentes à embaixada, levando a três pontos-chave abaixo da residência japonesa, onde seriam colocados explosivos.
Em 22 de abril de 1997, três cargas explosivas que tinham sido colocadas nos túneis subterrâneos foram detonadas em três salas distintas no primeiro andar. A primeira explosão atingiu o meio da sala onde um jogo de futebol ocorria, matando imediatamente três sequestradores. Através dos buracos decorrentes das explosões, 30 comandos invadiram o prédio, perseguindo o resto dos membros do MRTA antes que conseguissem chegar ao segundo andar.
Ao mesmo tempo em que ocorreram as explosões, duas outras táticas foram executadas. Uma investida direta foi feita na frente do edifício por 20 comandos, que se juntaram aos outros companheiros que já haviam entrado por baixo do edifício. Um terceiro grupo de comandos chegou ao segundo piso, subindo pelas escadas externas e, em seguida, explodiu uma porta à prova de granadas e começou a evacuar os reféns. No final, todos os 14 terroristas foram mortos, assim como dois comandos e um refém que morreu de parada cardíaca após ser atingido na artéria femoral por estilhaços de uma granada dos terroristas.
Hoje, a réplica da embaixada utilizada para preparar a missão foi transformada em um museu para celebrar o sucesso da operação. O dia 22 de abril foi declarado como dia nacional de lembrança para homenagear aqueles que morreram durante a Operação Chavín Huántar.