Luis Kawaguti
As polícias de São Paulo e do Rio de Janeiro estão tentando se adaptar às táticas de enfrentamento utilizadas em protestos de rua pelo grupo de manifestantes conhecidos como Black Blocs.
Por outro lado, participantes do grupo estariam estudado procedimentos da polícia e adotado medidas para dificultar a identificação de seus membros.
Um dos protocolos de ação que está sendo revisto pela polícia, ao menos em São Paulo, é o de levar todos os suspeitos detidos em protestos para uma mesma delegacia, segundo disseram à BBC Brasil policiais civis envolvidos com a investigação dos Black Blocs no Estado.
A medida vem sendo repensada porque, nas duas capitais, delegacias (a 9? DP do Rio e o 78º de São Paulo) foram cercadas por multidões de manifestantes que exigiam a libertação de seus companheiros.
A polícia teme que seus prédios sejam invadidos. Por isso devem passar a dividir os grupos de suspeitos detidos em diferentes locais durante os protestos.
A Secretaria de Segurança de São Paulo tenta também unificar as ações das diversas unidades da polícia com a criação, na semana passada, de uma força-tarefa formada por diversas unidades das polícias civil e militar, além de membros do Ministério Público.
Táticas
Policiais relacionados à investigação dos Black Blocs em São Paulo afirmaram à reportagem suspeitar que o grupo elabora táticas não só para evitar sua identificação pela Polícia Civil, como também para atacar os policiais militares durante os protestos.
Policiais disseram que grupos de manifestantes organizados estão a par de um procedimento comum da polícia, o de investigar pessoas que buscam tratamento em prontos-socorros logo após um grande protesto ou choque com policiais.
Para evitar identificações, os Black Bloc teriam copiado um modelo usado pelo Movimento Passe Livre – que organizou protestos massivos pela redução das tarifas do transporte público em julho – no qual teriam criado uma equipe própria para oferecer cuidados médicos a seus membros feridos.
Seus membros também estão apagando informações pessoais da internet e aprendendo a usar softwares que codificam mensagens enviadas pela rede, dificultando sua interceptação.
Segundo a polícia, eles também teriam estudado a forma de organização de unidades de contenção de multidões da PM. O objetivo seria aprender sobre quais são as reações da polícia a cada tipo de ação dos manifestantes.
Para atacar os policiais, adotaram como tática de confronto o uso de bombas incendiárias (coquetéis molotov) e também estilingues – que usam para disparar bolas de gude contra forças de segurança. Os alvos dos estilingues seriam preferencialmente os policiais do patrulhamento regular (e não as unidades de choque), que não possuem capacetes de proteção.
Um policial disse à BBC Brasil que a tática é eficiente pois o estilingue pode causar traumatismo craniano, o usuário não pode ser acusado de usar uma arma e o instrumento pode ser reposto a custos muito baixos.
Imagens
Tanto em São Paulo como no Rio, as polícias tentam usar as imagens gravadas durante protestos – seja por cinegrafistas ou achadas em câmeras apreendidas com suspeitos – para identificar integrantes dos black blocs participando de ações violentas em diferentes protestos. As imagens devem servir ainda como provas no caso de os manifestantes serem indiciados ou denunciados.
No Rio, esse tipo de investigação com uso de imagens deve ser facilitada por uma lei aprovada pela Assembleia Legislativa e sancionada pelo governo que impede o uso de máscaras durante manifestações. Na capital paulista, a Câmara estuda adotar medida semelhante.
Policiais paulistas e cariocas também tentam encontrar o melhor embasamento jurídico para indiciar os manifestantes flagrados cometendo atos de violência e depredação.
Em São Paulo, um delegado indiciou dois manifestantes presos no início do mês com base na Lei de Segurança Nacional, criada durante o regime militar. O argumento não convenceu a Justiça, que determinou a libertação dos manifestantes.
Ainda no Rio, o governo anunciou que manifestantes detidos cometendo atos de violência podem ser indiciados pelo crime de organização criminosa, que em tese pode até render uma pena de oito anos de prisão.
Ação da PM
Na opinião do pesquisador Rafael Alcadipani, especialista em estudos organizacionais da Fundação Getúlio Vargas, apesar das semelhanças nas táticas e abordagens, a Polícia Militar de São Paulo estaria adotando um estilo de resposta às manifestações mais adequado do que o usado pelos policiais cariocas.
"Em São Paulo as bombas de efeito moral estão sendo usadas apenas como último recurso, e os policiais não estão caindo em provocação", afirmou o pesquisador, que entrevistou quase 100 manifestantes que se denominavam black blocs durante a recente onda de protestos no país como parte de seu trabalho de pesquisa.
Segundo ele, a melhor estratégia para lidar com o vandalismo durante protestos e passeatas é tentar abrir canais de diálogos entre os manifestantes e os políticos.
De acordo com o pesquisador, o grupo Black Blocs não pode ser classificado como organização criminosa e tratada como tal.
Ele diz acreditar que, diferente dos criminosos comuns, os black blocs não têm nas ações violentas sua atividade primária, nem obtém vantagens financeiras com suas ações, o que não tornaria adequado classificá-los como uma organização criminosa.
Para Alcadipani, ainda não é possível atribuir um grau elevado de organização aos manifestantes radicais. Ele vê o Black Blocs mais uma forma de protestar, importada da Alemanha e dos Estados Unidos, do que um grupo específico com uma agenda própria.
Nos círculos policiais prevalece o entendimento de que manifestantes presos por vandalismo devem ser combatidos e responsabilizados pelos seus crimes.