Venda de armas e produtos bélicos para o exterior atinge recorde este ano
Fabio Murakawa
De Brasília
As exportações brasileiras de produtos de Defesa baterão recorde este ano e devem atingir a cifra de US$ 2 bilhões. Ministério da Defesa e especialistas afirmam que urna campanha comercial mais incisiva, mudanças na legislação e também as diretrizes da Estratégia Nacional de Defesa (END), criada há pouco mais de urna década, estão contribuindo para a alta dos números neste ano.
Segundo o Ministério da Defesa, as vendas de tanques, aviões, armamentos, munições e sistemas de lançamento de foguetes, entre outros, somaram US$ 1,122 bilhão até o mês de agosto e já superam a cifra de todo a ano de 2019 (USS 1,231 bilhão) e de 2020 (US$ 777 milhões). No ano passado, as exportações tiveram o desempenho afetada par problemas logísticos que dificultaram operações durante a pandemia.
Secretário de Produtos de Defesa do Ministério da Defesa, Marcos Degaut atribui a alta— segundo ele, urna marca histórica — a um trabalho de inteligência e promoção comercial instituído pela pasta nos últimos anos, somado aos reflexos da Lei 12.598 de 2012, que instituiu benefícios fiscais para empresas do setor.
Analistas, além disso, dizem que o pais começa a colher agora os frutos da END, que traçou diretrizes para o setor, incluindo estratégias para a Base Industrial de Defesa (BID) e para as exportações.
O país, afirma Degaut, aumentou sua participação em feiras internacionais a vem adotando uma 'postura mais proativa. A Agência Brasileira de Promoção de Exportações e Investimentos (Apex), por exemplo, passou a ter um núcleo: especifico para produtos de Defesa. Além disso, o pais passou a receber missões compradoras. Os dados deste ano ainda não contabilizam vendas do cargueiro KC-390.
A primeira aeronave desse modelo foi entregue pela Embraer Defesa & Segurança à Força Aérea Brasileira no fim de 2019. Já há encomendas para a venda de aviões para Portugal e Hungria. Lisboa adquiriu cinco cargueiros ao custo de 827 milhões de Euros (num contrato que envolve itens e serviços adicionais, entre eles treinamento e abastecimento em voo). Os húngaros, por sua vez, compraram dois KC-390 a USS$ 300 milhões.
A expectativa é que os negócios rendam cerca de US$ 6 Bilhões nos próximos anos. Colômbia, Argentina, Chile, República Tcheca e Suécia manifestaram a intenção de comprar aa aeronave.
Outro produto-chave na pauta de exportações é o ASTROS, um sistema de lançamento de foguetes produzidos pela AVIBRAS. “Já temos engatilhadas vendas superiores a US$ 1 bilhão para alguns parceiros que eu não posso mencionar agora. Mas é questão de detalhes", afirma Degaut. Segundo o secretário, cada R$ 1 investido traz um retomo de RS 9,2_ Hoje, segundo o secretário, o setor de Defesa, responde por 4„5% do PIB e gera cerca de 3 milhões de empregos no país. A renda média, acrescenta ele, é três vezes a do setor industrial, "que já é bem superior à de outros segmentos".
A indústria da Defesa tem uma particularidade. Atende historicamente à demanda militar, mas acaba transbordando para o mundo civil. Foi assina com a internet, os aparelhos de GPS, os aparelhos de ressonância magnética e tomografia computadorizada, a medicina nuclear, tecidos especiais, o teflon, entre outros.
Degaut foi Secretário Especial de Assuntos Estratégicos {SAE) no governo Michel Temer. É tido em Brasília tomo um técnico qualificado e elogiado por adotar uma postura pragmática ã frente da secretaria, mesmo quando a política externa seguia a linha ideológica do ex-chanceler Ernesto Araújo.
Analistas reconhecem que ele vem tendo um bom desempenho na pasta. Mas dizem que a atual alta das exportações guarda forte relação com políticas e programas adotados nas gestões passadas dos Presidentes Luiz Inácio Lula da Silva (2003 a 2010) e Dilma Rousseff (2011 a 2016).
"Houve de fato urna promoção de exportação, houve um incentivo de exportação da parte de Defesa. Mas esse resultado de recorde de exportação tem muito mais a ver com a END e com os projetos estratégicos de Defesa que começaram em 2008, diz Marcos Barbieri, professor da Unicamp e especialista em indústria Aeroespacial e Defesa. "Não adianta ter promoção comercial se eu não tenho produto. E boa parte dos produtos que o Brasil hoje está exportando é resultado dos programas estratégicos que começaram a partir da Estratégia Nacional de Defesa"
Negócios de Defesa geram dólares e criticas
De Brasilia
A política brasileira de estimular a venda de armas, munições, sistemas de lançamento e veículos militares e de combate gera divisas para o país. Mas também o expõe à críticas. Em julho deste ano, o Comité Executivo de Gestão da Câmara de Comércio Exterior (Camex) editou uma resolução para revogar urna tarifa de 150% sobre as exportações de armas para a Américas do Sul e Central.
A taxa havia sido imposta em 2001, sob a alegação de que boa parte dessas armas exportadas a países vizinhos, como o Paraguai, era depois apreendida em crimes violentos no Brasil. Trata-se de iniciativa que trará enorme impacto negativo à segurança pública, tornando mais vantajoso e barato o tráfico de armas brasileiras", reagiu na época o Instituto Igarapé, especializado em segurança pública.
O secretário de Produtos de Defesa do Ministério da Defesa, Marcos Degaut contesta essa avaliação e defende a revogação como maneira de incrementar as exportações e atrair investimentos. "Dificilmente uma empresa vai se estabelecer no Brasil senão tiver condições de exportar para os nossos vizinhos.
As empresas norte americanas, alemãs, italianas, francesas, belgas, todas exportam para os nossos vizinhos. Por que nós não podemos, argumenta ele. “As armas que são apreendidas não são do Brasil. Não existe essa correlação." Alguns anos atrás, o Brasil apareceu em levantamento da Anistia Internacional em um episódio envolvendo outro tipo de armamento. Equipamentos brasileiros, como bombas de fragmentação lançadas pelo Astros, foram fotografadas pela Anistia no Iêmen em 2015, quando o pais vivia uma guerra civil. Esse tipo de armamento já foi banido em 70 países, devido ao seu potencial mortífero. Em 2012. o professor David Almstadter Mattar de Magalhães, da PUC, relatou que o governo Dilma Rousseff autorizou 12 empresas a negociar armamentos com países suspeitos de violação de direitos humanos ou com presença de organizações terroristas, entre 2011 e 2014.
Entre os clientes, estavam a Líbia, que vivia um conflito entre grupos extremistas após a queda do ditador Muamar Kadafii, Nigéria e Quênia — nestes dois últimos países, havia o temor de que as armas caíssem nas `mãos do grupo terrorista Boko Haram. Magalhães obteve os dados via Lei de Acesso à informação. A época, o Ministério da Defesa afirmou que 'as vendas seguem processo rigoroso de análise e que é exigido do comprador “Certificado de Usuário Final”.
Já o Itamaraty disse, sobre as bombas de fragmentação, que as informações haviam sido denunciadas por ONGs e que a exportadora brasileira nega que as munições citadas por aquelas organizações sejam de sua fabricação".
Degaut afirma ainda que todos os produtos de Defesa exportados seguem "as melhores normas e práticas internacionais", que as reexportações são proibidas e que "é corrente que existam exportações vetadas".
O Filtro inicial é urna avaliação diplomática e política, passa pelo Ministério das Relações Exteriores. Posteriormente, nós temos um filtro militar e geopolítico, que é feito pelo Ministério da Defesa", afirma o secretário. “Toda e qualquer exportação passa por um processo bastante criterioso de qual é o produto, para onde vai, para quem se destina e quais as implicações políticas, militares e diplomáticas da venda desses
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