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RN – Segurança “é guerra permanente”, afirma Faria

Logo que amanhece em Natal, o governador do Rio Grande do Norte, Robinson Faria (PSD) já está a postos no Centro Integrado de Operações de Segurança Pública (Ciosp). De lá não vai sair antes das 2h da madrugada seguinte, numa maratona de trabalho que virou sua rotina nos últimos dias.

Eleito com a promessa de ser "o governador da segurança", Faria, 57 anos, decidiu enfrentar a maior facção criminosa do Estado, o Sindicato do Crime, um braço do Comando Vermelho, do Rio. Com a instalação de bloqueadores de celular no presídio de Parnamirim, há uma semana, uma onda de vandalismo se propagou pelo Estado.

Sem acesso ao Fundo Penitenciário Nacional, cujos recursos estão retidos por conta da crise fiscal, Faria busca saídas para fazer novos investimentos em presídios. "A nossa conta única hoje mal paga o servidor, como vou fazer investimento?"

Ele se recusa a negociar com a facção, diz que não vai recuar e pretende instalar bloqueadores em mais sete presídios. "A segurança vai ser uma guerra permanente". A seguir, trechos da entrevista.

Valor: Como está a rotina do senhor nos últimos dias?

Robinson Faria: Minha rotina mudou totalmente, cancelei tudo. Hoje [ontem] está tendo encontro dos governadores em Brasília e eu não fui. Tenho convite da Presidência para ir à Olimpíada, mas vou ficar de plantão. Cancelei as convenções políticas. Saio daqui do Ciosp [Centro Integrado de Operações de Segurança Pública] todos os dias às 2h.

O sr. já esperava enfrentar esse tipo de problema quando decidiu colocar os bloqueadores?

Faria: Esperava, mas a intensidade é muito subjetiva. Ninguém sabe o poder que esse povo tem, financeiro, de articulação. A segurança pública do Brasil está tão frágil que não se sabe o quando esse povo está capitalizado, quantos seguidores tem, ninguém tem essa contabilidade. Você acaba tendo que ir para o enfrentamento. Na área de segurança do Rio Grande do Norte, a gente estava fazendo tudo, ações policiais, blitze, mas a doença estava dentro dos presídios. Um dia a doença iria matar o Estado.

Todos os Estados passam por restrições financeiras hoje. Isso tem prejudicado a segurança?

Faria: Claro, tudo depende de dinheiro. O governo federal tem bastante dinheiro acumulado no Fundo Nacional Penitenciário, que só está servindo para superavit primário. Esse dinheiro também é dos Estados, para construir novos presídios, abrir vagas, reformar o que foi destruído em rebeliões. A parte prisional está entrelaçada na segurança pública. Esse dinheiro seria fundamental. A nossa conta única hoje mal paga o servidor, como vou fazer investimento?

Qual o déficit de vagas no sistema prisional do Estado hoje?

Faria: Estimamos em 2.500 vagas. Pretendo fazer até 2 mil até o fim do meu mandato. Se vier dinheiro federal, faremos mais.

Quanto é necessário de investimento para isso?

Faria: Somando as nossas pequenas economias, vamos investir algo em torno de R$ 50 milhões para construir 1.500 vagas. Isso fora o presídio novo que está sendo feito [de Ceará-Mirim], que terá mais 600 vagas e tem recurso assegurado.

O que se sabe hoje sobre o Sindicato do Crime?

Faria: O que sabemos é que o Sindicato do Crime é do Rio Grande do Norte, mas é uma célula do Comando Vermelho. Todos os presos são do Sindicato do Crime. O principal, João Mago, prendemos ontem e Daniel Silva Carvalho, segundo homem na hierarquia, também está preso, foram para presídios federais. Isso começa a enfraquecer o movimento. Lógico que no crime sempre vai aparecer alguém, mas até que se encontre um novo líder, demora um pouco.

Houve algum tipo de negociação com o Sindicato do Crime?

Faria: Nunca. Eles tentaram, mandaram recado. Eu proibi, disse que o Estado não negocia. E o Estado não vai recuar. Quero terminar de instalar os bloqueadores em no máximo 90 dias.

O senhor se elegeu com o mote da segurança. Essa é sua prova de fogo?

Faria: Essa cobrança comigo, relacionada à segurança, é permanente. Cada vez que tem uma morte, um assalto, a população questiona "onde está o governador da segurança?" Nenhum governo nunca tinha tido coragem para esse enfrentamento.

O Ceará começou e recuou, Pernambuco também. Só que no nosso Estado a população está dando apoio ao governo. Qualquer pesquisa que você fizer hoje vai mostrar que 80% do povo quer segurança. Quando assumi, tinha fim de semana de ter 20 mortes em um único bairro em Natal. Devolvi a autoestima dos policiais, fazendo um sacrifício enorme para promover mais da metade do efetivo da Polícia Militar.

Quais investimentos foram sacrificados por causa disso?

Faria: Com esse dinheiro, muita coisa eu poderia estar fazendo no campo da infraestrutura, novas estradas, obras de cartão postal para área do turismo. Mas priorizei a vida das novas gerações.

Os ataques diminuíram depois de um fim de semana agitado. A situação está sob controle?

Faria: Nunca no Brasil vamos poder dizer que está tudo sob controle. O que podemos dizer é que há avanços. Na hora que quebrarmos o instrumento de trabalho nos presídios vamos ter um novo padrão de segurança. Agora nada impede que os criminosos se organizem aqui fora. A segurança vai ser uma guerra permanente.

Como vai ser a atuação das Forças Armadas?

Faria: Pedi ao ministro Raul Jungman [Defesa] que deixasse as Forças Armadas aqui até o governo terminar de instalar os bloqueadores. Vamos colocar o Exército nos principais corredores de ônibus, que passam por hospitais, aeroporto e a parte de turismo.

Os rios e as pontes ficam sob proteção da Marinha. São homens da divisão da Garantia da Lei e da Ordem, a GLO, especializada em momentos de crise. É a mesma que já atuou lá no Rio de Janeiro na favela da Maré e no Alemão. Quem comandava as ações na época, inclusive, era o nosso secretário de Segurança, Ronaldo Lundgren.

Forças Armadas chegam a Natal para reforçar combate a ataques¹

Tropas das Forças Armadas chegaram hoje (3) a Natal (RN) para auxiliar a polícia na segurança e combate aos ataques a ônibus e prédios públicos que ocorrem desde a última sexta-feira (29) em cidades do interior do Rio Grande do Norte e na região metropolitana da capital. O ministro da Defesa, Raul Jungmann, vai amanhã (4) ao estado para definir com as autoridades locais as ações de cooperação dos militares. Cerca de 1.200 homens do Exército e da Marinha atuarão no Rio Grande do Norte até 16 de agosto.

Segundo a Secretaria de Segurança Pública e Defesa Social (Sesed), 85 pessoas já foram detidas suspeitas de envolvimento nos ataques. No total, foram registradas 92 ocorrências, entre incêndios, tentativas de incêndios, disparos contra prédios públicos e proximidades, depredações e uso de artefatos explosivos; 29 veículos, entre ônibus e micro-ônibus foram incendiados.

As ocorrências foram registradas em 31 cidades. Hoje (3), o secretário da Sesed, Ronaldo Lundgren, visitará algumas cidades com as forças de segurança para analisar a necessidade de reforços no interior do estado. Segundo a Sesed, na capital “a situação está mais tranquila”, já no interior, houve mais tentativas de vandalismo.

Retaliação

As ações criminosas são uma retaliação à instalação de bloqueadores de celular no Presídio Estadual de Parnamirim (PEP), em Natal. Segundo o governo do estado, outros bloqueadores de sinal serão instalados em unidades prisionais.

“A população tem apoiado o governo porque toda essa ação [dos ataques] começou a partir de medidas de controle. Eles [os criminosos] estão incomodados. Mas o governo não vai recuar e isso tem sido aprovado pela população mesmo diante dos ataques que estão sendo registrados”, disse assessor de Comunicação da Sesed, capitão Christiano Couceiro.

Ele informou que os serviços públicos estão funcionando normalmente na capital, mas com reforço de policiamento nos 23 terminais de ônibus, corredores de transporte público, escolas e presídios. A atuação das Forças Armadas só será detalhada após a visita do ministro Raul Jungmann, mas, segundo a secretaria, as forças federais devem ocupar esses lugares nas ruas para que a polícia local foque nas investigações e combate direto aos criminosos.

Redes Sociais

Couceiro pediu ainda que a população não compartilhe áudios, imagens e mensagens de texto relacionadas a atos criminosos, mesmo que elas sejam verdadeiras. “Essa propagação e o pânico da população também são armas utilizadas [pelos bandidos] nesse momento”, disse, orientando que as mensagem sejam encaminhadas para o Disque Denúncia Whatsapp da Sesed pelo (84) 98149-9906.

¹com EBC/Agência Brasil – Andreia Verdélio

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