Julia Lindner
O Globo
21 Março 2021
BRASÍLIA – Ex-ministro do governo Jair Bolsonaro, o general Alberto Santos Cruz avalia não haver motivo plausível para as trocas dos comandantes do Exército, da Marinha e das Forças Armadas, a menos que tenha sido por "mania pessoal" do presidente Jair Bolsonaro. Para Santos Cruz, qualquer tentativa de politização das Forças Armadas representa uma subversão da hierarquia e da disciplina da instituição. "Forças Armadas não são ferramentas para fazer pressão política, ferramentas para você utilizar no jogo político, não é para isso. Forças Armadas têm uma destinação constitucional", afirmou ao GLOBO.
Ele também criticou a forma como os comandantes foram demitidos, dizendo que foi um desrespeito e uma ofensa aos militares. Na visão dele, a reforma ministerial é normal, mas "não tem nada a ver com comandante militar". "Comandante militar não faz parte dessa primeira camada política. Eles não fazem parte, são elementos operacionais, com uns 40, quase 50 anos na sua profissão. E aí é exonerado no mesmo nível de uma camada política, sem nenhuma explicação. Isso aí é falta de consideração pessoal e funcional.
Existem sinalizações de que o presidente Bolsonaro já estava insatisfeito com as Forças Armadas, especialmente com o comandante do Exército. O senhor acha que existiam conflitos anteriores?
Minha pergunta é a seguinte, (Bolsonaro) estava insatisfeito por quê? O que está acontecendo de errado no Exército? Nada. Só se for pelo seu gosto pessoal, a sua mania pessoal. Aí é outra coisa. Os comandantes das Forças estavam cumprindo com as funções deles, de acordo com a Legislação. São pessoas que vêm de dentro da instituição. Cada um daqueles lá tem quase cinquenta anos dentro da sua instituição. Cada um daqueles passou por dezenas de avaliações dentro da sua instituição. É completamente diferente de um ministro, que pode ser de fora daquele órgão, mas os comandantes militares, não.
É plausível a justificativa de que a troca ocorre apenas por causa da mudança no Ministério da Defesa?
A reforma política é normal, vários governos fazem, mas não tem nada a ver com comandante militar. Comandante militar não faz parte dessa primeira camada política. Eles não fazem parte, são elementos operacionais, com uns 40, quase 50 anos na sua profissão. E aí é exonerado no mesmo nível de uma camada política, sem nenhuma explicação. Isso aí é falta de consideração pessoal e funcional.
Esse tipo de demissão ocorreu em outros casos no governo, inclusive no do senhor…
No meu caso eu não dou bola, pessoalmente eu não dou bola. O problema é a falta de consideração institucional. Isso é um desrespeito, uma ofensa ao Exército, à Marinha, à Aeronáutica.
E com essa mensagem que o general Fernando Azevedo deixou ao sair, de que o papel das Forças Armadas é de Estado, o senhor avalia que houve uma pressão do presidente para ir além disso de alguma forma?
Não sei, acho que é uma mensagem bem institucional, onde ele destacou, resumiu qual foi o esforço dele, o perfil institucional das Forças Armadas. Isso não quer dizer tecnicamente que tenha havido uma tentativa de quebrar isso daí. Uma tentativa de quebrar isso daí é a politização das Forças Armadas e a subversão da coesão necessária para as Forças. As Forças Armadas não são um órgão de governo, são um órgão de Estado, instituição de Estado. Qualquer tentativa de politização é subversão da hierarquia, da disciplina que tem que ter… Forças Armadas não são uma ferramenta para fazer pressão política, ferramenta para você utilizar no jogo político, não é para isso. Forças Armadas têm uma destinação constitucional.
O senhor acha que existe um desgaste que vem de mais tempo entre as Forças Armadas e o presidente Jair Bolsonaro?
Não vejo desgaste nenhum. Desgaste por quê? As Forças Armadas estavam cumprindo o seu papel, estão cumprindo o seu papel de acordo com a Constituição. Não tem razão nenhum para se supor desgaste.
… E divergências dos comandantes com o presidente Bolsonaro?
Não…
Talvez não tinha um alinhamento da forma como o presidente gostaria?
Não tem que ter alinhamento nenhum
. Ela tem uma destinação constitucional, tem que cumprir a função constitucional dela. Alinhamento é conversa fiada.