Silvia Amorim
SÃO PAULO – Especialistas ouvidos pelo GLOBO divergiram sobre as possíveis causas para o aumento do registro de armas por civis nos últimos anos. Eles apontaram várias hipóteses para o fenômeno, mas destacaram que ainda não há um diagnóstico preciso e que o assunto precisa ser estudado.
Para alguns deles, o crescimento da compra de armas por cidadãos comuns pode ser uma reação ao recrudescimento da violência.
– Hoje, o cenário é propício para isso. De um lado, você tem uma ação do governo muito fraca no sentido de divulgação de campanhas para o desarmamento. Do outro lado, os crimes continuam ocorrendo, muitas vezes bárbaros, chocando a população. O que isso passa? Medo, e a sociedade se arma. Como a polícia parece cada vez menos preparada, fica difícil pregar o desarmamento – afirma o coordenador do Programa de Controle de Armas de Fogo do Movimento Viva Rio, Antônio Rangel.
Ele afirma que a partir de 2008 as campanhas de desarmamento promovidas pelo Ministério da Justiça perderam muito da eficácia ao concentrar nas instituições policiais os postos de entrega.
– Na campanha de 2004 existiam mais de 600 entidades da sociedade civil, entre ONGs e igrejas, participando da coleta de armas. Você tinha toda essa rede mobilizada. Era o padre na missa falando da importância do desarmamento, o pastor no culto, os maçons em suas reuniões. Isso parou. A população não tem estímulo para entregar armas para a polícia – diz Rangel.
O Ministério da Justiça informou que todo ano faz uma campanha publicitária sobre o tema. A pasta alegou que, por questões financeiras, a ação veiculada na TV e no rádio não fica no ar por muito tempo. Segundo o ministério, o governo conta com a mídia espontânea para essa conscientização.
Líder do movimento em defesa das armas, o Viva Brasil, Bene Barbosa diz que o cidadão comum busca numa arma a segurança que o governo deveria garantir.
– A gente tinha uma sensação de que isso pudesse estar acontecendo. O aumento da crueldade dos criminosos gera insegurança. A maioria dessas pessoas compra arma para defender sua mulher e filhos.
Diretora do Instituto Sou da Paz, Melina Risso diz que os dados revelados pelo GLOBO preocupam. Para ela, o aumento da entrada de armas novas no país não desmoraliza o Estatuto do Desarmamento.
– Demanda por armas sempre vai haver. A lei prevê que as pessoas podem comprar e ter arma dentro de casa. Agora, existem regras.
Professor da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, Denis Rosenfield discorda:
– O estatuto caiu em descrédito – diz.
Melina chama atenção para os números de Bahia, Espírito Santo e Mato Grosso, onde o volume de armas registradas explodiu a partir de 2008:
– Isso deixa dúvida sobre se as regras do estatuto estão sendo respeitadas na hora de conceder o registro de uma arma.
Ela aponta ainda outra hipótese para o aumento:
– Em 2009 acabou o prazo para a anistia de armas irregulares. Talvez muita gente tenha desistido de regularizar e optou por adquirir uma nova.
Para Daniel Cerqueira, do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), os dados, embora oficiais, podem não retratar a realidade.
– Como somente a partir de 2004 o sistema passou a ser alimentado obrigatoriamente com os dados de registro de armas, é grande a possibilidade de subnotificação dos números antes desse período.