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Crise em presídio no Maranhão reflete problema nacional crônico

A violência que tomou conta do presídio de Pedrinhas, no Maranhão, reflete um problema que atinge todos os estados do Brasil. E revela a dificuldade de um sistema – dono da quarta maior população carcerária do mundo – em cumprir o seu papel de ressocializar infratores.

Após a divulgação das imagens de presos decapitados durante uma rebelião no presídio maranhense, a ONU pediu nesta quarta-feira (08/01) uma investigação para identificar os responsáveis e apelou a que a ordem seja instaurada em penitenciárias de todo o país. Só em 2013, 59 detentos foram mortos em Pedrinhas devido a rebeliões e confrontos entre facções criminosas.

"Os crimes de Pedrinhas são parte de um problema muito mais amplo de violência e caos nas prisões do Maranhão, que reflete um problema crônico no sistema carcerário brasileiro como um todo, em maior ou menor proporção, dependendo do estado", afirma Maria Laura Canineu, diretora da Human Rights Watch (HRW) no Brasil.

A superlotação e as condições de detenção agravam a situação no complexo de Pedrinhas, dominado por presos de facções criminosas. Construído para receber 1.700 presos, o local abriga atualmente 2.500. Desde 2007, mais de 150 pessoas foram assassinadas em presídios do Maranhão.

A violência praticada entre os detentos atinge também seus familiares. Há denúncias de que mulheres e irmãs de presos estariam sendo estupradas durante as visitas para evitar a morte de seus parentes encarcerados.
 

Sistema esgotado

A superlotação das prisões não é somente uma realidade maranhense – o problema atinge todo o país. Os últimos dados sobre a população carcerária no Brasil apontam que há mais de 500 mil presos e pouco mais de 300 mil vagas em presídios.

A situação é especialmente agravante na pior penitenciária do Brasil, segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ), a Aníbal Bruno, em Pernambuco, onde 4.493 presos estão confinados em 1.448 vagas. No local há denúncias de violações de uma série de direitos civis e humanos, como insalubridade e falta de atendimento, além de homicídios e torturas.

Outro exemplo é o Presídio Central de Porto Alegre. No final do ano passado, a Corte Interamericana de Direitos Humanos da Organização dos Estados Americanos (OEA) notificou o governo brasileiro a adotar medidas para garantir a integridade dos presos do complexo gaúcho, construído para receber 1.984 pessoas, mas que atualmente abriga 4.591.

"É um barril de pólvora. Presos são brutalizados e essa violência se volta contra a própria sociedade. A máquina penitenciária brasileira desumaniza as pessoas, que depois são jogadas para a sociedade sem nenhum tipo de política pública, em relação a emprego, além de serem estigmatizadas. O índice de reincidência é altíssimo", diz Alexandre Ciconello, da Anistia Internacional no Brasil.

Além da precariedade da condição carcerária, a omissão do Estado no combate à atuação de facções criminosas dentro dos presídios e a corrupção de agentes penitenciários, que facilitam a entrada de armas e celulares, contribuem para a difusão da violência dentro das prisões espalhadas pelo país.
 

As cenas do Maranhão se repetem pelo país. Em 2002, o palco da chacina foi o presídio Urso Branco, em Rondônia, onde na noite do dia 1° para o dia 2 de janeiro 27 pessoas foram assassinadas. Entre 1998 e 2007, pelo menos 98 assassinatos foram registrados no local.

Fatores múltiplos

Em 2000 eram 230 mil presos para 185 mil vagas. De lá para cá houve um esforço dos governos para ampliar o número de vagas no sistema carcerário do país, que foi quase duplicado. Mas, em contrapartida, ocorreu um aumento de mais de 50% no número de presos.

"Foram construídos muitos presídios nos últimos anos. O problema não é a falta de presídios, mas a política de encarceramento. A cultura judiciária e do Ministério Público ainda vê na pena de prisão a principal forma de solução dos problemas sociais", afirma Eduardo Baker, da ONG Justiça Global.

Especialistas apontam a revisão de processos e mutirões para verificar a situação de presos como medidas para reduzir a população carcerária. Atualmente, 40% dos presos aguardam julgamento. A grande maioria poderia esperar o processo em liberdade. Muitos são inocentes. Além disso, o CNJ apontou que 18% estão presos em situação ilegal, ou seja, já deveriam ter sido libertados ou teriam direito a progressão de pena.

Outras medidas que reduziriam significativamente o número de presos são a aplicação de penas alternativas e a descriminalização de algumas condutas. "A guerra às drogas tem um impacto na superlotação do sistema penitenciário – 25% estão presos por crimes relacionados a drogas e até usuários acabam sendo enquadrados como traficantes", afirma Ciconello.

Além da redução no volume carcerário, a aplicação de recursos para melhorar a infraestrutura de presídios; o combate à corrupção de agentes penitenciários e à atuação de facções criminosas; e a investigação de crimes ocorridos dentro das prisões são aspectos fundamentais para que o Estado retome o controle sobre esse sistema e para a redução da violência.

"Recuperando esse controle, o próprio sistema prevê a possibilidade de diminuir a violência por meio do trabalho e da educação", reforça Canineu.

 

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