- Leandra Felipe
Um projeto desenvolvido na Colômbia treina ratos de laboratório para encontrar minas terrestres, enterradas em áreas que cobrem mais de 70% do território do país.
Como os roedores são extremamente leves, eles não detonam os explosivos com o peso do próprio corpo, podendo substituir cães e homens na tarefa de encontrar as minas antipessoais.
O estudo, iniciado há quatro anos no Laboratório de Comportamento Animal da Escola de Pós-Graduação da Polícia Nacional da Colômbia, em Bogotá, mostra que os camundongos precisam treinar por três meses até ficar aptos a encontrar as minas.
A veterinária Luisa Fernanda Méndez, idealizadora do projeto, disse à BBC Brasil que a ideia surgiu com a necessidade de acelerar o processo de desativação de minas na Colômbia, primeiro colocado no ranking de minas terrestres depositadas no mundo.
"Existem explosivos e bombas enterradas em 78% do território colombiano e, como ratificamos a Convenção de Ottawa (que proíbe minas terrestres), temos de avançar na missão de desativar as minas no país", diz Luisa.
Atualmente, segundo ela, este trabalho é feito por cães policiais treinados e por militares, que muitas vezes detonam os artefatos somente ao tocá-los, e acabam feridos ou mortos.
Entre 2006 e 2010, 23 cães e 220 soldados foram mortos ou feridos pelas minas. Assim, Luisa tomou como exemplo uma pesquisa realizada com roedores da Tanzânia, usados para encontrar bombas, para criar uma opção para desativar os explosivos.
Ela afirma que o modelo não deu certo no país africano devido ao peso dos roedores, que tinham em média 750 gramas – um artefato pode ser ativado com mais de 500 gramas de contato por pressão ou arrastamento.
"Começamos a pensar em um animal capaz de seguir instruções e de rastrear. Tentamos ratos silvestres, mas devido à cor, os perdíamos facilmente no ambiente natural. Depois tentamos gatos, mas obtivemos êxito com os ratos brancos", diz.
"Em média, (os camundongos) encontram as minas em 86% das buscas, sendo que alguns alcançam a marca de 95% de acertos e não detonam os explosivos porque pesam cerca de 450 gramas", afirma Luisa.
Socialização
O trabalho de adestrar os ratos para encontrar as minas já começa nas primeiras horas de nascimento. Luisa e seu assistente, o subtenente Erick Guzman, participam de todo o processo e colocam nomes nos ratinhos já nas suas primeiras horas de vida.
"Nós os chamamos pelos nomes – Sofia, Matteo e Paco, por exemplo – e ficamos em contato direto, para que se acostumem aos seres humanos", diz a veterinária.
Além disso, o laboratório tem dois gatos, que no início foram usados para "demarcar território" e impedir a entrada de outros gatos que vivem nas redondezas e que entravam no local para atacar os ratos. A integração entre os felinos e os ratos é tão grande que eles também participam das atividades de treinamento dos pequenos filhotes.
"O ambiente é o mais adaptado possível às condições externas, e os ratinhos fazem visitas aos escritórios do centro de treinamento para se socializar. Esse é o primeiro passo para que eles não se sintam estressados ou desconfortáveis", diz a pesquisadora.
Treinamento
A primeira parte do treinamento é feita com os filhotes em labirintos dentro do laboratório e depois em campo aberto. A etapa seguinte é feita em campo aberto, em um ambiente simulado.
Os camundongos são treinados para encontrar os sete tipos de artefatos e explosivos mais comuns na Colômbia. Os roedores são ensinados a buscar as minas por meio de comandos de voz. "Isso é feito a até 10 metros de distância entre nós e os ratos, o ideal para ter segurança na atividade no ambiente real", diz a veterinária.
Segundo ela, quando os camundongos encontram a mina, ficam quietos e esperam pela recompensa: um torrão de açúcar. Quando os ratos encontram as minas, segundo Luisa, as equipes especializadas têm uma média de 4 a 5 minutos para desarmar os artefatos. A primeira experiência com minas ativas e em ambiente real será feita em dezembro deste ano.
Bem-estar animal
A veterinária brasileira Ekaterina Botovchenco Rivera, membro ad hoc da Organização Mundial de Saúde Animal (OIE), considera este trabalho um bom exemplo.
"A balança tem que estar em quase equilíbrio, pesando mais para o bem-estar dos animais. Aqui nós vemos a busca desse bem-estar, na proposta de substituir o cão, que sofre, por outra espécie que poderá não ser vitimada", disse Rivera à BBC Brasil.
A especialista também elogiou o modo como é realizado o treinamento, por meio da recompensa positiva, fazendo com que os animais colaborem de forma espontânea.