GUSTAVO PATU
DE BRASÍLIA
Publicado 06 ABR 2016
Dados publicados pelo Banco Central dão dimensões precisas à explosão das manobras conhecidas como pedaladas fiscais no governo Dilma Rousseff.
As pedaladas — o uso de dinheiro dos bancos federais em programas de responsabilidade do Tesouro Nacional — são a base do pedido de impeachment contra Dilma.
Os números do BC põem em xeque a tese principal da defesa da presidente, segundo a qual seus antecessores também adotaram a prática.
Por determinação do TCU (Tribunal de Contas da União) o BC calculou os atrasos em repasses do Tesouro aos bancos federais e ao FGTS (Fundo de Garantia do Tempo de Serviço) desde 2001, no governo FHC.
Os valores mostram uma tendência de alta a partir do final do governo Lula e uma disparada sob Dilma.
Ao final do governo tucano, a conta do Tesouro a ser saldada com seus bancos era de R$ 948 milhões — em outras palavras, esse era o valor que, no atual entender do TCU, deveria ser acrescentado à dívida pública.
Ao final do ano passado, a conta se aproximava dos R$ 60 bilhões, finalmente pagos, por determinação do tribunal, em dezembro.
Dilma já argumentou que a diferença de valores está relacionada à expansão da economia brasileira e do Orçamento da União desde a década passada. Mesmo levando em conta os cenários diferentes, a discrepância de valores permanece.
Entre 2001 e 2008, o impacto das pedaladas na dívida pública oscilou, sem tendência definida, entre 0,03% e 0,11% do PIB (Produto Interno Bruto, medida da riqueza nacional); a partir de 2009, o crescimento é contínuo, até chegar ao pico de 1% do PIB.
CRIME OU NÃO
A escala das cifras é importante em uma discussão crucial em torno do processo de impeachment — se a presidente cometeu ou não crime de responsabilidade.
O Tesouro repassa regularmente recursos a seus bancos para a execução de programas de governo. A Caixa Econômica Federal, por exemplo, paga o Bolsa Família, o seguro-desemprego e benefícios previdenciários.
Eventualmente, os repasses são insuficientes para os pagamentos. Nesses casos, os bancos usam recursos próprios para manter os programas em funcionamento, e o dinheiro é ressarcido depois pelo Tesouro.
Ao reprovar as contas do governo de 2014, o TCU considerou ter havido, na prática, empréstimos dos bancos federais ao Tesouro, o que é crime previsto na Lei de Responsabilidade Fiscal. Para o governo, os atrasos eram práticas normalmente aceitas.
CONTAS MAQUIADAS
A legislação proíbe empréstimos de bancos a seus controladores porque a transação dá margem a fraudes: o banco terá óbvias dificuldades em cobrar a dívida e o controlador poderá se valer de dinheiro que pertence a correntistas e poupadores.
No caso do governo, a acusação é que as pedaladas serviram para maquiar a escalada insustentável das despesas do Tesouro — só depois da reeleição de Dilma, o governo admitiu que fecharia o ano de 2014 no vermelho.
É visível que o uso do expediente ganhou novos patamares a partir de 2009, quando a administração petista reagiu aos efeitos da crise internacional com o aumento do crédito e do gasto público.
Naquele ano, foram lançados o Minha Casa, Minha Vida e o PSI (Programa de Sustentação do Investimento), pelo qual o BNDES, banco oficial de fomento, passou a conceder financiamentos a taxas favorecidas.
O Tesouro deveria arcar com os subsídios dos dois programas, para evitar prejuízos da CEf e do BNDES. No entanto, o repasse desses recursos foi sendo sucessivamente postergado. O mesmo aconteceu com os subsídios do crédito agrícola, operado pelo Banco do Brasil.
O volume crescente de pagamentos em atraso passou a chamar a atenção de analistas, mas só foi condenado pelo TCU no exame das contas de 2014. A Folha questionou o Planalto sobre os dados do BC, mas não houve resposta até a conclusão desta edição.
Nota DefesaNet
Observar que o crescimento das pedalas fiscais segue o mesmo compasso com as pedaladas nos projetos de defesa. Em especial nos Projetos Estatégicos de Defesa, que tiveram crescimento acentuado a partir de 2010.
O Editor