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‘O crime na Amazônia compensa’, afirma advogado da Pastoral da Terra

“Desde o massacre de Eldorado do Carajás, mais de 800 assassinatos foram cometidos no Pará. Apenas oito pessoas foram condenadas, porém, apenas uma está presa”, lista o advogado José Batista Afonso a estudantes de Comunicação da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Membro da coordenação nacional da Comissão Pastoral da Terra (CPT), ele fez sua quarta visita à cidade carioca para apresentar sua versão sobre os conflitos agrários na Amazônia e defender as ações da entidade que representa, ligada a Confederação dos Bispos do Brasil (CNBB).

“A lei não assusta ninguém por lá, é um festival de impunidade”, prossegue diante dos estudantes. “Atualmente, 30 pessoas estão na lista de ‘marcados para morrer’”, continua. “Essa violência tem causa, os registros são claros: onde estão as fronteiras de expansão do capital e do agronegócio concentram-se, também, os conflitos no campo”.

A universitários que perguntam se a “ausência do poder público” é a causa de tanta violência no Pará, Batista responde em tom didático: “Não, o Estado é presente. Mas para beneficiar um lado”, opina, para, em seguida, dar exemplos. “As principais obras previstas no PAC (Plano de Aceleração do Crescimento) estão centradas justamente na Amazônia. O conjunto de hidrelétricas pensadas e em processo de construção está na Amazônia; a expansão do setor ferroviário também segue em direção à Amazônia; asfaltamento de rodovias, construção de portos e uma série de outros empreendimentos se concentram na Amazônia”.

Criação de gado
No alvo das críticas do advogado também figura a criação de gado: “Cresce em direção à Amazônia e isso ocorre porque campos de pastagens tradicionais, como por exemplo, os de Mato Grosso do Sul, Goiás e outros estados do Centro-Oeste, estão sendo usados para a produção de grãos. Onde havia gado, agora há soja e cana de açúcar. E o rebanho bovino está sendo empurrado em direção à Amazônia”.

Batista ressalta que é numa área conhecida como Floresta da Terra do Meio, onde está o Parque Nacional Serra do Pardo, “que está sendo registrado o maior crescimento da pecuária extensiva e da exploração ilegal de madeira” no Pará.

O parque, de 445 mil hectares, é considerado pelo Programa Nacional de Diversidade Biológica (Pronabio) uma das áreas prioritárias para conservação da biodiversidade da região. Ele foi criado em 2005, pelo governo federal, como forma de frear o desmatamento no sul do Pará.

“Na região da Floresta do Meio estão em andamento obras da hidrelétrica de Belo Monte, pavimentação de rodovias e construção de portos. E isso é para quê? Para melhorar a vida dos ribeirinhos? Para melhorar a qualidade de vida dos indígenas?", questiona. "Não, é para criar as condições para a expansão de setores ligados à mineração e ao agronegócio. Em Marabá e nos municípios do entorno, temos em funcionamento e em processo de implantação 15 gigantescos projetos de exploração. A gente continua no papel de fornecedor de matéria prima para o restante do mundo”, avalia. “Isso contrasta com o discurso de preservação e de garantia de direito das populações que ali residem”, conclui, voltando a atribuir a essas ações as causas das mortes no Pará.

Críticas ao Código Florestal
“A previsão de futuro não é animadora. Está em curso no Congresso Nacional uma série de medidas para facilitar a expansão de setores ligados ao agronegócio em direção à Amazônia. Basta ver as alterações do Código Florestal. Uma das propostas, como se sabe, é a de perdoar todos aqueles que cometeram crimes ambientais até 2008”, opina diante de estudantes.

Além de críticas à anistia aos desmatadores, Batista também faz coro com os que defendem o veto a propostas que reduzem áreas de reserva legal e preservação permanente na região. “A Comissão Pastoral da Terra no Pará tem estudos que mostram que mais de 30 milhões de hectares de terra foram grilados na região. E o governo Lula o que fez? Editou a medida provisória 458, que permitiu que essas terras fossem regularizadas em nome de criminosos”, ataca e recebe apoio dos presentes ao auditório da ECO, a Escola de Comunicação.

Apelidada de “MP da Grilagem” por ambientalistas, a MP 458, foi editada pelo ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva em 2009 depois de duros embates entre a bancada ruralista, que apresentou a proposta, e parlamentares verdes, como a ex-senadora Marina Silva.

O texto instituiu mecanismos para viabilizar a regularização fundiária de ocupações exercidas por pessoas físicas ocupantes de pequenas e médias porções de terras da União. Entre as exigências ambientais da nova lei está a necessidade de comprovar que as áreas foram ocupadas pacificamente e cumprem função social.

“Na prática essa lei funciona assim: o grileiro, que para quem não sabe é aquela pessoa que vai no cartório, faz uma mutreta e, num passe de mágica vira dono de terrenos, pode regularizar até 1.500 hectares de terra. A parte excedente, caso haja, pode ser regularizada por uma pessoa que ele indicar, uma vez que o governo não exige que se more na terra. Depois de três anos, ele tem autorização para vender essa terra. Aí, os laranjas saem de cena e as grandes grilagens se consolidam”, finaliza, para depois responder, durante cerca de 20 minutos, a perguntas dos estudantes.

Em seguida, Batista é novamente abordado para gravar uma entrevista para a TV universitária local em que explica sua tática de ação.

“A gente vive tentando juntar forças com quem comunga com essas ideias. Se a gente não conseguir mudar isso a curto prazo, a gente vai metendo umas “cunhas” (gíria amazonense que significa “garras”) para dificultar a expansão mais violenta do processo”, conclui.

O advogado da CPT esteve no Rio no último dia 17 a convite da ONG AfroReggae. O ativista gravou um dos programas “Trilogia da Terra”, que compõe a quarta temporada do programa “Conexões Urbanas”, exibido no canal a cabo GNT.

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