André Luís Woloszyn
Analista de Assuntos Estratégicos
alwi.war@gmail.com
O Afeganistão e o retorno do Talibã
Após um longo período de ocupação e permanência de tropas norte-americanas no Afeganistão, que perdurou por duas décadas, a situação do país em relação ao domínio do grupo fundamentalista Talibã vem crescendo perigosamente uma vez que este já controla 85% do território afegão, embora em regiões de pouca densidade demográfica. Livres dos ataques das forças da OTAN e com poucos militares norte-americanos ainda presentes, a tendência é de fortalecimento dos grupos extremistas que operam a partir deste território, apoiando e treinando outros grupos para atuação em diferentes países.
Contudo, mesmo com a presença estadunidense, o Talibã sempre esteve ativo, realizando atentados de baixa intensidade em diferentes regiões, fustigando psicologicamente as tropas governamentais e parcela da população que consideram apoiadores dos EUA e do governo imposto por estes, acarretando uma nova onda de refugiados em direção a Turquia e Irã.
Recentes documentos de inteligência apontaram que o grupo realizava operações sigilosas na Índia, em especial, na região da Caxemira, sob apoio e coordenação do Serviço de Inteligência Paquistanês (ISI), o mesmo que protegia Osama Bin Laden e que tem no grupo, um importante aliado para suas operações encobertas na região.
Os impérios derrotados pelos afegãos ao longo da história: Roma, Britânico, Soviètico e Americano
No momento em que os EUA se aproxima da Índia e se distancia do Paquistão, o Talibã vem mantendo relações com o governo Chinês, cuja intenção é utilizar sua influência para neutralizar os constantes ataques de grupos extremistas islâmicos oriundos das fronteiras afegã contra a província de Xinjiang, em especial, do Movimento Islâmico do Turquestão Oriental (ETIN).
No encontro, realizado em 28 de julho, o Ministro das Relações Exteriores Chinês ratificou a importância do Talibã na pacificação do Afeganistão e no processo de reconstrução da infra-estrutura afegã completamente destruída por longos períodos de invasões externas e conflitos internos entre etnias.
A perspectiva é de que o Afeganistão retorne a ser um governo teocrático e o Talibã obtenha apoio para se consolidar legitimamente como uma força militar e política. Os gastos de bilhões de dólares e mais de 4.500 militares estadunidense mortos, somado a 100 mil civis afegãos entram para a história como efeitos colaterais indesejados de uma guerra prolongada e infrutífera.
O retorno do Talibã se constitui em um duro golpe no combate ao terrorismo internacional e representa, simbolicamente, para futuros grupos extremistas, o exemplo da possibilidade real de vencer uma guerra a longo prazo contra o ocidente.
A instabilidade política no Iraque
A exemplo do Afeganistão, o Iraque vive uma crise econômica e social prolongada, acarretando grave instabilidade política em um cenário similar ao que possibilitou o surgimento do grupo terrorista Estado Islâmico (ISIS). Naturalmente, por força da guerra prolongada, não há infra-estrutura no país, a população vive em estado de miséria e não possuem nenhum tipo de apoio da comunidade internacional.
Em consequência, cresce a insurgência contra a ocupação estadunidense e ainda persiste, na memória popular, a humilhação sofrida pelos iraquianos, em especial, na prisão de Abu Ghraib. É verdade que o ISIS se enfraqueceu e reduziu a quantidade e a frequência de seus atentados, contudo, permanece ativo na região do Oriente Médico e, especialmente, na África, assim como intensificou sua tática de propaganda massiva e marketing de recrutamento na Deep Web.
Mantida a atual conjuntura no Iraque, é alta a probabilidade de que possam se reagrupar e retomar a prática de atentados, face as diferenças políticas e ideológicas dos vários grupos que atualmente governam o país.
Em cenário similar ao do Afeganistão, com a retirada das tropas norte-americanas, o governo não deverá resistir por muito tempo as investidas do grupo para retomar o poder.
As facções da Al Qaeda e do ISIS ativas na África
O que pouco se explora na mídia internacional é o domínio que as facções terroristas filiais da Al Qaeda e do ISIS vem exercendo em um corredor de países da África, os quais apresentam condições sociais, econômicas e instabilidade política similares a do Afeganistão e Iraque.
Independente da presença militar estadunidense e de missões humanitárias da ONU nestes países, grupos extremistas vêm realizando constantes massacres contra populações civis, instituições e autoridades governamentais, objetivando a derrubada destes governos considerados fantoches do ocidente.
Dentre os principais, se destacam o Boko Haram, na Nigéria, com ações em Camarões, Chade e Níger; o Al Shabaad, na Somália, estendendo suas ações no Quênia e na Etiópia, a Al Qaeda no Magreb Islâmico conhecida pela sigla AQUIM com atuação específica na Argélia e, mais recentemente, o Al Sunna, em Moçambique.
Fonte: Source Compiled by CQ Researcher/Brian Beary
Considerações finais
Este cenário é complexo pela diversidade de etnias, culturas e de ideologias opostas que geram constantes crises e conflitos de potencial ameaça para os próximos anos, e cujos fundamentos, o ocidente falhou em compreender ao utilizar, exclusivamente, uma estratégia belicista. E neste ambiente de instabilidade, a China oferece soluções que outros países, notadamente os EUA, ignoraram.
Vale destacar, que estamos falando dos maiores e mais influentes focos do terrorismo internacional. A maior preocupação é a probabilidade de evoluírem de uma ameaça regional para uma ameaça internacional, retornando a prática de atentados terroristas de baixa intensidade e em larga escala, como vimos entre os anos de 2013 e 2020, com atentados individuais praticados por autóctones em países da comunidade europeia.
The attack against German MINUSMA troops is said to be the first time the #Bundeswehr has been targeted in #Mali. https://t.co/waBFuoKJDR
— Michael Shurkin (@MichaelShurkin) June 25, 2021