Marcelo Godoy
O Estado de São Paulo
18 de março de 2021
O general Carlos Alberto Santos Cruz afirmou nesta quinta-feira, dia 18, defender um governo de "união nacional" e, em uma carta com 14 pontos expôs, quase como um manifesto, suas ideias para as eleições de 2022. A divulgação do documento acontece um dia depois de o nome do general ser cogitado por setores do PT para compor como vice a chapa com Luiz Inácio Lula da Silva, conforme revelou ontem o Estadão.
O general descarta essa possibilidade, além de criticar duramente Jair Bolsonaro. "Tenho sido claro em dizer que o Brasil não merece ter que optar entre dois extremos já conhecidos, viciados e desgastados. Ambos os extremos do nosso espectro político são exatamente iguais na prática e não servem para o Brasil."
No documento, ao qual o Estadão teve acesso, o general afirma ser a favor "de um governo que promova a paz e a união nacional, que governe para todos e não apenas para os seus seguidores mais próximos". A carta faz uma defesa enfática da união das forças centristas para enfrentar o cenário eleitoral de 2022 polarizado entre as candidaturas de Jair Bolsonaro e Lula. O general, que se classifica como um "cidadão de direita – apesar de considerar as simplificações ‘direita e esquerda’ limitadas e antiquadas" – diz considerar o diálogo essencial.
"Repudio o extremismo ideológico, a corrupção, o fanatismo político, o populismo e a demagogia". De acordo com ele, a "sociedade não pode viver em estado permanente de campanha política, dividida em amigos e inimigos, intoxicada e manipulada por extremistas". "As instituições precisam ser independentes e o aparelhamento das mesmas é inaceitável. O Brasil precisa voltar ao equilíbrio, à normalidade."
Santos Cruz, ao lado dos generais Sergio Etchegoyen e Eduardo Villas Bôas, apoiou a candidatura de Jair Bolsonaro, em 2018, na disputa contra o ex-prefeito Fernando Haddad, a quem chamou de "fascista" em vídeo pouco antes da eleição. Santos Cruz, que era secretário nacional de Segurança Pública de Michel Temer, se tornaria ministro-chefe da secretaria de Governo de Bolsonaro até ser demitido, no meio de 2019, após ser atacado pelos integrantes do chamado gabinete do ódio.
Desde então, o general assumiu pouco a pouco uma postura crítica em relação ao governo e de defesa da Operação Lava Jato. Na esquerda, passou a receber elogios públicos do ex-governador gaúcho Tarso Genro (PT). Em sua carta, o general da reserva alerta para o que chamou de "perigo do fanatismo político" que, segundo ele, "gera violência". Também criticou as "tentativas absurdas de arrastar o Exército, onde servi por cerca de 47 anos, para o dia-a-dia da política partidária e utilizá-lo como instrumento na disputa de poder".
Na semana passada, após o ministro Edson Fachin anular as sentenças que condenaram Lula, o presidente Bolsonaro afirmou em live que seria "fácil impor uma ditadura ao Brasil". "Como é que posso resolver a situação? Eu tenho que ter apoio. Se eu levantar minha caneta Bic e falar 'Shazam', eu vou ser ditador", afirmou o presidente. Santos Cruz enumerou as razões de suas críticas ao governo. Disse que elas se devem à "influência de fanáticos extremistas, falta de comportamento adequado, afastamento das promessas que o levaram ao poder, postura populista, foco em reeleição, irresponsabilidade e polarização política".
Em seguida, criticou a condução da crise sanitária por Bolsonaro, afirmando ser "inaceitável que a pandemia tenha sido conduzida sem liderança, com falta de considerações técnicas, com constantes tentativas de desmoralização dos procedimentos apropriados, politização completa de todo o processo e até de medicamentos, e a consequente falta de vacinas, necessárias para salvar vidas e possibilitar o retorno das atividades econômicas". No entendimento do general, "houve perda de tempo com banalidades e estamos absurdamente atrasados".
Ao reafirmar o que o afastaria do PT, o general afirmou considerar "a Operação Lava Jato um marco na nossa história e na esperança de combate à corrupção". Para ele, a operação e outras devem ter continuidade, "incluindo o aperfeiçoamento dos mecanismos de transparência e controle de contas públicas". Santos Cruz defendeu ainda a liberdade de imprensa, o combate aos privilégios, o fim do foro privilegiado e uma política externa "responsável e multilateral, colocando o Brasil na liderança mundial das questões de preservação da Amazônia e do meio-ambiente".
Por fim, o general afirmou não acreditar "em salvador da pátria e nem que exista necessidade de tal salvamento": "Acredito no trabalho e na capacidade dos cidadãos". Como eleitor, afirmou esperar que as "forças políticas e produtivas (empresários e cidadãos), construam alternativas que levem a um governo que traga de volta a paz, o respeito, a união, a recuperação da economia, reduza a nossa imoral desigualdade social e auxilie os mais vulneráveis". E concluiu: "Essas são as razões pelas quais não existe nenhuma possibilidade da minha participação nos dois extremos que considero nocivos ao Brasil".
O Jornal O Estado de S. Paulo publicou, na edição de ontem (17.3.2021), a informação de que a direção do PT ventilou meu nome em um possível convite para compor uma chapa à Presidência da República com o ex-presidente Luís Inácio Lula da Silva, dentro de um movimento de aproximação com os militares. A respeito desse assunto, venho a público esclarecer a minha posição.
Declaração Gen Div Carlos Alberto Santos Cruz 1. Jamais recebi qualquer comunicação sobre o assunto em foco e não sou filiado a nenhum partido político. Também, por diversas outras razões, não é possível tal composição. 2. Sou um cidadão de direita (apesar de considerar as simplificações "direita e esquerda" limitadas e antiquadas). Considero o diálogo essencial e repudio o extremismo ideológico, a corrupção, o fanatismo político, o populismo e a demagogia. Tenho sido claro em dizer que o Brasil não merece ter que optar entre dois extremos já conhecidos, viciados e desgastados. Ambos os extremos do nosso espectro político são exatamente iguais na prática e não servem para o Brasil. 3. Neste momento, sou a favor de um governo que promova a paz e a união nacional, que governe para todos e não apenas para os seus seguidores mais próximos. A sociedade não pode viver em estado permanente de campanha política, dividida em amigos e inimigos, intoxicada e manipulada por extremistas. As instituições precisam ser independentes e o aparelhamento das mesmas é inaceitável. O Brasil precisa voltar ao equilíbrio, à normalidade. 4. Minhas manifestações públicas têm os objetivos de alertar para o perigo do fanatismo político que gera violência e para as tentativas absurdas de arrastar o Exército, onde servi por cerca de 47 anos, para o dia-a-dia da política partidária e utilizá-lo como instrumento na disputa de poder. 5. Sou crítico do governo por causa da influência de fanáticos extremistas, falta de comportamento adequado, afastamento das promessas que o levaram ao poder, postura populista, foco em reeleição, irresponsabilidade e polarização política.
6. É inaceitável que a pandemia tenha sido conduzida sem liderança, sem com falta de considerações técnicas, com constantes tentativas de desmoralização dos procedimentos apropriados, politização completa de todo o processo e até de medicamentos, e a consequente falta de vacinas, necessárias para salvar vidas e possibilitar o retorno das atividades econômicas. Houve perda de tempo com banalidades e estamos absurdamente atrasados. 7. Considero a Operação Lava Jato um marco na nossa história e na esperança de combate à corrupção. Essa operação e outras devem ter continuidade, incluindo o aperfeiçoamento dos mecanismos de transparência e controle de contas públicas. 8. A reforma do Estado deve contemplar a extinção de todos os privilégios, a começar pelo foro privilegiado. 9. Acredito numa diplomacia atuante, responsável e multilateral, colocando o Brasil na liderança mundial das questões de preservação da Amazônia e do meio-ambiente. 10. Considero a liberdade de opinião e de imprensa como fundamental para a democracia, que depende também do aperfeiçoamento permanente das instituições. 11. A descrença e o desprestígio no Executivo, no Legislativo e no Judiciário e em outras instituições precisam ser tratados com discussão de ideias e medidas que produzam os aperfeiçoamentos institucionais necessários. 12. Não creio em salvador da pátria e nem que exista necessidade de tal salvamento. Acredito no trabalho e na capacidade dos cidadãos. 13. Como eleitor, espero que as forças políticas e produtivas (empresários e cidadãos), construam alternativas que levem a um governo que traga de volta a paz, o respeito, a união, a recuperação da economia, reduza a nossa imoral desigualdade social e auxilie os mais vulneráveis. 14. Essas são as razões pelas quais não existe nenhuma possibilidade da minha participação nos dois extremos que considero nocivos ao Brasil.
Brasília, 18.3.2021
Carlos Alberto dos Santos Cruz |