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‘Pesquisa antártica brasileira está à beira do colapso’, afirma cientista

Daniela Chiaretti

"A pesquisa antártica brasileira está à beira do colapso". Quem afirma é o geólogo gaúcho Jefferson Cardia Simões, o primeiro PhD brasileiro em glaciologia e vice-presidente do SCAR, de Cambridge (Reino Unido), o órgão mais importante da ciência antártica mundial. "Corremos o risco de inaugurar uma estação científica na Antártica de R$ 300 milhões, mas sem cientistas", diz, a antiga foi destruída por um incêndio em 2012.

O drama pode se concretizar a partir de março de 2018, se o governo não lançar novo edital de pesquisa. O que está em curso agora é a finalização de 18 projetos contemplados no edital 2013-2016, que envolvem 200 pesquisadores e 22 universidades.

Estão mais de um ano atrasados. Em nota, a assessoria de imprensa do Ministério da Ciência, Tecnologia, Inovações e Comunicações (MCTI) respondeu ao Valor dizendo que "devido ao contingenciamento no orçamento do Ministério, ainda não há previsão para o novo edital."

Sem recursos, os cientistas correm o risco de não terem como concretizar projetos na região em 2018. "Está tudo atrasado", diz Simões. "Vivemos uma fase de penúria como nunca vi igual", segue.

Ele coordena o Instituto Nacional de Ciência e tecnologia (INCt) da Criosfera, programa ligado ao CNPq e que administra 80% da atividade científica ligada ao Programa Antártico Brasileiro, o ProAntar.

Uma ação emergencial salvou do caos o cenário de 2017 das pesquisas antárticas. O MCTIC e o CNPq garantiram a participação dos cientistas na próxima operação antártica, que inicia em outubro.

Prometeram a liberação de R$ 1,5 milhão para passagens aéreas e alguns equipamentos. Sem esses recursos, os pesquisadores não podem concluir os projetos, muitos em cooperação com cientistas de outros países.

A participação científica na operação antártica do verão 2017-2018 esteve ameaçada. Sem a verba, os pesquisadores não teriam como ir à Antártida em outubro. Seria a primeira vez que isso aconteceria em 34 anos.

A liberação de R$ 1,5 milhão garantirá "empurrar a parte científica do ProAntar até março". Esta é a boa notícia. "Mas depois de março não tem mais dinheiro", segue Simões. Desde 2013 não sai novo edital de pesquisa. "Estamos vivendo na inércia", diz.

O edital anterior tinha R$ 14 milhões divididos em 18 projetos e prazo de três anos. "Mas como faltou dinheiro, irá durar cinco anos", diz ele. Em março, paradoxalmente, a Marinha espera inaugurar a nova Estação Antártica Comandante Ferraz, orçada em R$ 300 milhões e construída pela chinesa Ceiec.

Terá 14 laboratórios ultramodernos. Ocorre que projetos científicos para a nova estação estão vinculados ao lançamento do novo edital. "Estudar a Antártida é tão importante para o sistema climático global como a Amazônia", lembra.

É preciso estudar o que acontece ali para melhorar a previsão do clima e os impactos da mudança climática no Brasil. Frentes frias antárticas podem alcançar o Acre. Entre os 18 projetos em curso há os vinculados ao Módulo Criosfera 1, a 2.500 km ao sul da estação brasileira.

Ali se detectam, por exemplo, se há subprodutos das queimadas amazônicas alcançando a Antártida, se há poluição de urânio vindo da Austrália ou por arsênico, com origem na mineração de cobre do Chile. Outro projeto monitora o buraco na camada de ozônio.

Outro estuda o uso potencial de algas marinhas na medicina. "A questão é que a Antártida está no nosso cotidiano. O grande problema é o mito da distância, o brasileiro acredita que a Antártida está muito longe e não nos afeta. Porto Alegre está mais perto de lá do que Boa Vista.

A ciência foi destruída nos últimos seis meses, a situação é gravíssima e este quadro tem implicações além da ciência", diz. O Brasil é um dos 59 países que fazem parte do Tratado Antártico. O Brasil é um dos 29 países com direito a voto sobre o futuro deste continente que, somado ao Oceano Austral, representa 10% do planeta. Um dos artigos do tratado exige atividade científica continuada na Antártida.

Há um mês, em evento da Frente Parlamentar Mista de Apoio ao ProAntar, na Câmara dos Deputados, Andrei Polejack, coordenador de oceanos, Antártica e geociências do MCTIC, confirmou que não existem recursos para lançar o edital de pesquisa em 2018. Na nota, o MCTIC "destaca o papel da pesquisa, imprescindível para o desenvolvimento econômico e social de qualquer país".

Diz que "trabalha pela recomposição orçamentária, atuando junto à Fazenda e ao Planejamento pelo descontingenciamento de recursos que afetaram diferentes órgãos do governo." No cenário de ajuste fiscal, segue a nota, o MCTIC "está dando prioridade a seus institutos (16 unidades de pesquisa e as 6 organizações sociais) e acompanha "criteriosamente as atividades dos institutos de pesquisa de maneira a evitar que impactos significativos venham a ser observados.

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