Eduardo de Oliveira Fernandes
Doutor e Mestre em Ciências Policiais de Segurança e Ordem Pública pelo Centro de Altos Estudos de Segurança (CAES), especialista em Ciências Sociais, Bacharel em Direito, professor de Ciência Política e Sociologia da Violência da Academia de Polícia Militar do Barro Branco e de Sociologia das Faculdades Pitágoras. É autor do livro ”As Ações terroristas do crime organizado”, São Paulo, Livrus, 2012.
Causa-nos certo grau de incredulidade a ideia de se conviver no século XXI com um grupo terrorista que se autodenomina como Estado Islâmico e que pratica um terrorismo transnacional a ponto de causar pânico planetário.
A incredulidade passa a ser maior ainda quando podemos enxergar no Estado Islâmico alguns fundamentos políticos e econômicos universais que podem de alguma maneira explicar a sua existência, sem, contudo, apresentar a sua justificativa.
Para a interpretação e investigação dos fundamentos políticos e econômicos do Estado Islâmico, recorro ao universo das ciências sociais, em que podemos extrair os elementos constitutivos acerca das três categorias de poder, quais sejam: a política, a ideológica e a econômica.
O poder político, segundo o entendimento de Max Weber, ancora-se no princípio histórico de que o ente estatal, para a sua condição de existência, precisa monopolizar o uso da força, sem o que deixaria de ser Estado.
Nesse quesito, o Estado Islâmico – ainda que não portador da força legítima- ocupa-se de forma vigorosa, posto o grande número de execuções, atentados e atos de violência generalizados contra os hereges, infiéis, apóstatas, homossexuais e mesmo em relação àqueles que professam o islamismo diversamente da interpretação sunita/wahabita/salafista.
O poder ideológico, segundo as lições extraídas da Revolução Francesa, não caberia mais ao Estado interferir nesse universo, vez que a separação entre a Igreja e o Estado havia sido consagrada por este evento histórico, razão pela qual o indivíduo de uma forma geral teria liberdade de pensamento, expressão e de credo.
Paradoxalmente, nesse item, o Estado Islâmico assenta a sua leitura de mundo baseada no princípio de que todo e qualquer tipo de credo diferente daquele que foi postulado pelo seu pretenso califado é objeto de julgamento e condenação severos. Algo, que de certa forma, foi praticado pelo Catolicismo no período da Inquisição, em que a religião, seus dogmas e códigos tornavam-se verdadeiros instrumentos de Estado, o que, igualmente, também foi seguido por outras versões teocráticas e/ou fundamentalistas.
O poder econômico, ainda que existam correntes divergentes e inúmeras controvérsias, é uma faculdade que pode ser renunciada pelo Estado, como previu o liberalismo no exercício da “mão invisível do mercado”, ou, de umângulo diametralmente oposto, constituir-se como objeto de intervenção, conforme a lógica keynesiana, quando da Queda da Bolsa em 1929 e do posterior advento da Segunda Guerra Mundial e a necessidade de reconstrução da Europa e territórios aliados.
Aqui, especificamente no aspecto econômico, o Estado Islâmico atua de forma híbrida quando rigidamente controla e saqueia territórios, exige a cobrança de taxas e impostos, apropriando-se da coisa pública e privada e, ao mesmo tempo, praticando um capitalismo corrosivo e selvagem quando negocia petróleo oriundo de poços roubados ou arrebatados, inclusive, com nações e países legalmente constituídos, segundo a comunidade internacional.
De tudo o que foi demonstrado por este resumido artigo, é possível concluir que o Estado Islâmico, embora contando com o seu altíssimo grau de incredulidade, abriga em seu seio conceitos extraídos das ciências sociais que são amplamente aplicados por diferentes estados e nações e em diferentes períodos históricos, restando claro que por ser definido como um amorfoproto-estado, explora e amplifica aquilo que é mais abjeto dos poderes político, ideológico e econômico.