Raymundo Costa
e Cristiane Agostine
O ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva terá um protagonismo maior no segundo mandato da presidente Dilma Rousseff do que teve no primeiro. Nos últimos quatro anos, Lula procurou manter uma distância regulamentar do governo, até para que o brilho de Dilma não fosse ofuscado pela estrela de maior magnitude do PT, e atuou mais nos bastidores que no centro do palco. Desde a reeleição, no entanto, Lula interferiu na formação da equipe econômica, e não fez segredo disso, estabeleceu um canal permanente de diálogo com a militância nas redes sociais e já foi visto tentando apagar incêndios na sempre indócil base de apoio a Dilma a no Congresso.
Se depender do PT, o ex-presidente assume bandeiras histórias do partido, como o projeto de regulamentação da mídia. Sem tirar o pé que mantém na porta do gabinete de Dilma, no entanto, Lula parece mais preocupado, no momento, em resgatar o apoio de setores da sociedade desavindos do PT. Veja-se o vídeo que o ex-presidente postou na internet na antevéspera do Natal, no qual afirma que o governo federal precisa voltar a aliar-se à esquerda para ter chance de manter o projeto do PT.
"Nós perdemos um pouco de base porque desde que começamos a disputar as eleições o PSOL saiu do PT, o PSTU saiu, a Marina Silva saiu do PT, o Eduardo Campos saiu da nossa base de apoio", disse Lula. "Perdemos um pouco de apoio, que foi para o outro lado. Precisamos aproveitar os quatro anos e tentar reorganizar a base de aliança nossa com os setores mais à esquerda da sociedade. Se fizermos isso, voltaremos a ter grandes chances de governar o país".
Essa é uma das pontas da base nas qual deve se assentar a candidatura do PT em 2018. Provavelmente do próprio Lula, que ainda não decidiu nada, mas é o nome natural do partido para a sucessão de Dilma. Outra ponta é a economia. Não foi à toa que Lula tanto se expôs na tentativa de levar a presidente da República a desistir da nova matriz macroeconômica, um movimento que se confundiu com o "Volta, Lula" e provocou um grande mal-estar na relação entre criador e criatura. Terminada a disputa, Dilma cedeu ao ponto de vista de Lula. Para o ex-presidente, o ajuste fiscal é necessário para o país retomar o crescimento, de preferência já a partir de 2017. Com taxas positivas no PIB e inflação mais baixa fica mais fácil manter o engate com a base social lulista.
O ex-presidente quer manter acesa a chama de sua influência junto aos movimentos sociais no segundo mandato da presidente Dilma Rousseff, em um também esforço para tentar segurar a base de esquerda perto do governo federal, como disse no vídeo que divulgou no YouTube. Descontentes com a falta de diálogo com Dilma no primeiro mandato, movimentos populares vão perder seu principal canal na gestão Dilma, com a saída do lulista Gilberto Carvalho do ministério, e veem no ex-presidente o principal mediador de seus interesses junto ao Planalto.
A sede do Instituto Lula, na capital paulista, tem se reforçado como um comando paralelo do governo, sobretudo em relação aos movimentos sociais. As manifestações de junho de 2013 deixaram o ex-presidente particularmente preocupado com o fato de o PT não ter antecipado o caldeirão que fervia na periferia das grandes cidades. O PT não só não antecipou o movimento como foi escorraçado nas ruas.
Desde então, Lula tem feito reuniões periódicas com um grupo de jovens para debater a conjuntura política, ouvir as demandas e defender o apoio ao governo. A última reunião foi no dia 15. O ex-presidente tenta evitar que o governo e o PT sejam surpreendidos com uma nova onda de protestos.
Passada as eleições, Lula tem participado de conversas com sindicalistas, sem-teto, catadores, formadores de opinião, intelectuais e lideranças da esquerda, o que não fez depois que Dilma foi eleita pela primeira vez. Depois, além de não querer fazer sombra à presidente, Lula também ficou doente – e o câncer na garganta não lhe permitia atividades públicas.
No início deste mês, recebeu a visita de líderes do MTST, grupo de sem-teto que assumiu o protagonismo das grandes manifestações de rua em São Paulo, depois dos protestos de junho de 2013. No comando do grupo, Guilherme Boulos transformou Lula na estrela da entrega de chaves para 192 famílias do conjunto habitacional em Taboão da Serra, região metropolitana de São Paulo, no dia 21. No evento do Minha Casa, Minha Vida, uma das principais marcas do atual governo – Dilma Rousseff não participou.
Aos movimentos sociais, o ex-presidente pede apoio à Dilma, mas também incentiva a cobrança por mais diálogo e pelo atendimento de suas reivindicações.
Publicamente, em eventos e vídeos, Lula tem passado recados à presidente Dilma, defendendo maior proximidade com os movimentos sociais. Um interlocutor privilegiado de Lula diz que o ex-presidente, ao assumir uma postura mais proativa no segundo mandato, espera levar Dilma a conversar e negociar mais, seja com os movimentos sociais como com o Congresso e a classe empresarial, o que ela não fez no primeiro governo.
Desde a vitória de Dilma, o ex-presidente já foi quatro vezes a Brasília, para discutir com a presidente a montagem da equipe econômica e ouvir as reclamações de parlamentares sobre a falta de sintonia do Planalto com o Congresso. O ex-presidente prometeu aumentar a frequência dos encontros com parlamentares e pediu apoio a Dilma. Lula pode não mudar o estilo da presidente, nem suas convicções na economia, mas ninguém poderá dizer que ele não tentou. Mas se der certo, estará pavimentado o caminho do PT para 2018.