Ricardo Galhardo e Pedro Venceslau
O Movimento dos Sem Terra (MST) enviará uma comitiva amanhã (Segunda-feira), ao Palácio dos Bandeirantes, sede do governo paulista, mas desta vez, diferentemente do que costumava ocorrer ao longo das últimas décadas, não será para protestar do lado de fora.
Há quatro anos, após ser eleito novamente governador, Geraldo Alckmin assumiu sob pressão do movimento – e retribuir prometendo “tolerância zero” com invasões de terra. Agora reeleito, o tucano e os sem terra, aliados históricos do PT, vivem uma espécie de lua de mel.
No encontro de amanhã, cinco secretários (Agricultura, Meio Ambiente, Justiça, Educação e Casa Civil) receberão os militantes para uma reunião de trabalho no gabinete de Edson Aparecido, chefe da Casa Civil.
No momento em que a presidente Dilma Rousseff se distancia dos movimentos sociais devido aos cortes de programas decorrentes do ajuste fiscal, Alckmin seguiu no caminho oposto. Desde o ano passado, o governador promoveu três grandes reuniões com o MST. Na primeira delas, em abril, ele participou pessoalmente, levou consigo todos os 27 secretários e abriu as portas do governo para Gilmar Mauro, visto como um dos mais radicais líderes sem terra – representante de São Paulo na coordenação do movimento. Em contrapartida, ganhou o apoio político do movimento. “É uma relação política. Uma relação boa. Principalmente agora”, disse Gilmar Mauro.
Assentamentos. Apesar do rigoroso contingenciamento promovido pelo governo paulista em quase todas as áreas, Alckmin manteve a previsão de investir R$ 7 milhões em 2015 em programas de poços artesianos e poças sépticas nos 136 assentamentos do MST. Ao todo, 7 mil famílias são atendidas pelo governo com assistência técnica.
“A relação do MST conosco se estreitou na medida em que adotaram uma posição crítica em relação ao Incra e ao governo federal”, afirmou Aparecido.
O MST confirma a tese do tucano. “O governo federal sinaliza exatamente no sentido oposto não só ao nomear Katia Abreu (ruralista, ministra da Agricultura), mas em toda a política econômica”, avaliou Gilmar Mauro.
Os resultados da aproximação já são visíveis. “As ocupações vem caindo. Antes (da gestão Alckmin) eram cerca de 70 por ano, hoje a média é 35”, disse Marco Pilla, diretor executivo do Instituto de Terras do Estado de São Paulo (Itesp).
O namoro improvável foi concretizado na reunião de abril de 2014 em que Alckmin levou todo o secretariado. Na ocasião foi traçado um plano de atuação multidisciplinar. Cinco meses depois, o governador conseguiu uma façanha inédita: venceu a eleição em todas as regiões com assentamentos do MST. “Eles fizeram muito a campanha da Dilma e do Geraldo. A gente sempre perdia em municípios onde tinha assentamento, mas dessa vez ganhamos em todos: no Pontal (do Paranapanema), na região de Andradina e no Vale do Ribeira”, disse Aparecido.
Gilmar Mauro diz que a relação apoio/voto não faz parte da equação, mas confirma a existência de um eleitorado tucano nos assentamentos do MST. “Não tenho os dados, mas é um fato que o Alckmin tem voto na base do MST”.
Apesar da relação cada vez mais próxima, tanto o governo como o MST preferem tratar da “aliança” com discrição. Entre os tucanos, há o receio que conservador, resista à ideia. “O MST vive às custas do leite que mama no governo federal. Como o leite de lá deve ter diminuído, procuraram outro lugar para mamar mais”, diz o ex-governador Alberto Goldman (PSDB).
‘Oportunista’. Ele conta que, em sua gestão, que antecedeu Alckmin, nunca foi feita uma reunião com movimento no Bandeirantes. Questionado sobre como era sua relação com o MST, a resposta é direta: “Nenhuma”. “Pode ser uma ação oportunista dos dois lados. Do lado do MST mostrando que está indo buscar mais espaços e recursos, e do lado do governo uma postura mais simpática e não dogmática”, disse Goldman.
Já os petistas tratam o tema com maior naturalidade. De acordo com Gilmar Mauro, o ex-presidente Luiz Inácio Lula da Silva acompanhou o processo de aproximação com o governo Alckmin e em momento algum se opôs. “Lula sabe. Como bom sindicalista ele entende mais do que ninguém que eu, como dirigente, tenho que dar uma resposta à base do movimento.”
O MST evita tratar a aproximação com Alckmin sob o prisma ideológico. “Nossos princípios não estão na mesa de negociação. Além disso, há muitos PSDBs. Há setores do partido contrários ao MST, mas o Alckmin nos abriu uma porta.”
Para a UDR será um tiro no Pé
José Maria Tomazela
Como revelou o Estado, Alckmin agendou para esta segunda-feira, 28, no Palácio dos Bandeirantes, uma reunião entre as lideranças do MST e o secretário chefe da Casa Civil, Edson Aparecido. Titulares das pastas da Agricultura, Meio Ambiente, Justiça e Educação também participam do encontro. O governador paulista se aproxima do movimento social num momento em que o MST, aliado histórico do PT, externa descontentamento com os rumos do governo da presidente Dilma Rousseff.
Para a UDR, assessores que sugeriram essa estratégia ao governador esqueceram que, ainda há pouco, o MST ameaçava lançar seu "exército vermelho" nas ruas contra eventual impeachment da presidente Dilma Rousseff.
A entidade tem sede no Pontal do Paranapanema, região que concentra os conflitos fundiários no Estado de São Paulo. "Há poucos dias estávamos com fazendas invadidas por essa organização criminosa, que promete fazer novas invasões", disse Nabhan. Segundo ele, os fazendeiros devem programar uma manifestação contra possível aliança de Alckmin com o MST. "É uma afronta aos produtores que foram invadidos e vamos às ruas dar uma resposta."
Avanços. A Fundação Instituto de Terras do Estado de São Paulo (ITESP) informou em nota que a relação de movimentos sociais agrários com o Governo do Estado não é baseada em política, mas sim na busca de avanços para quem vive da terra. O ITESP assiste 136 assentamentos, onde vivem sete mil famílias. "A competência constitucional da reforma agrária é do Governo Federal, mas São Paulo é um dos poucos Estados do Brasil que implanta assentamentos em terras julgadas devolutas e garante que 30% de todas as compras de alimentos feitas pelo Estado seja da agricultura familiar. Garantir infraestrutura e condições de produção para os pequenos agricultores é, antes de tudo, prioridade de Estado."