Talita Fernandes
Uma sala de reuniões no Ministério da Defesa, em Brasília, funciona desde a última semana como o Q.G. da segurança da Olimpíada. Na sexta-feira passada, dia 22, os responsáveis por garantir a ordem no mais esperado acontecimento esportivo do ano se encontraram virtualmente, por videoconferência, para planejar cada passo que será dado daqui em diante.
Participaram representantes de todas as cidades que sediarão parte dos Jogos, além do Rio de Janeiro: Brasília, São Paulo, Belo Horizonte, Salvador e Manaus. Até o próximo dia 5, data do início do evento, a cena se repetirá às 10H30 de todas as manhãs.
O cuidado com cada detalhe será imprescindível para que a Olimpíada no Brasil transcorra sem sobressaltos. O general Luiz Felipe Linhares, chefe da Assessoria Especial fiara Grandes Eventos do Ministério da Defesa, um dos integrantes desse time, afirma que a possibilidade de um ataque terrorista no Brasil é "baixíssima". Nenhum alerta de ameaça, entretanto, deverá ser ignorado.
ÉPOCA – Os ministros da Justiça e da Defesa chamaram de "amadores" os suspeitos presos na Operação Hashtag na semana passada. O senhor concorda que eram amadores?
General Linhares – Amador ou não, essa classificação ficará muito mais clara durante a investigação, que acontecerá nos próximos dias. Algum desses é o líder? Realmente não há essa definição tão clara. O que o pessoal concluiu é que eles não tinham um contato com o Estado Islâmico e que esse grupo poderia ser de amadores ou de ratos solitários. Mas isso só vai ser esclarecido ao fim da investigação.
ÉPOCA – Em uma investigação de terrorismo, é possível separar o amador do profissional para só então tomar as medidas cabíveis em cada caso?
General Linhares – Não. Tudo o que representa ameaça de terrorismo é digno de uma investigação. Você acha que aquele cara de Nice era um profissional? Era um amador, e o estrago foi grande. No combate ao terrorismo, as ameaças de amadores e profissionais, tendo em vista as consequências, podem e devem ser tratadas do mesmo jeito.
ÉPOCA – A operação prendeu um investigado que tentou comprar uma AK-47 num site. Como as Forças Armadas agiriam se um cidadão aparecesse em plena Praia de Copacabana com uma arma dessas durante os Jogos?
General Linhares – Há protocolos para tudo isso. Durante nossos estudos, foi classificado que 80% dos incidentes com terroristas ocorrem com o uso de armas de fogo individuais ou explosivos. Com caminhões, como em Nice, nem tanto, apesar de haver essa possibilidade. Para isso, existe um protocolo que eu não vou comentar porque tem um lado de sigilo. Cada vez que ocorre um incidente, a gente checa se existe um protocolo e age de acordo com ele.
ÉPOCA – Com a operação da semana passada, o pior já passou? Ou ainda corremos risco de ter um atentado?
General Linhares – Falamos sempre em possibilidade, probabilidade e capacidade. A possibilidade de ocorrer um incidente terrorista existe no mundo inteiro: 110 Brasil, na China, em qualquer lugar… Tivemos episódios em outros lugares, às vezes até com histórico de terrorismo. Os que ocorreram na França, por exemplo, eram possíveis sim. Eram prováveis? Talvez. Mais prováveis que em outros lugares. A probabilidade é um dado matemático. Existem dados da expressão de inteligência, da investigação e de redes sociais compondo a fórmula matemática para chegar a um número percentual.
ÉPOCA – Qual a probabilidade de ocorrer um atentado terrorista aqui?
General Linhares – Baixíssima
ÉPOCA – Vocês têm um percentual que traduz essa chance?
General Linhares – Não tenho um número, mas a probabilidade é baixíssima. Estamos num nível tal de inteligência, de investigação, de acompanhamento que aquele grupo foi identificado, preso. E isto aqui eu destaco: se nós não tivéssemos a lei que define terrorismo, não teríamos condições de ter prendido aquele pessoal. A lei de março foi excepcional para o país. Perfeita ou imperfeita, ela possibilita que se faça isso. E que se viabilize uma proteção. Era um ato preparatório. A definição desse termo é na lei. Isso não existia antes. Pela lei antiga, a gente podia acusar alguém por portar inúmeras armas. Mas qual era o crime que ele cometia? Apenas não ter declarado as armas.
ÉPOCA – De que forma a lei justificou a prisão preventiva dos investigados?
General Linhares – E uma prisão em termos de investigação com 30 dias de preventiva, podendo ser prorrogada até que os Jogos acabem, por exemplo. Tudo depende dos rumos das investigações. Foram presas dez pessoas, classificadas como possíveis terroristas. Isso é importante: elas não podem ainda ser chamadas de terroristas, mas de "possíveis" por causa dos atos preparatórios.
ÉPOCA – Sérgio Etchegoyen, general-chefe do Gabinete de Segurança Institucional, causou certo desconforto ao falar da necessidade de uma revisão de protocolos depois do atentado em Nice. É preciso revêlos?
General Linhares – A revisão de protocolo citada pelo ministro é sempre bem-vinda. A cada incidente a gente revisa os protocolos. O que eu acho que ele quis dizer é: vamos revisar e ver isso aí. Se não estiver previsto, vamos adaptar, aprimorar. Um exemplo é a mudança nas regras de fiscalização nos aeroportos, apesar de não ter nada a ver com nosso trabalho. Havia regra de segurança? Havia. A revisão fez com que elas fossem aprimoradas e intensificadas.
ÉPOCA – Na abertura da Copa, em 2014, quase vimos um incidente por falha de comunicação. Por estar armado, um segurança foi confundido com um suspeito e quase foi assassinado. Agora que estamos mais em alerta, o senhor acha que casos como esse podem voltar a ocorrer?
General Linhares – Acredito que não acontecerá de novo devido à integração dos órgãos. Naquela situação, havia dois órgãos responsáveis pela segurança, e um não sabia o que o outro estava fazendo. Agora todos saberão o que os outros estarão fazendo. Não haverá possibilidade de um estar em ação sem que o outro saiba.
ÉPOCA – A Copa ajudou nesse sentido?
General Linhares – Com certeza. Esse incidente é citado diversas vezes nas nossas discussões como algo a ser evitado. Todos os grandes eventos trazem experiência. A Copa, que é o mais recente, foi o que trouxe mais aprendizado.
ÉPOCA – Por que essas mesmas discussões não vieram à tona durante a Copa?
General Linhares – Os estudos de segurança feitos durante a Copa colaboraram para que a gente hoje tenha uma legislação adequada. Naquela época, era um anseio que não chegou a acontecer. Nossa legislação não é perfeita. Mas nós temos uma grande vantagem sobre muitos países que não têm a lei.
ÉPOCA – Além do terrorismo, a segurança geral dos Jogos é um assunto que preocupa…
General Linhares – A gente trabalhou a segurança em três eixos de atuação: Defesa, Segurança Pública e Inteligência. Nas ruas, a inteligência não vai ser vista. Serão vistas apenas segurança pública e a segurança pelas Forças Armadas. Quando o governador do Rio, Francisco Dornelles, antecipou em junho a solicitação ao presidente da República para reforçar os meios de segurança pública estaduais, reconheceu que não tinha gente suficiente para garantir o nível de segurança desejável durante os Jogos. Ele avaliou a necessidade, e o presidente autorizou. Foi feito então um planejamento. Nós colocamos mais gente no Rio de Janeiro.
ÉPOCA – Qual o total?
General Linhares – Tínhamos 18 mil, e agora chegaram mais 3 mil. Isso vai variar de acordo com os fluxos de chegada e de partida. Depois da Olimpíada, para os Jogos Paralímpicos, as cidades do futebol fecharão. Com isso, haverá a troca de algumas pessoas que estão nessas cidades e vão para o Rio. Com a segurança pública que está prevista hoje, o cidadão pode se considerar seguro.
ÉPOCA – Há um desentendimento entre as Forças Armadas e as unidades civis?
General Linhares – Isso está totalmente pacificado. Não prejudicará o evento, até porque temos de entender que todos os órgãos têm sua competência legal prevista em Constituição e leis. Desde o início dos trabalhos, partimos para o respeito às competências legais. O segundo ponto é que foram analisadas as capacidades de cada órgão. Se acontecer algo, nós seremos capazes. As atribuições foram estudadas e definidas para evitar uma sobreposição de missões. E para evitar também que alguém tenha atrito de definição e responsabilidade. Tudo isso está nos protocolos.