Sylvia Colombo
Na mesma semana em que uma comissão do Conselho de Segurança das Nações Unidas visitou a Colômbia e deixou o país dizendo-se satisfeita com os avanços na implementação do processo de paz com as FARC (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), uma pesquisa do instituto Gallup mostrou um aumento do número de colombianos que creem que o processo esteja indo por um mau caminho. De 43%, em dezembro, foi para 57% em abril.
Os números acompanham, também, um desgaste da popularidade de Juan Manuel Santos, hoje com apenas 26% de aprovação.
A imagem do presidente havia desabado até preocupantes 16%, mas sua intensa atuação para socorrer os atingidos pela tragédia de Mocoa – deslizamento de terra que causou mais de 150 mortes- fez com que resgatasse algo em termos de apoio. Ainda assim, o instituto Datexco mostra que 71% dos colombianos desaprovam seu governo.
Qual a explicação para que um mandatário com tanto prestígio no exterior e um Prêmio Nobel no bolso esteja com cada vez menor popularidade? E por que o acordo de paz aprovado no fim de 2016 e que de fato pôs fim aos enfrentamentos vem sendo tão mal visto?
A resposta está em questões pontuais. Além da queda do desempenho econômico do país (que deve crescer apenas 1,8% em 2017), a maioria está relacionada à implementação do acordo.
Em primeiro lugar, estão os prazos não cumpridos. As Farc têm até 1º de junho para entregar todas as armas registradas quando entraram nas 26 zonas de segurança monitoradas pelo Exército e pela ONU. Não só esse cronograma está atrasado como a guerrilha deixou de informar que tem muito mais armamento do que o declarado.
O chamado "escândalo das fossas" explodiu há duas semanas, quando foram revelados que há mais de 900 esconderijos de armas, explosivos e dinheiro, principalmente no norte do país.
Um dos membros do Secretariado das Farc, Carlos Lozada, declara que não houve má-fé, e que a guerrilha não tem informação centralizada de quantas armas possuía cada uma de suas frentes. "Vamos fazer o possível para entregar tudo até o dia 1º, mas é provável que precisemos de mais tempo", disse.
Em entrevista no começo da semana, Santos minimizou o problema. "O prazo da entrega dos fuzis dos que estão nas zonas de segurança vai ser cumprido. Quanto às 900 fossas, não temos previsão. Mas eu pergunto que importância tem a demora em um ou dois meses, depois de termos colocado fim a uma guerra que durou 50 anos? O importante é que não há mais combate nem mortos."
O atraso da devolução dos menores de idade é mais um ponto de descontentamento. Segundo o tratado, os integrantes da guerrilha com menos de 18 anos deveriam ser entregues assim que as FARC entrassem nas zonas de segurança. Até agora, porém, com a entrega de três garotos na semana passada, chegou-se ao número de 70. O governo calcula que faltam 170. Muitos deles foram sequestrados de famílias de camponeses.
Outro ponto que vem marcando o mau humor dos colombianos com o processo é a aproximação das eleições legislativas – em maio de 2018.
Segundo o acordo, as FARC terão direito a dez cadeiras no Congresso, cinco na Câmara dos Deputados e cinco no Senado, mesmo que não obtenham os votos suficientes para isso. Poderão concorrer mesmo os ex-guerrilheiros que ainda estiverem sendo processados pelos tribunais da Justiça especial, que também tardam em entrar em funcionamento.
"Eu posso aceitar que eles participem do Congresso, é melhor ter a guerrilha ali do que nas montanhas, causando o terror. Mas acho injusto que não cumpram uma pena mínima antes de virarem deputados ou senadores", diz a comerciante Lídia Ariza, 59.
A força política que vem concentrando as reclamações dos que votaram pelo "não" no plebiscito da paz, em outubro passado, é o Centro Democrático, do ex-presidente Álvaro Uribe.
Desde então, o partido vem se ausentando das votações do Congresso que definem as mudanças constitucionais necessárias à implementação do acordo.
Foi assim no último dia 26 de abril, quando os uribistas se negaram a votar na sessão que definiu as regras para a criação do partido das FARC.
"Não estamos de acordo de que pessoas que cometeram crimes atrozes entrem legalmente no Congresso antes de cumprirem penas", disse à Folha o porta-voz do partido, Jaime Amín.
Já Santos, na mesma entrevista, minimizou também esse aspecto. O presidente crê que a representatividade das FARC, com dez congressistas, será ínfima, e acusa os uribistas de mentir.
"Ninguém que tenha cometido crimes de lesa humanidade será eleito. Estamos tendo atrasos na instalação dos tribunais especiais, por questões burocráticas e de falta de pessoal. Mas são coisas normais", afirmou.
Para Santos, "que estejamos discutindo detalhes, aspectos da implementação, é algo positivo, porque significa que estamos avançando".
De fato, o presidente não se equivoca, pois, desde que assinado o tratado, não houve mais assassinatos relacionados ao conflito.