Luiz Carlos Azedo
Jornalista, colunista do Correio Braziliense
O grande mérito do ex-presidente José Sarney foi conduzir com êxito a transição à democracia; além disso, no rastro da maior onda de greves de trabalhadores da história do país, os principais indicadores sociais — na saúde, na educação, na habitação e até mesmo na questão agrária — melhoraram durante o seu governo.
Entretanto, do ponto de vista da economia, o governo Sarney foi um fracasso retumbante. Depois de sucessivos planos econômicos, o mais ambicioso dos quais foi o Cruzado, que permitiu uma vitória esmagadora do PMDB nas eleições de 1986, Sarney deixou o poder com o gosto amargo da impopularidade.
O Brasil mergulhou na hiperinflação e no desemprego. Somente conseguiu dar a volta por cima com o Plano Real, lançado no governo Itamar Franco e consolidado por Fernando Henrique Cardoso, o ministro da Fazenda que se elegeu presidente da República graças ao combate à inflação. Foram necessárias muitas reformas, tanto no governo Itamar quanto nos dois mandatos de Fernando Henrique, para que a moeda permanecesse estável.
Durante o governo Lula, a renda mais que dobrou, e a proporção de pobres na população é hoje pouco mais de um terço. A dívida externa foi reduzida e está sendo paga em dia; a desigualdade entre ricos e pobres apresenta números melhores. Patinamos, porém, quanto ao crescimento econômico. Na verdade, ainda estamos longe de ser um país de classe média, como se jactava a presidente Dilma Rousseff ao assumir o mandato.
O dragão da inflação, que parecia perpetuamente encarcerado, está solto novamente. A presidente Dilma recebeu o governo em 2011 com PIB de 7,5% (2010), inflação de 5,91% (IPCA) e juros em 10,75%. Na eleição, houve um tremendo oba-oba em relação aos indicadores sociais, que foram comparados aos dos anos de ajuste do Plano Real, mas nunca confrontados com indicadores internacionais.
Marcha à ré
Dados do Banco Mundial mostram que mais de um terço da população vive numa faixa intermediária, ligeiramente acima da faixa de pobreza. Estamos entre os líderes mundiais de inflação, endividamento público e concentração de renda. Agora, mesmo os avanços sociais são subtraídos com mãos de gato. Nos dois sentidos: além dos escândalos de corrupção, como o da Petrobras, desnudado pela Operação Lava-Jato, a renda das famílias é corroída pela inflação, que chegou aos 10% pelo IPCA-15.
Segundo o Banco Central, a recessão já é de 3,3% neste ano. O mercado considera que 2016 será mais um ano perdido, com inflação acima do teto de 6,5% e recessão maior que 2%. A nova meta fiscal de 2015 aprovada pelo Congresso prevê um rombo no orçamento de R$ 200 bilhões. O ajuste fiscal até agora foi conversa para boi dormir, pois terminamos o ano com deficit de R$ 120 bilhões nas contas públicas.
Nas últimas três décadas, o PIB (Produto Interno Bruto) cresceu, em média, 2,9% ao ano; nas três décadas anteriores, com o ciclo de substituição de importações, a média era de 6,5%. A participação brasileira no PIB global caiu de 4%, em 1985, para 2,9% estimados no ano passado pelo Fundo Monetário Internacional (FMI). Entre 2006 e 2010, o PIB cresceu, em média, 4,4% anuais, impulsionando a arrecadação do governo. Os pobres, segundo critérios do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada), passaram de 31% para 15% da população em 2013. Mas, com o desemprego, estão voltando à linha de pobreza.
O PIB encolheu, o ambicioso Plano de Aceleração do Crescimento (PAC) é um fracasso. O governo lança pacotes de aumento de impostos e corte de despesas públicas, eleva os juros e não sabe o que fazer para atrair investimentos. O governo Dilma pode representar um retrocesso socia, ao contrário do que aconteceu no governo Sarney. Com indicadores em marcha à ré, o legado social de Lula deixaria de existir. A maneira de evitar que isso ocorra pode ser o rompimento com Dilma, mas é uma operação de alto risco.