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AZEDO – O Muro


Luiz Carlos Azedo
Jornalista, colunista do Correio Braziliense


No início dos anos 1980, a esquerda brasileira não havia se dado conta ainda de que o mundo que habitava deste a II Guerra Mundial, pautado pela “guerra fria”, havia deixado de ser bipolar.
 
De certa forma, a onda neoliberal liderada pelo presidente norte-americano Ronald Reagan, republicano, e pela primeira-ministra britânica Margaret Thatcher, conservadora, reforçava essa ideia. No Brasil, a luta contra o regime militar também corroborava essa visão, na qual o governo do presidente João Batista Figueiredo e o imperialismo ianque pareciam ser uma coisa só.

Não eram. A Guerra das Malvinas (1982), na qual os argentinos acreditavam que Washington, no mínimo, mediaria um acordo com a Inglaterra, já havia lançado por terra toda a doutrina de segurança nacional dos militares do continente.

O aliado principal havia rasgado a Doutrina Monroe (1823) ao apoiar militarmente os ingleses. Os militares brasileiros começavam, então, uma retirada em ordem do poder, sob forte pressão das forças democráticas, que por muito pouco não conseguiram aprovar no Congresso a convocação de eleições diretas (1984).

A derrota do regime militar ocorreu, porém, no colégio eleitoral que havia sido montado para institucionalizá-lo, com a eleição de Tancredo Neves (1985), mas que faleceu antes de tomar posse. Quis o destino que a transição à democracia fosse comandada por seu vice, o presidente José Sarney.

 Quando as eleições diretas finalmente ocorreram, em 1989, o mundo passava por uma mudança que deixou a esquerda ainda mais perplexa: o colapso repentino da União Soviética e do chamado “socialismo real” no Leste europeu.

Nessa época, o líder soviético Mikhail Gorbachev tentava salvar o comunismo de seu esgotamento, com a perestroika (reestruturação) e a glasnost (transparência), uma tentativa frustrada de modernização e democratização do socialismo.

O velho modelo leninista de economia estatal planificada e partido único havia sido ultrapassado pelas economias e democracias do Ocidente. Além disso, havia perdido legitimidade com as intervenções soviéticas na Hungria (1956), na Tchecoslováquia (1968) e na Polônia (1980).

Gorbachev tinha consciência da gravidade da crise do socialismo e acreditava que poderia salvá-lo do colapso, mas já era muito tarde. Recusou-se, porém, a reprimir as manifestações populares que resultaram na queda do Muro de Berlim, na unificação da Alemanha e no colapso dos regimes comunistas da Polônia, Hungria, Romênia, Bulgária e Iugoslávia.

Esse efeito dominó provocou uma reação conservadora. Na China, foi o massacre da Praça Celestial (1989); na URSS, o sequestro de Gorbachev, mas o golpe militar fracassou porque o povo se rebelou sob a liderança de Boris Yeltsin. De agosto a dezembro de 1991, o regime soviético deixou de existir sem que fosse dado um tiro.

O golpismo

Assim como uma parcela da esquerda acreditou que o golpe militar de 1964 teria sido derrotado se houvesse uma reação armada do governo João Goulart — bastaria bombardear as tropas do general Mourão Filho —, muitos ainda acreditam que o socialismo no Leste europeu sobreviveria se os comunistas soviéticos tivessem agido como seus colegas chineses.

Parte da esquerda brasileira, que se vangloria de ter recorrido à luta armada contra o regime militar, acredita que todos os meios são válidos para conquistar e manter o poder, como fizeram os comunistas russos na insurreição de 1917 e na posterior guerra civil, o que, aliás, acontece até hoje em Cuba. Um dos aspectos dessa concepção é a forma como se aparelha as instituições políticas e as organizações da sociedade civil, sem falar no que está sendo revelado pela Operação Lava-Jato.

Não precisamos olhar para os nossos vizinhos da Argentina e da Venezuela, essa concepção se fortalece entre nós em meio à crise atual. Para onde se olhe — a política externa, a nossa economia, as políticas sociais, o Congresso —, está evidente o colapso do presidencialismo de coalizão encabeçado pelo PT.

Uma das maneiras de resolver a crise, já que o atual governo não é capaz de fazê-lo, é recorrer ao impeachment da presidente Dilma. Esse é o grande debate em curso na sociedade, em meio às crises ética, política, econômica e, agora, social. Quem deve decidir é o parlamento.

Trata-se de um mecanismo constitucional, já utilizado com êxito na deposição do ex-presidente Fernando Collor de Mello (1992). O problema é que a esquerda no poder considera esse recurso golpista e está disposta a tudo para não permitir que seja utilizado. Para isso, utiliza a força do Estado contra a oposição e a sociedade, pressiona o Legislativo e o Judiciário. Na verdade, corremos o risco de bloquear a democracia brasileira e impedir qualquer mudança

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